domingo, 16 de junho de 2019

A tática do The Intercept no caso Vaza Jato


Leo Martins

Hoje faz uma semana que o @TheInterceptBr publicou as primeiras matérias explosivas sobre as mensagens do moro com a Lava Jato, e tenho pensado muito sobre todo o desenvolvimento dessa história, porém mais focado no formato de divulgação.

Antes melhor deixar claro que sou amigo do @demori e que admiro muito o trabalho que eles estão fazendo há tempos por lá desde a chegada dele, que mudou totalmente o caminho de um site que já estava há algum tempo no Brasil, mas tinha dificuldades de decolar

Também admiro o que eles estão fazendo nesse caso, um dos mais importantes e sensíveis em muito, muito tempo. É preciso não só coragem, firmeza e estrutura para publicar isso, mas também ter um senso de estratégia e inteligência. Essas coisas não costumam andar juntas

E é essa parte de estratégia que me interessa, porque acho que ela simboliza uma mudança radical que já vem acontecendo há tempos: a forma como consumimos tudo. Essa forma é nova num caso tão grande, em que todo mundo espera um episódio como se a realidade fosse uma série

Ao decidir publicar aos poucos e ainda fazer "teasers" de conteúdos bombásticos em programas de rádio, newsletters, entrevistas e pelas redes sociais, o TheInterceptBr adaptou algo bem tradicional (um gigantesco furo jornalístico) ao jeito que a gente se comporta e consome na internet

É como se a equipe toda estivesse focada não só em decodificar tudo aquilo que há nos arquivos das conversas, mas também em não deixar a peteca cair em nenhum momento. Porque eles sabem que as coisas hoje são tão arrebatadoras que mesmo uma história gigantesca pode morrer em dias

E essa nova camada não é tão comum no processo de lidar com um furo. Antes você publicava, cobrava ação por parte do MP e outras figuras públicas, e deixava a história viver o quanto ela aguentasse. Há histórias que sabemos que andam sozinhas, mas muitas outras apenas morrem.

O ciclo de notícias é frenético. Ricardo Salles e Weintraub (até o Neymar!) devem estar comemorando até agora que essa história explodiu, já que eles viraram coadjuvantes por tempo indeterminado. Esse ciclo é vantajoso para vários atores, incluindo boa parte da mídia também

Sabendo disso, o TheInterceptBr está de certa forma atiçando a audiência, deixando claro que vem mais. Não é muito diferente de quando a Netflix solta um teaser para fazer barulho sobre uma série. São uma forma de capturar esse mar de gente empolgada, mas que pode se distrair rapidinho

Pra quem trabalha na área soa meio estranho ver tantos jornalistas do TheInterceptBr discutindo, falando sobre a própria matéria e outras que sequer saíram ainda. Num ambiente mais tradicional, eles publicariam a matéria, fariam uma onda de divulgação e esperariam o resultado

Mas essa é uma história grande demais pra algo tão simples. Publicar tudo de uma vez diluiria e esconderia partes importantíssimas. Dezenas de matérias de uma só vez penetrariam muito menos. Uma divulgação sem contexto facilitaria as negações fajutas do governo

A tática de conta-gotas de algo tão explosivo funciona muito bem para se defender também, já que há muito material ainda não revelado que certamente será usado para rebater declarações de moro e companhia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário