Luis Fernando Verissimo
Ao contrário dela, presidente pode demitir generais
O presidente se queixou de que estão querendo transformá-lo numa rainha da Inglaterra. Nunca entendi bem esse uso da rainha inglesa — ou qualquer rainha — como exemplo de poder ornamental, que reina mas não manda. Todos os privilégios da Coroa (no caso a Elizabeth) seriam provas da sua inutilidade. Ela mora de graça num castelo e, para veranear, pode escolher entre vários outros castelos. Mesmo que alguns gastos com os castelos sejam da sua responsabilidade (imagine os IPTUs!), a rainha vive cercada de segurança e conforto às custas dos seus súditos. Nada lhe agrada mais do que uma noite à beira do fogo, conversando com Philip e fazendo cafuné no cachorro, ou conversando com o cachorro e fazendo cafuné no Philip. Sua única obrigação é participar das cerimônias oficiais do reino, quando ela tem a oportunidade de usar um dos seus magníficos chapéus, que há anos resistem ao escárnio republicano e, segundo alguns, são os verdadeiros símbolos do império. É uma vida invejável. Mas virou exemplo de poder sem potência.
A queixa do Bolsonaro é de que querem que ele seja rei só para espetáculo, um rei inglês simbolizando nada, ou só simbolizando. O verdadeiro poder, no sistema inglês, está no Parlamento. Mas os ingleses deram um jeito de ter um Parlamento poderoso e atuante e ao mesmo tempo, ao seu lado, uma paródia de parlamento, a Câmara dos Lordes. Os lordes, que só se reúnem para trocar dicas de charutos e conhaques, são os verdadeiros ingleses. Mas do que o Bolsonaro não se dá conta é que ele se elegeu com um poder que nenhuma rainha tem, ou teve nos últimos anos. O capitão Bolsonaro pode demitir generais. Pode mudar generais de lugar, inventar cargos e ministérios para brincar de troca-troca de generais. Não sei do que está reclamando. Deve ser divertido.
A diferença entre uma rainha da Inglaterra elizabetana e uma rainha da Inglaterra atual é que uma podia encomendar execuções de rebeldes e descontentes, e a outra tem que lidar com o Maia.
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