quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Conversa com Bia e Mau - MENSAGEM DE FINAL DE ANO 2020


Esses são os votos de Bia e Mau para 2021. Xô, 2020!

Doria corta investimentos em Ciência e aumenta em publicidade


A propaganda, a ciência, o imbróglio e o ano novo

Eugênio Bucci

Fapesp corre o risco de perder 30% de sua verba e Bandeirantes aumenta a de publicidade em 70% 

No gran finale de 2020, o governo paulista deu um jeito de aumentar os recursos para fazer propaganda de si mesmo e, na outra ponta, deu outro jeito para, em plena pandemia, ameaçar o orçamento da ciência. O ano que começou mal termina muito pior.

Nos derradeiros ajustes da Lei Orçamentária Anual (LOA), na Assembleia Legislativa, o Palácio dos Bandeirantes conseguiu incluir uma elevação de 69% na sua verba publicitária (como noticiou este jornal na primeira página, dia 20, com reportagem de Brenda Zacharias). O montante, que ficou na casa dos R$ 90,7 milhões em 2020, saltará para R$ 153,2 milhões no exercício de 2021.

Na mesma LOA aparece um corte de 30% na receita da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). A entidade tradicionalmente conta com 1% da receita tributária do Estado. Em 2021 poderá ficar com apenas 0,7%. Traduzindo em graúdos, estamos falando de meio bilhão de reais a menos.

Por enquanto, dinheiro ainda não foi retirado, de fato, mas a Fapesp corre o risco de perdê-lo. O corte aparece no texto final da LOA (publicado no Diário Oficial de ontem), com todos os números e vírgulas, mas talvez não venha a ser efetivado. Mas como assim?, há de se perguntar o improvável leitor. Se a lei manda cortar, como é que podemos ter a expectativa de que o corte talvez não se consume?

Para entender o capcioso imbróglio, pelo qual o malfeito se insinua enquanto finge não ser o que é, precisamos conhecer um pouco mais desse novo gênero artístico-orçamentário de dissimulação, tão em voga na política: a técnica legislativa de ordenar uma coisa e, ato contínuo, ordenar o seu contrário.

A mesma LOA que corta “descorta”. Numa das inumeráveis tabelas que a acompanham, consta um valor para o orçamento da Fapesp que equivale claramente à redução de 30% de suas receitas. Para isso a LOA se apoia lógica que prevaleceu nas emendas à Constituição federal que preveem a Desvinculação de Receitas da União (conhecida pela sigla de DRU) e a Desvinculação de Receitas de Estados e Municípios (Drem). Essas desvinculações constitucionais permitiram que as chamadas “receitas vinculadas”, tanto na União como nos Estados e nos municípios, fossem diminuídas. Logo, se a Drem valer para a Fapesp, ela perderá um terço do tamanho que tem hoje.

Acontece que o destino ainda não está selado, pois, como já foi dito, a mesma LOA que corta “descorta”. Em seu artigo 11, ela manda cumprir o que está escrito no artigo 271 da Constituição estadual de São Paulo – e esse artigo, o 271, determina de forma expressa, inequívoca, a destinação de 1% da receita tributária do Estado à Fapesp.

Em resumo, a LOA paulista para o ano de 2021 é uma contradição em termos, um oxímoro legislativo. Em suas previsões numéricas, impõe o corte da Fapesp. Em seu artigo 11, impede o corte da Fapesp.

O que vai acontecer? As apreensões estão lançadas. Há juristas que entendem que o orçamento da Fapesp não provém de uma receita “vinculada”, como as outras, e, portanto, a Drem não se aplica a ela. Mas há os que dizem que a Drem, um dispositivo da Constituição federal, deve prevalecer sobre as Constituições estaduais.

Não vai ser fácil. Só o que se sabe até agora, com segurança, é que o futuro da ciência paulista, que já era ruim, piorou um pouco mais. É a primeira vez que um ataque tão frontal contra os recursos da Fapesp ganha forma de lei. As forças tecnocráticas que, no curso de vários governos tucanos paulistas, vêm se articulando contra a pesquisa e contra a universidade pública marcaram seu tento, desfecharam sua pirraça e instalaram no horizonte próximo essa incerteza cabulosa.

A integridade da Fapesp nunca esteve tão vulnerável. Para o ano que vem, a manutenção de seu orçamento normal vai depender da assinatura do governador do Estado, a quem cabe expedir, por decreto, os termos da execução orçamentária. Quando for pagar as pesquisas que financia, muitas delas sobre tratamentos contra a covid-19, no Instituto Butantan e em outras instituições, precisará contar com a boa vontade do chefe do Executivo – que assegurou, publicamente, mais de uma vez, que não implementará corte algum.

Podemos acreditar nele? Em nota divulgada agora em dezembro, a instituição diz que sim: “A Drem não será aplicada à Fapesp em 2021 e há um compromisso claro do Governador João Doria e do Vice-governador Rodrigo Garcia, que também não será aplicada nos próximos anos”. Ao que se sabe, essa confiança na palavra do político em questão não tem bases científicas, mas é o que temos para o réveillon. Se cortes vierem, só vai restar aos dirigentes da Fapesp entrar na Justiça, o que trará mais desgastes e mais incertezas.

De sua parte, o mesmo Palácio dos Bandeirantes, que alega falta de recursos para fragilizar o financiamento da ciência e do conhecimento, não vê obstáculos para majorar em 70% a sua verba publicitária. É que estamos em tempos de pandemia e, você sabe, o poder acredita que a propaganda salvará vidas – de governantes.

Feliz ano novo.


*Jornalista, é professor da ECA-USP

Para onde vai o Brasil?



 

Cancelado


Como ganhar na Mega-Sena da Virada

O lixo no poder

O TÍPICO LÚMPEN ENDINHEIRADO 

Cristóvão Feil

Neymar promove festas de arromba em Mangaratiba (RJ), em pleno recrudescimento da pandemia. Hoje, esse jogador de futebol  se constitui em um típico lúmpen endinheirado, categoria social que mais cresce no Brasil do tenente. 

Em “O Dezoito Brumário de Luis Bonaparte” (1852), Marx refere-se ao “lumpemproletariado” como uma massa desintegrada, que reunia indivíduos arruinados e aventureiros oriundos da burguesia, vagabundos, soldados desmobilizados, batedores de carteira, mendigos e o rebotalho social ocupado em atividades criminosas etc., nos quais Luís Bonaparte apoiou-se em sua gana pelo poder (conforme Tom Bottomore). 

Como se vê, o Brasil está contribuindo para a classificação de novas categorias sociais, neste caso, um segmento que oscila entre o crime e a boçalidade.

Costa Rica


André Dahmer

quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

Fralda única



O fim da picada


Com brasileiro, não há quem possa!




Povo chileno derrubou o neoliberalismo e abriu caminho para uma nova constituição.

Povo boliviano derrubou o golpismo e reconduziu o projeto plurinacional ao poder.

Povo argentino derrubou o obscurantismo e, além de ser vanguarda na luta contra o coronavirus no cone sul, agora aprovou a lei de aborto.

Mas o brasileiro é que é malandrão e cheio de gingado. É o Robinho que pedala bonito, é o Ronaldinho Gaúcho que "samba" dentro de campo.

Para 42% dos malandros cheios do gingado daqui, Bolsonaro conduz a crise da pandemia de forma correta. Sendo que nem seringa o país tem, o Brasil tem apenas 3% das seringas necessárias para vacinar a população.

Quem acha que isso é apenas "porque o governo sabe se comunicar" acho que deveria rever seus conceitos. Cultuar o pobrismo, ser paternalista com o conservadorismo de classe-baixa apenas para pagar de "popular", não ajuda em nada. E aqui vos fala um filho dileto dessa classe-social. Reafirmo, quem romantiza a merda deveria ir morar lá pra ver se é bom mesmo. 

O primeiro passo para curar uma doença é fazer o diagnóstico correto. 

Se a elite brasileira é elitista, achar que o povo é uma tábula rasa, facilmente manipulável pelo fascismo por pura malandragem do líder do país, é elitismo igual.

E isso me lembra aquela crônica "Vamos acabar com essa folga" do Stanislaw Ponte-Preta, a minha maior influência literária. Nessa crônica, Stanislaw começa contando de uma confusão que aconteceu num bar. 

No bar tem pessoas de várias nacionalidades, e um alemão fortão vai chamando um por um para a porrada. Bate no francês, no inglês, no argelino, até que...
"(...) lá do canto do café, levantou-se um brasileiro magrinho, cheio de picardia, para perguntar, como os outros:
-- Isso é comigo?
O alemão voltou a dizer que podia ser. Então o brasileiro deu um sorriso cheio de bossa e veio gingando assim pro lado do alemão. Arou perto, balançou o corpo e... PIMBA! O alemão deu-lhe uma cacetada na cabeça com tanta força que quase desmonta o brasileiro.

Como, minha senhora? Qual é o fim da história? Pois a história termina aí madame. Termina aí que é pros brasileiros perderem essa mania de pisar macio e pensar que são mais malandros do que os outros."

Bolsonaro é escolhido Pessoa do Ano do Crime Organizado e da Corrupção

Revista Éporca

Jair Bolsonaro foi eleito como "Pessoa do ano" na promoção do crime organização e da corrupção pelo Organized Crime and Corruption Reporting Project (Projeto de Reportagem de Crime Organizado e Corrupção, na sigla em inglês), por ter se "cercado de figuras corruptas, usado propaganda para promover sua agenda populista, minado o sistema de Justiça e travado uma guerra destrutiva contra a região da Amazônia, o que enriqueceu alguns dos piores proprietários de terras do país".

O Organized Crime and Corruption Reporting Project é um dos maiores consórcios de jornalistas investigativos do mundo, criado na Europa e que publica dezenas de reportagens investigativas por ano.

O presidente brasileiro concorria com nomes como Donald Trump e o presidente turco Recep Erdogan.


(Por Guilherme Amado e Naomi Matsui)

Os grandes destaques de 2020




Destaques  2020 - os cinco maiores!
[o buraco é fundo, muito fundo, meu irmão!]

1) O mau-caráter do ano

Apesar de muitos candidatos, o presidente da República é imbatível nesta categoria. Um homem sem qualidades, ignorante, desqualificado, misógino, racista e grosseiro. Uma pústula no Planalto. Insuperável. 

2) O blefe do ano

O gal. Eduardo Pazuello, ministro da Saúde, vendido como especialista em logística, mostrou-se um incapaz. Mesmo num governo de nulidades, o militar se destacou. Conseguiu chegar ao final de 2020 com o país apresentando mais de 7,5 milhões de infectados pela COVID19, com perto de 193 mil mortes e um número de mortes diárias voltando ao patamar de mil. E sem apresentar um Plano de Vacinação consistente. Um feito notável. 

3) O derrotado do ano

O prefeito do Rio de Janeiro, por mais dois dias, o pastor Marcelo Crivella acaba seu mandato preso, com tornozeleira, em casa, sem telefone, TV, tablet, internet. Um misto de religioso vigarista e político incompetente, medíocre e corrupto, Crivella, um bolsonarista convicto, superou grandes concorrentes e merece a homenagem. 

4) O vira-lata do ano 

O ex-juiz todo poderoso da Operação da Lava Jato, acusado de manipular processos em desfavor de réus, ex-ministro da Justiça escorraçado do governo que ajudou a eleger e agora advogado da empresa de consultoria jurídica Alvarez & Marsal, Sérgio Moro acaba 2020 mais perdido que cachorro em dia de mudança. O ostracismo lhe será uma pena leve.

5) O vivaldino do ano

O semi-analfabeto ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, que conseguiu nada produzir durante o seu mandato, destacou-se pela grosseria, estupidez e imbecilidade, ofendeu ministros do STF em reunião ministerial e, quando exonerado do MEC, foi indicado pelo governo federal para uma diretoria no Banco Mundial, em Washington, com salário anual da ordem de R$ 1.500.000,00.

Um ano terrível


Vai, menino Ney!

Neymar não vale a grama que o Bolsonaro comeu na Vila Belmiro

O presidente Jair Bolsonaro faz uma boquinha após marcar gol na Vila Belmiro

Marcos Nogueira


O cerumano só é infalível em duas coisas:

  1. Falhar
  2. Apontar a falha do outro

Todo mundo já pegou para si a maior fatia do bolo. Todo mundo já pisou na bola com alguém. Todo mundo já flertou com alguém que não deveria flertar. Todo mundo já justificou uma merda que fez com o clássico “foram só 5 minutos”. Todo mundo já desfez amizade porque o amigo vacilou. E todo mundo já acobertou o vacilo do amigo, em nome da amizade.

Essa contradição ganhou tons escandalosos na pandemia. É a combinação do isolamento –em seus variados graus, a gosto do freguês– e os julgamentos sumários das redes sociais, após imprudente exposição do delito, lá mesmo.

O Felipe Neto foi bater bola com os amigos. O Zé das Couves não aguentou a saudade do boteco. A Dona Marocas retomou as sessões de massagem. O João e a Maria se conheceram no Insta, a conversa engatou, então, pá!, ambos tiraram o atraso sexual numa furtiva noite de terça-feira.

Felipe, Zé, Marocas, João e Maria usam máscara, passam álcool em gel, fazem compras online, defendem a ciência e xingaram o Neymar por causa da festa de Réveillon para 150 pessoas em Mangaratiba.

Será que Felipe, Zé, Marocas, João e Maria não são iguais ao Neymar? Não seríamos, todos nós, o Neymar na festa de Réveillon? Apenas um pouco mais hipócritas?

Não.

Faz parte do jogo falhar, pisar na bola, vacilar de vez em quando e digerir esses erros, procurando sempre agir melhor. O aprendizado se dá assim, com algumas notas vermelhas ao longo do percurso.

Neymar parece ser incapaz de entender essa dinâmica. Criado numa redoma, o menino mimado não tem um pingo de traquejo social, de senso comunitário. Reparem nessas palavras: “social”, “comunitário”. Lembram “socialismo” e “comunismo”, não?

É o pensamento vicioso que as bestas hidrófobas da extrema direita incutiram em todos os tios de churrasco do Brasil: qualquer ato ou discurso em defesa do bem coletivo é coisa de marxista, de bolchevique. Do Diabo, em suma. E ninguém que um dia falhou pode criticar quem falha por gosto e vocação.

A sociedade, ops, o mundo ideal dessas pessoas é um pega-pra-capar em que cada um tem um fuzil para proteger os filhos e a comida.

Neymar é fruto dessa visão sórdida de mundo. Ele acha OK fazer chover dinheiro e bancar uns desqualificados para limpar a lambança que ele fez.

Neymar está cagando para todos nós.

Neymar não vale a grama que o Bolsonaro comeu na Vila Belmiro.

Ainda não...


Bolsonaro emporcalha a Presidência até durante as férias


Bruno Boghossian

Provocações hediondas e exaltação da tortura são incompatíveis com o exercício da política 

Jair Bolsonaro já era um político indigno do cargo que ocupava em 1999, quando dava entrevistas para defender atrocidades como assassinatos políticos e agressões a prisioneiros. "Eu sou favorável à tortura, tu sabe disso", declarou o então deputado ao programa Câmera Aberta, da TV Bandeirantes.

A propaganda continuou nas duas décadas seguintes. O parlamentar ganhava projeção ao glorificar o regime militar e recomendar a execução de rivais. "O erro da ditadura foi torturar e não matar", repetiu, dois anos antes de ser eleito presidente.

O país escolheu um apologista da tortura para comandar o Palácio do Planalto. Depois de fazer fama com aquelas declarações, ele passou a emporcalhar a Presidência da República com um repertório atualizado de barbaridades –até durante as férias.

Antes de embarcar para o Guarujá (SP), na segunda (28), Bolsonaro lançou dúvidas sobre a tortura que a ex-presidente Dilma Rousseff sofreu na ditadura. "Dizem que a Dilma foi torturada e fraturaram a mandíbula dela", disse. "Não sou médico, mas até hoje estou aguardando o raio-X."

Além de repugnante, a ofensa é covarde e desprovida de lógica. Bolsonaro costuma tratar torturadores como exemplos de heroísmo e explora a selvageria praticada nos porões como arma política. Em 2016, ele mesmo citou o chefe do DOI-Codi como "o pavor de Dilma Rousseff"; agora, debocha dos atos que exaltou.

Não é preciso dizer que o presidente tem o direito de discordar de seus opositores em quase tudo. As provocações hediondas que ele escolhe fazer para alimentar esses confrontos, no entanto, só reforçam que seu comportamento é incompatível com o exercício da política.

Essa é a essência de Bolsonaro. No início de maio, enquanto trabalhava em período integral para atrapalhar os esforços de contenção da pandemia do coronavírus, o presidente ainda abriu um espaço na agenda para receber o Major Curió, símbolo da repressão da ditadura. O Planalto divulgou o encontro e chamou o militar reformado de herói.

E o JusPorn Awards 2020 vai para...


Conrado Hübner Mendes

A fraternidade precisa de você, magistocrata, nessa luta por distinção e luxúria 

A abertura do JusPorn Awards 2020 assanhou as salas de Justiça do país. Magistocratas esquecidos na lista inicial de indicados correram para entrar na disputa. Houve também reação de leitores diante de prêmio tão indecoroso.

Um disse que enxergo o “copo meio vazio”, não o “copo meio cheio”. Para funcionar, a metáfora pede que o copo tenha líquido perto da metade. O otimismo pode ajudar a viver, mas não é virtude analítica. Chico Buarque consola: “É sempre bom lembrar que um copo vazio está cheio de ar”. O copo da magistocracia está cheio de férias e auxílio-autoestima também.

Outro leitor, mais aborrecido, perguntou por que nunca trato da “magistériocracia”. Foi um revés inesperado e desconcertante. Os manuais de interpretação do Brasil ainda se omitem sobre esse ator influente nos conflitos distributivos do país, o “professor”. Nada como um vigilante da magistocracia para jogar luz nas surpresas sociológicas do país.

A hora esperada chegou. O TJ-SP, pelo conjunto da obra, estava com as mãos na taça. Teve desembargador descamisado violando a lei em francês, outro negando habeas corpus a presidiários para “prender o vírus”, teve juiz punido por viés ideológico e juiz “nem aí com a Lei Maria da Penha”. Mas não foi dessa vez. Ao solicitarem vacina express, STF e STJ chutaram a porta para mostrar quem manda nessa esbórnia pandêmica.

A Fiocruz rejeitou o pedido, mas a cúpula da Justiça ainda inventará outra saída. Luiz Fux explicou, “com ética e delicadeza”, que a “preocupação com a sociedade já foi demonstrada em 8.000 ações”. Queira saber o que há entre essas 8.000 ações. Foi um sopro de hálito magistocrático: continuarão “trabalhando em prol da sociedade” se vacinados antes da sociedade. “Sou contra privilégios”, Fux disse depois. Sua biografia confirma a autenticidade.

Fux é uma espécie de Romero Britto dos tribunais. Só não tem a capacidade de pintar um retrato alegre e multicolorido de Bia e João Doria em Miami. Lembra um Rolando Lero, mas lhe falta a consciência do tanto que ignora. Rolando Lero não se levava a sério. Dotado de noção do ridículo, sua pompa exalava autoironia. A pompa de Fux é sincera. Se você disser que "pompa sincera" não existe, recomendo uma tarde de TV Justiça.

Um tal de Drummond convidou Fux a recomeçar: “Você é o que você fizer de você. Busque um lugar calmo e leve a Deus uma prece. Recomeçar é só uma questão de querer”. Não confessou em que anais da poesia nacional encontrou esse furo literário. E agora, Luiz?

Alô, alô, juiz, promotor e procurador honesto e trabalhador que não participa da pornografia mas se deixou enfezar pelo JusPorn Awards: o prêmio não é sobre você. Essa identificação carnal com a instituição é sintoma do que essa corporação pode fazer contigo. Moralmente e cognitivamente. Abraçar e defender a magistocracia é parte opção, parte resignação, parte sacanagem.

Resistir à tentação magistocrática tem custos e benefícios. Se os custos lhe parecem maiores que os benefícios, bem-vindo à confraria, você tem espinha e musculatura ética para o trabalho. A fraternidade precisa de você nessa luta por distinção e luxúria. Fique a postos para furar a fila do pão ou de qualquer outro bem coletivo. Aos poucos você vai assimilando esse currículo oculto. Logo receberá sua primeira comenda por bom comportamento.

A dedicação do indivíduo ético a uma instituição corrupta e autoritária é problema filosófico incontornável dos séculos 20 e 21. Não se sai eticamente ileso após carreira profissional em instituição tão estragada.

Assim como nenhum cidadão privilegiado sai eticamente ileso de uma sociedade tão desigual e brutalizada como a brasileira. Em parte, estamos no mesmo barco da responsabilidade.

Mas tome cuidado, magistocrata, para não anestesiar a consciência. Não é tudo a mesma coisa. Dentro dessa sociedade desigual e brutalizada, as instituições de Justiça operam a máquina mais voluptuosa de reprodução de privilégio e violência. E operam nos porões como ninguém. A face “hardcore-plus” da pornografia brasileira está nos espaços que a magistocracia governa. Uma aberração específica pede tratamento específico.

O JusPorn Awards tem grandes expectativas para 2021, ano com potencial juspornográfico incomum. O pecado mora ao lado da toga. Anote: “Nenhuma nudez judicial será castigada. Toda desfaçatez magistocrática será premiada”.

Bolsonarismo é um método de fracasso, na economia de Guedes ou na vacina

Congresso evitou fracasso final do bolsonarismo na economia, mas não na vacina
Jair Bolsonaro anda inquieto. É assim quando seu poder ou sua popularidade estão ameaçados; quando aumenta o risco de que sua família acabe na cadeia. Então passa a dizer mais atrocidades do que de costume contra a democracia, a razão, a decência e a humanidade.

Nos últimos dias tenta arrumar um bode expiatório para justificar a inexistência de vacinas e escamotear o desastre com uma cortina de fumaça, com o bafo fumegante da besta fera. Disse que quer facilitar o acesso a armas de fogo com o objetivo de facilitar insurreições armadas, por exemplo contra João Doria. Debochou, rindo como um psicopata, da tortura de Dilma Rousseff. Etc.

Cerca de três quartos dos brasileiros querem se vacinar. É difícil enganar tanta gente com fantasias lunáticas e propaganda criminosa. Há o risco de a incompetência e os crimes ficarem muito evidentes.

Desde meados do ano entrou em pane o “parlamentarismo branco”, um improviso que fez as vezes de governo no lugar de Bolsonaro. Se essa geringonça política estivesse funcionando, talvez até se pudesse inventar uma gambiarra parlamentar para a compra de vacinas, uma atribuição clara do ministério da Saúde, que, porém, não passa de um almoxarifado a cargo de uma ordenança incapaz. Agora não temos nem a geringonça nem ministério. Sobra então o bolsonarismo puro no poder.

Já vimos isso antes. Paulo Guedes é o bolsonarismo econômico. Não é uma doutrina, claro. Para resumir, é variante, na Economia, da propaganda de fantasias desvairadas associada à incompetência de ressentidos reacionários.

Quando bateu o pânico da epidemia, na segunda semana de março, Guedes dizia que “se promovermos as reformas, abriremos espaço para um ataque direto ao coronavírus. Com 3 bilhões, 4 bilhões ou 5 bilhões de reais a gente aniquila o coronavírus”. Ou “o mundo está em desaceleração sincronizada e o Brasil em plena decolagem [na economia]”. No início de abril, disse que conversara “com um amigo na Inglaterra que criou o passaporte de imunidade. Ele faz 40 milhões de testes. Ele coloca disponíveis para nós, brasileiros, 40 milhões de testes por mês".

O Congresso e pressões da sociedade enfim fizeram o auxílio emergencial de R$ 600, o que evitou fome, quebradeira catastrófica de empresas, saques, convulsão social e deve ter salvo o mandato de Bolsonaro. O programa teve problemas, até porque não foi organizado por um governo capaz, mas era o que tínhamos. Agora, houve um movimento de governadores e do STF para fazer com que o capacho da Saúde e seu chefe se movessem um tico. Não basta.

Guedes passou o resto do ano no delírio e na inoperância habituais. Volta e meia vinha com sua ideia de CPMF para reduzir impostos sobre folha de salários. Ou com as suas “privatizações de Nostradamus”, aquelas que, não se sabe bem quais, acontecerão em algum dia de algum século. Em julho, como em tantos meses antes e depois, Guedes dissera que o Brasil iria “surpreender o mundo” e que faria “quatro grandes privatizações nos próximos 30, 60, 90 dias”.

Talvez daqui a pouco, algumas centenas de ricos possam pegar seus jatinhos e se vacinar no “Primeiro Mundo”. Não vai resolver, já devem saber, porque a epidemia persistente trava a economia, assim como muitos já sabem que queimar a Amazônia e o Cerrado é problema. Qual ilusão ou cinismo pode restar? Não há governo, apenas propaganda lunática, planos de golpe, quiçá de algum tipo de guerra civil. A cumplicidade vai custar caro.

terça-feira, 29 de dezembro de 2020

O preço de nossa displicência histórica



Luis Felipe Miguel

Já derrotado, mas ainda solto, Crivella correu para inaugurar um inacabado Memorial do Holocausto no Rio de Janeiro. Eu fiquei sabendo do memorial umas semanas antes, graças a um anúncio de página inteira na Folha de S. Paulo, patrocinado por uma empreiteira.

Ninguém pode negar que o holocausto e suas vítimas devem ser lembrados. Mas é de se perguntar o porquê de empresas decidirem bancar a construção do memorial e do bispo Crivella ter se apressado a inaugurá-lo, ladeado por Fabio Wajngarten, o secretário de comunicação de Bolsonaro, que aproveitou a ocasião para alardear a proximidade entre o governo genocida ao qual serve e o Estado genocida de Israel.

Em um belo livro intitulado Le passé, modes d’emploi, Enzo Traverso observa que o holocausto é usado como uma ferramenta para fazer a apologia da ordem atual do mundo, apresentando o nazismo como “legitimação pelo negativo” do Ocidente liberal. Para isso, é preciso convenientemente esquecer como o colonialismo dos europeus, fruto legítimo deste mesmo Ocidente liberal, forneceu aos nazistas boa parte do seu repertório de morte e opressão.

(O mesmo Traverso, aliás, descreve com detalhes essa história, em outro belo livro, La violence nazie. Anterior à decantada obra de Losurdo sobre o liberalismo, mostra como é possível trata do tema com rigor e sem simplismos.)

Não é por acaso, portanto, que a contraface da memória do holocausto, retomado como Outro absoluto que só fala a nós pelo antagonismo, seja o esquecimento do passado colonial. Que se traduz também, nos Estados Unidos, como observa Traverso, pela conspícua ausência de locais de memória dedicados à escravidão.

Traverso fala dos Estados Unidos, mas é fácil pensar no Brasil. A memória da escravidão é apagada no país; os pequenos espaços dedicados a ela são absolutamente incompatíveis com sua importância, seu custo em sofrimento, seu significado para nosso passado e nosso presente – quando não eivados de ambiguidades, como é o caso do “Museu da Escravidão e da Liberdade”, de doce acrônimo MEL, também na cidade do Rio de Janeiro.

A outra ausência, ao lado da escravidão, é a ditadura. Como é sabido, o governo Temer iniciou e o governo Bolsonaro dá seguimento à ofensiva para inviabilizar a criação do Memorial da Anistia na UFMG, iniciativa tardia dos governos petistas que seria o marco da memória histórica daquele período.

Mas não se trata apenas, ou principalmente, de um museu. Um dos vários triunfos que a ditadura obteve no momento em que saía de cena foi bloquear o debate sobre si mesma, na sociedade brasileira que, dizia-se, caminhava então para o restabelecimento da democracia. O pouco que conseguimos fazer – como o trabalho da Comissão da Verdade – foi arrancado a muito custo, em meio a um cenário de hostilidade de uns e indiferença de outros.

O Brasil escolheu o caminho da “transição amnésica”, para usar a expressão que Traverso dedica à Espanha. É de se espantar, então, que tenhamos uma besta fascista ocupando a presidência? E que essa besta solte impunemente as atrocidades que falou em relação à presidente Dilma Rousseff?

O fato é que os militares que deixaram o poder em 1985, tão autoritários e antipovo como aqueles que o empalmaram em 1964, deram à impunidade e ao esquecimento de seus crimes uma alta prioridade – e os democratas, por cálculo míope ou simples comodismo, julgaram que não podiam ou deviam enfrentar a questão.

Maria Rita Kehl apresenta um veredito demolidor, no capítulo que assina na coletânea O que resta da ditadura: “Foi espantosa a displicência, diria mesmo a frivolidade, que caracterizou a maior parte do ambiente critico dos anos 1980: como se a ditadura por aqui tivesse terminado não com um estrondo, mas com um suspiro – já que os estrondos foram inaudíveis para os ouvidos dos que nada queriam escutar. Como se pudéssemos conviver tranquilamente com o esquecimento dos desaparecidos. Como se nosso conceito de humanidade pudesse incluir tranquilamente o corpo torturado do outro, tornado – a partir de uma radical desidentificação – nosso dessemelhante absoluto”.

Dez anos se passaram desde que estas palavras foram publicadas. E hoje o preço que pagamos por essa “displicência histórica”, como diz Kehl, está à vista de todos.

Covid: Brasil registra 1.111 novas mortes em 24h, maior número desde setembro


Colaboração para o UOL, em São Paulo

O Brasil voltou a registrar mais de mil mortes por covid-19 em um intervalo de 24 horas. De acordo com dados divulgados hoje pelo Ministério da Saúde, o país confirmou 1.111 novas mortes provocadas pela doença nas últimas 24 horas. Desde o início da pandemia, 192.681 pessoas morreram.

Esta é a maior marca desde 15 de setembro, quando o Ministério divulgou 1.113 novos óbitos de um dia para o outro. É a segunda vez neste mês que o Brasil apresenta mais de mil mortes por covid-19 em 24 horas. Antes, em 17 de dezembro, foram 1.092 óbito registrados.

De ontem para hoje, foram registrados 58.718 diagnósticos positivos para o novo coronavírus no Brasil. O número de infectados subiu para 7.563.551 desde o começo da pandemia.

A pasta também informou que 6.647.538 pessoas se recuperaram da doença, com outras 723.332 em acompanhamento.

Vale ressaltar, no entanto, que os registros de mortes nos fins de semana e feriados tendem a ser menores devido à redução de equipes nas secretarias de saúde, o que tende a represar dados que são inseridos à contagem pelos estados nos dias subsequentes.

Covid deve baixar expectativa de vida no país em até 2 anos

O ano marcado pela pandemia e o confinamento chega ao fim com a esperança da vacina. Mas os impactos da covid-19 se farão sentir por muito tempo e poderão ser ainda mais profundos do que se imaginava. A expectativa de vida do brasileiro ao nascer deve cair em até dois anos por causa das mais de 190 mil mortes pela doença. Será a primeira queda desse indicador registrada no País desde 1940, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Especialistas da FGV (Fundação Getulio Vargas) e do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) estimam que a pandemia vai reverter a tendência observada nas últimas décadas. O brasileiro perderá pelo menos um ano de expectativa de vida, podendo chegar a até dois anos. Dependendo da capacidade do governo de vacinar a população em 2021, essa queda pode ainda se prolongar por mais um ano.

Em 1940, a expectativa de vida do brasileiro ao nascer era muito baixa, de 45,5 anos. Com a redução da mortalidade infantil e os avanços na Medicina, o número vem crescendo consistentemente. Em 1980 chegou a 62,5 e, em 2000, a 69,8. Nos últimos 20 anos, os ganhos foram um pouco mais lentos, mas, mesmo assim, nunca se registrou um decréscimo.

Conforme os últimos dados divulgados pelo IBGE, em novembro, a expectativa de vida do brasileiro ao nascer era de 76,6 anos. E poderia ser ainda mais alta se não fosse a violência urbana, que costuma vitimar homens jovens. Tanto que a expectativa de vida das mulheres era de 80,1 anos, ante 73,1 anos dos homens.

Um Ano Novo OK


O voto do brasileiro e a importância das redes sociais

Charge de Ivan Cabral

A pessoa vota porque o pastor mandou, o youtuber fez campanha, a atriz indicou, a influencer influenciou e o cantor sertanejo apoiou. E tem gente que acha que é possível mudar a opinião da pessoa, “catequizando” pelas redes sociais...

Cláudia Sarti

Trump crucificado


Imagem original de autoria desconhecida por mim até o momento.

O teto de gastos


Laerte

O mundo todo enfrentou a mesma pandemia, mas não a mesma tragédia


"Feliz Ano Velho"

Cristina Serra

A retrospectiva de 2020 pode ser escrita com as aspas expelidas de uma boca hedionda. O poder do vírus estava "superdimensionado", sem motivo para "histeria', "comoção" ou "pânico". Tudo poderia ser resolvido com um "dia de jejum" do povo brasileiro. Se fosse contaminado, por seu "histórico de atleta", o profeta da escuridão teria apenas um "resfriadinho" e seria curado por uma poção mágica, a cloroquina.

O vírus produziu um oceano de lágrimas, e o cronista do abismo arremessou palavras como pedras sobre a dor dos brasileiros: "Não sou coveiro", "E daí?", "Eu sou Messias, mas não faço milagre". Incentivou aglomerações e a contaminação porque o vírus é como uma "chuva", "vai atingir você" e "todos nós iremos morrer um dia". "Tem que deixar de ser um país de maricas".

Sob seu comando, o Ministério da Saúde foi incapaz de planejar ações preventivas ou campanhas educativas e alertar para a gravidade da doença. Desprezou o uso de máscara, não investiu na testagem em massa, fracassou na logística (quase 7 milhões de testes perderam a validade), sabotou os imensos esforços de cientistas, médicos e todos os profissionais de saúde, professores, mídia e autoridades locais para promover quarentenas que poderiam reduzir as infecções.

Não antecipou a compra de vacinas e fez vaticínios estapafúrdios sobre seus efeitos colaterais. Arrotou tanta ignorância que quase um quarto da população não quer se vacinar. Vamos fechar o ano perto dos 200 mil mortos, podendo ser até 230 mil, considerando a subnotificação.

O mundo todo enfrentou a mesma pandemia, mas não a mesma tragédia. A diferença está em como os governos lidaram com os instrumentos disponíveis para conter o vírus. Mas o semeador do caos e da desesperança não dá "bola" e nos arrasta para os confins da escala civilizatória. Nada indica que 2021 será diferente. Peço licença ao escritor Marcelo Rubens Paiva para receber o novo ano com a expressão pungente do título de um livro seu: "Feliz Ano Velho".

segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

Chumbo, milícia e birra


Les Misérables

 


2020 parte 2

PAREM DE MENSAGENS POSITIVAS PRA 2021

Não vamos começar melhores. Não teremos vacina tão cedo. Estaremos no pico da pandemia. Não tem essa de “novo ano”. É o 2020 parte 2.

Não tem good vibes. A gente vai virar o ano sem perspectiva de vacina e volta da vida normal. Com um presidente antivacina e negacionista que não faz nenhum esforço pro pais sair dessa. 

Quem tem a chance de sair daqui tem que vazar logo, rs. Vai só piorar.

Dudu

Piloto brasileiro desenha no céu início de vacinação no Brasil

 



Nossas vidas nunca mais serão as mesmas


Em breve superaremos a gripe espanhola em número de mortes

14 de março de 2020. Nesse dia eu tive um pressentimento de que nossas vidas nunca mais seriam as mesmas.

É claro que, como a maior parte dos brasileiros, eu vinha acompanhando as notícias sobre o novo coronavírus. A doença havia chegado há algumas semanas por aqui, e o número de casos confirmados pelo Ministério da Saúde vinha subindo dia a dia - mas ainda eram apenas 362, sem nenhuma morte até então.

Àquela altura a covid-19 já avançava com força na Europa, a ponto de a Organização Mundial de Saúde ter declarado no dia 11 de março que se tratava de uma pandemia. Com quatro “circuit breakers”, a bolsa naquela semana caiu 15,6%, na pior semana desde a crise de 2008, e mesmo assim eu não me abalava.

A ficha caiu quando ouvi uma entrevista de Donald G. McNeil Jr., repórter de ciência do “The New York Times” que já havia feito coberturas sobre epidemias nos quatro cantos do mundo. Ao participar do podcast “The Daily”, o jornalista revelou que, pelo o que havia apurado junto a diversos cientistas, o novo coronavírus poderia ser tão letal quanto a gripe espanhola de 1918.

“Se nada for feito, todos nós perderemos pelo menos uma pessoa próxima por covid-19”, foi a frase que ficou na minha memória.

Naquele mesmo dia 14 de março em que ouvi o episódio com o jornalista do “NYT” compareci à festa de aniversário de um grande amigo - e aquela foi a última vez que fui a um bar. Lá, recebi uma mensagem por WhatsApp informando que a faculdade em que trabalho havia suspendido as aulas preventivamente. Daí pra frente minha vida nunca mais foi a mesma.

Num depoimento dado em 1977, no longínquo ano em que nasci, o artista plástico Abraham Palatnik parecia profetizar o que vivemos em 2020. “O ser humano representa um grande investimento em estudo e aprendizagem ao longo de dezenas de anos. Desprezar esta vantagem seria uma degradação da própria natureza do homem e um desperdício de suas potencialidades.”

O desdém pela ciência, expresso inúmeras vezes pelo presidente da República, cobrou seu preço. “Cenas de terror e tensão, fuga na terra, ira no céu”, cantavam ainda no início da carreira os Titãs, tendo entre eles o punk Ciro Pessoa. “Tomaram tudo o que tínhamos”, clamava o líder Aritana Yawalapati, um dos últimos falantes do idioma tradicional do seu povo, no Alto Xingu.

“Nós estamos órfãos de um projeto nacional. (...) Nós fomos achando que é possível tocar o futuro sem discutir o futuro”, criticou certa vez o ex-reitor da UFRJ e ex-presidente do BNDES Carlos Lessa.

Como o limpador de vidraças do conto “Um discurso sobre o método”, de Sérgio Sant’Anna, estamos suspensos no tempo, sem orientações claras sobre novas medidas de distanciamento social ou ações rápidas para a obtenção de vacinas. “Ele era um homem que vivia nas imediações do presente, pois o passado não lhe trazia nenhuma recordação agradável, em especial, e o futuro era melhor não prevê-lo, de tão previsível”.

Muitos sucumbiram diante da indefinição. Alguns de modo resignado, como na canção de Paulinho do Roupa Nova: “E a hora vai chegar; já não sei como evitar. Eu não vou mais fugir, é tempo de encarar”.

“Daqui dou o viver já por vivido”, sentenciou a poetisa Olga Savary na sua Sextilha Camoniana.

“Pela fresta, é possível ver o céu azul. Acho que atravessei esta porta”. Algodão-doce para você, inesquecível Daniel Azulay.

“Passei o bastão pra vocês, agora sigam e sejam felizes”, disse a atriz Nicette Bruno a seus filhos, mas o conselho serve a cada um de nós.

“Mas sei que uma dor assim pungente não há de ser inutilmente”, nos ensinou Aldir Blanc num hino de outros tempos, mais atual do que nunca. “A esperança dança na corda bamba de sombrinha, e em cada passo dessa linha pode se machucar”.

Enquanto escrevo esta coluna, o Brasil registra 190.795 mortes oficiais por covid-19. De acordo com a última pesquisa Datafolha, 8 em cada 10 brasileiros pegou ou conhece alguém próximo que foi contaminado pelo novo coronavírus.

Estudiosos estimam que as duas grandes ondas de gripe espanhola que atingiram o Brasil entre 1918 e 1919 mataram em torno de 35.000 pessoas. Segundo o IBGE, nesta mesma época o Brasil possuía em torno de 30 milhões de habitantes. Grosso modo, pouco mais de 0,1% dos brasileiros sucumbiram à doença.

Um século depois, o país possui pouco mais de 210 milhões. A continuar o ritmo atual de evolução, em breve a covid-19 terá matado o mesmo tanto que a gripe espanhola, em termos proporcionais.

O descaso com a saúde pública no atual governo jogou por terra todo o avanço de higiene, tecnologia e políticas públicas de um século.

As retrospectivas do ano de 2020, a serem veiculadas nos próximos dias, vão precisar de tempo e espaço extra para retratar tantas perdas inestimáveis - inclusive as dez personalidades que eu mencionei expressamente acima.

No meu caso, a profecia do repórter do “The New York Times” se cumpriu na noite do dia 25 de outubro. Sebastião Fernandes Pereira era um grande amigo da minha família, com o qual convivi desde os meus 10 anos de idade.

De riso fácil e conversa atenciosa, deixou órfãos milhares de pessoas que recorriam a ele para buscar conforto e conselho para suas dores da alma.

Tiãozinho virou estatística da covid, mas a falta que ele deixou não tem medida. Por meio dele homenageio as vítimas da doença que marcou este ano, seus familiares e amigos.

Até 2021.


Bruno Carazza é mestre em economia, doutor em direito e autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro”.

Por que o neoliberalismo só pode ser implantado por ditaduras?

 João Ximenes Braga

Quer entender o que é o neoliberalismo de um país periférico? Explicar eu não sei, mas posso apontar um caminho para entender.

Em plena ressaca de feriado, a Ibovespa mal abriu e às 10h30 já disparou 0.57%. A razão de tamanha pauderescência é a aprovação do pacote fiscal assinado por Trump que libera 900 bilhões de dólares para recuperar a economia americana pós-pandemia. Trump, inclusive, se aliou aos democratas para aumentar o "bolsa família" e dar auxílio de dois mil dólares por adulto em necessidades.

Nada mais natural que, diante dessa perspectiva de crescimento na Economia da corte, a bolsa da periferia tenha uma ereção.

Acontece que a mesma Ibovespa broxa vergonhosamente sempre que, em Pinochetguedeslândia, se falava em prorrogar auxílio emergencial ou lançar o Renda Brasil ou qualquer coisa que pudesse furar o santo graal do teto de gastos da PEC da morte, instaurado pelo golpe neoliberal de 2016.

Ué, mas então o governo americano impulsionar a Economia local pode, mas o governo brasileiro impulsionar a sua Economia local não pode? 

Parece contraditório, mas não é. É a essência da coisa. É para isso que precisaram dar um golpe para implantar à força o neoliberalismo aqui. Por que a Economia local que deve ser forte é a de lá. A de cá, que fique a serviço deles. 

Foi pra isso a Lava-Jato. Foi pra isso o impeachment. Foi pra isso o antipetismo. Para nos transformar num país de 200 milhões de entregadores do iFood.

Imperdoável


Metallica: The Unforgiven

New blood joins this earth
And quickly he's subdued
Through constant pained disgrace
The young boy learns their rules

With time the child draws in
This whipping boy done wrong
Deprived of all his thoughts
The young man struggles on and on he's known
A vow unto his own
That never from this day
His will they'll take away

What I've felt
What I've known
Never shined through in what I've shown
Never be
Never see
Won't see what might have been

What I've felt
What I've known
Never shined through in what I've shown
Never free
Never me
So I dub thee unforgiven

They dedicate their lives,
To running all of his
He tries to please them all
This bitter man he is
Throughout his life the same
He's battled constantly
This fight he cannot win
A tired man they see no longer cares
The old man then prepares
To die regretfully
That old man here is me

What I've felt
What I've known
Never shined through in what I've shown
Never be
Never see
Won't see what might have been
What I've felt
What I've known
Never shined through in what I've shown
Never free
Never me
So I dub thee unforgiven

What I've felt
What I've known
Never shined through in what I've shown
Never be
Never see
Won't see what might have been
What I've felt
What I've known
Never shined through in what I've shown
Never free
Never me
So I dub thee unforgiven

Never free
Never me
So I dub thee unforgiven

You labeled me
I'll label you
So I dub thee unforgiven

Never free
Never me
So I dub thee unforgiven

You labeled me
I'll label you
So I dub thee unforgiven

Never free
Never me
So I dub thee unforgiven...

Fonte: Musixmatch

Compositores: Ulrich Lars / Hetfield James Alan / Hammett Kirk L
Letra de The Unforgiven © Creeping Death Music

A questão do vírus vai ficando para trás


Montanaro

domingo, 27 de dezembro de 2020

O velho normal

 



Hotel California

"Feliz Ano-Novo", que perigo


Há um esboço de novidades saudáveis, esse gênero que passou de escasso a extinto

Na passagem do mal vivido para o vamos ver, o Brasil recomenda aos seus filhos muito bom senso ao desejar feliz Ano-Novo. Seja qual for sua sinceridade, convém que esses votos sejam certeiros na destinação. Não só para evitar desperdício. Os votos tradicionais, extensivos e indiscriminados, estão perigosos. Podem ser até suicidas.

Não, nada a ver com a Covid-19. Mais um ano feliz para os 37% que aprovam o governo resultaria da permanência de toda a alucinação e destrutividade, desprezo pela vida das pessoas e pelo futuro do país, predominantes nestes dois anos. Seria a continuidade de um ano que 63% dos brasileiros sentiram entre reprovável e sufocante. Sim, resgatar o Brasil e retomar o passo da democracia depende de que os felizes com os dois anos passados sejam os infelizes do próximo ano. E o sejam tanto e tão cedo quanto possível.

Nesse sentido, há um esboço de novidades saudáveis, esse gênero que passou de escasso a extinto. Uma delas é a incipiente aliança de MDB, DEM, PDT, Cidadania e PT com o objetivo de fazer o futuro presidente da Câmara.

Um feito devido, sobretudo, à hábil confiança conquistada por Rodrigo Maia e a uma reconsideração experimental do PT em vista das circunstâncias.

Há reações no petismo. O candidato próprio é uma ideia com longo predomínio no partido. No caso atual, como em tantas ocasiões, candidato à derrota, apenas para marcar posição e mobilizar em torno da militância. Nessa altura, não chegaria a uma coisa nem outra. Agora se trata de defender a democracia, por mais exígua que viesse sendo.

Eduardo Cunha proporcionou uma exibição completa, como nunca se vira, do que é possível fazer com o domínio da presidência da Câmara: vai da mais variada corrupção ao golpe de Estado parlamentar.

E nem o mínimo de lucidez permite duvidar do que a tropa do governo fará se conquistar também esse poder.

A novidade não pretende ser uma frente, com projeto comum mais longo. É uma aliança tática, portanto efêmera, para finalidade delimitada —o que a faz viável.

Outra novidade induzida pelas circunstâncias é a decisão de quatro ministros do Supremo de trabalhar durante suas férias de verão. A atitude de Lewandowski, Marco Aurélio, Moraes e Gilmar está interpretada, sem confirmação, à defesa da criação de juízes das garantias. Sozinho, Fux ficaria com a palavra decisiva sobre essa inovação importante, contra a qual já se manifestou.

Se isso moveu os quatro, não foi só isso. Cármen Lúcia não abandonará o processo que questiona a política antiambiental. E os processos criminais que assustam os Bolsonaros seguem, no STF, sem manobras salvadoras.

É pouco, por certo, diante das circunstâncias. Mas, em um país que passou dois anos sem ver nem sequer uma instituição, ou seus integrantes, mover-se contra o assalto à Constituição, à democracia e aos bens e interesses maiores do país, chega a parecer verdadeira a tão repetida sentença: “As instituições estão funcionando”.

Preferimos insuflar uma guerra civil a combater a desigualdade que o racismo sustenta


Temos no Brasil uma legião de insepultos lutando por uma fantasia de atraso 

Bernardo Carvalho

Durante muito tempo achei que o Brasil fosse a cópia escarrada do Sul dos Estados Unidos, sem a Guerra de Secessão ou antes dela. Aqui se defende o indefensável. Preferimos insuflar uma guerra civil a combater a desigualdade e abrir mão de privilégios que o racismo sustenta. Com o estranho agravante de que aqui os negros são maioria.

Durante muito tempo identifiquei o Brasil com o anacronismo dos estados sulistas confederados. Somos capazes de eleger um presidente e um governo que trabalham abertamente contra os direitos civis, a diversidade e as ações afirmativas, para dizer as coisas em termos eufemísticos e publicáveis. Os confederados daqui estão no poder.

Gente que sabe que, na prática, matar negros é crime inimputável, se não direito garantido por “excludentes de ilicitude”. Ou já saberíamos quem mandou matar Marielle Franco.

Os anos Trump deixaram claro, para quem ainda não tinha entendido, que a Guerra de Secessão não acabou. E que não há anacronismo nenhum. Os confederados lutaram para manter a escravidão. E o motivo da guerra continua a assombrar e dividir o país.

É a tese de Michael Gorra em “The Saddest Words” (as palavras mais tristes, ed. Liveright, 2020), sobre William Faulkner e a Guerra Civil americana. Não faltariam motivos para quem hoje quisesse cancelar o maior romancista americano do século 20 com base em suas declarações infames, incoerentes e nem sempre sóbrias.

Além de alguns dos romances mais geniais da história da literatura de todos os tempos, Faulkner também foi autor de cartas e frases que atestam posições contraditórias e muitas vezes indefensáveis sobre negros e a escravidão, a exemplo de quando equiparou supremacistas brancos à Associação Nacional para o Progresso das Pessoas de Cor, como duas formas igualmente condenáveis de extremismo (vimos algo semelhante por aqui, recentemente, e conhecemos as consequências).

Nem por isso o escritor deixou de receber ameaças de morte por parte de seus conterrâneos brancos. Os romances são a chave. E é pelos romances que Michael Gorra o defende.

O problema de muita gente disposta a cancelar o autor de uma frase é a incapacidade de ler o parágrafo inteiro, para não dizer o livro. Gorra nos explica como funciona a literatura e por que Faulkner é o autor indicado para quem quer entender o fantasma do racismo nos Estados Unidos.

Seus romances são a expressão da Guerra Civil incorporada por uma subjetividade atormentada pelo estigma da raça (que pode até não ser visível, mas está no sangue), pela miscigenação, pelo estupro e pelo incesto.

Faulkner condenava a escravidão sem poder desvencilhar-se do mundo que ela criou, que é o mundo de seus livros, onde a honra é também ignomínia. Cancelá-lo só nos torna ainda mais cegos e vulneráveis ao que desejamos combater, ao que não podemos suportar no presente.

Quando, nos anos 1950, Faulkner pediu calma (“go slow”) aos advogados do processo de dessegregação do Sul dos Estados Unidos, o destemido James Baldwin não hesitou em denunciar a desonestidade da proposta depois de mais de 200 anos de escravidão e 90 de semiliberdade para os negros. “Eles nunca admitiram seriamente a insanidade de sua estrutura social”, Baldwin retrucou, definindo por tabela a tragédia dos personagens de Faulkner.

A “palavra mais triste” é o verbo reiteradamente conjugado no passado. É a fantasia acintosa de “E o Vento Levou”. O que Faulkner dramatiza, ao contrário, é a consciência inexorável dessa impostura e dessa violência, a fantasmagoria de um mundo obsceno, convertido em negação repetida, idealização de um paraíso perdido, ruína e mito.

O passado com o qual toda uma sociedade se recusa a acertar as contas volta como maldição, trauma de um fracasso reincidente, o indefensável enterrado em cova rasa.

Não é preciso nenhuma pirueta intelectual para entender que, no Brasil, é à negação perpetrada pelos que já não tinham caráter nem coragem para assumir suas responsabilidades no passado, e aos quais agora faltam dignidade e competência para assumir suas responsabilidades no presente, que melhor corresponde a farsa de homogeneidade à qual os espectros de Faulkner tentam se agarrar, em vão, contra a força da modernidade e as evidências históricas.

Temos no Brasil uma legião de confederados escarrados, insepultos, lutando por uma fantasia de atraso, agarrados ao poder pela mentira. Faulkner é uma força da modernidade irrompendo das entranhas do racismo. Seus livros são uma enorme pedra de contradição no caminho dessa gente.

Carnagem



sábado, 26 de dezembro de 2020

Exorcismos do Equinócio


O tsunami de burrice da esquerda antipetista

Vinícius Carvalho

Tá ficando cada vez mais difícil pensar em perspectivas de país e em sair desse atoleiro imundo protofascista que nos metemos, por causa da forma imbecil e sem foco como os debates tem sido conduzidos.

Tá todo mundo achando que o Brasil virou Estados Unidos. A direita quer que o Brasil vire o paraíso do consumo, e a esquerda quer que vire o paraíso dos costumes e militância.

Só na semana de Natal, dois tipos de vilania indigestas e inaceitáveis ocorreram aqui na Banânia e praticamente passaram batido:

1 - Doria e Bruno Pé na Covas cancelaram, no meio da maior recessão e pior paridade de poder de compra recente, a gratuidade para pessoas com mais de 60 anos. Com milhões de idosos vivendo com apenas 1 salário mínimo, ter que pagar para se deslocar impacta profundamente no seu poder de compra e qualidade de vida.

2- Partido NOVO comemora que conseguiu anular a obrigatoriedade das empresas contratantes de entregadores disponibilizar ÁGUA, álcool gel e produtos de limpeza básicos para os funcionários terceirizados. Isso no meio de um pandemia.

Tirando meia dúzia, a grande parte dos influenciadores da esquerda e da lacrolândia macunaímica, tudo tuiteiro vadio, passaram os dias PORRANDO O PT, por conta da sua polêmica com a Folha de São Paulo.

Segundo essas pessoas, na semana onde o NOVO fudeu com o precarizado e o PSDB fudeu com os idosos pobres de SP, a preocupação maior era fazer correção histórica com o PT. 

O PT virou simplesmente um partido racista na cabeça dessas pessoas. Acusaram o partido de "isabelismo" porque o Tarso Genro disse que foi o PT quem institucionalizou a política de cotas.

Desse fio acusatório realizado por retardados, comparando um presidente retirante, nordestino e operário, e uma presidenta torturada, com uma porra de uma Orleans e Bragança, surge outro fio:

A acusação de que o partido foi culpado pelo encarceramento em massa e acelerou o "genocídio" do povo negro.

Oras, o PT é diretamente ligado aos movimentos sociais, inclusive a miríade de movimentos negros, que obviamente foram fundamentais para a política de cotas.

Mas na ânsia de se descolonizarem, mergulham de cabeça na colonialidade estadunidense, só falta a orelha do Mickey. Oras, uma construção que vincula partido e movimento social não é importante e uma forma sofisticada e democrática de fazer política partidária?

Outra, se o PT não tem protagonismo na política de cotas, porque é seu protagonismo então o tal "encarceramento em massa", que veio direto do judiciário? Judiciário este que passou 13 anos em pé de guerra com o PT.

É prerrogativa do poder executivo encarcerar ou não? Se acham que sim, estudem mais.

E lembrem também que o PT não caiu e foi superado pelo PSTU, PCB ou PSOL. Foi superado pelo bolsonarismo. Pelo visto, o PT foi alvo de ódio e golpe também porque no senso comum "encarcerou de menos" e foi "leniente com a bandidagem e a violêcia urbana".

Mas eu sei, eu sei que isso não lhes importa. Afinal, se começar a encarar um determinado problema como adultos, como fica a lacração? Não pode, pô. Lacrar é preciso, é o objetivo.

E incluo nesse espiral lacratório grande parte dos marxistas também. 

E o PT por sua vez entrou em crise de identidade e parece ter dificuldade se sair. Está se deixando ser espancado por este tipo de discurso.

Está deixando criarem a narrativa de que o partido foi "racista" mesmo. Aí depois que essa mentira repetida mil vezes virar verdade, quero ver como vai se livrar dessa pecha.

"Ahhh Vinícius, o que você faria?"

Denunciação caluniosa e falsa comunicação de crime, é crime, artigo 339 do código penal. Eu processaria um por um. Acabou.

Outra coisa foi essa "aliança" com o Maia para a eleição do congresso. Só o PT, mais uma vez, está apanhando por isso.

O PT não aprende? Oras, a narrativa (assim como foi com o Boulos pós-derrota) já está pronta. Em 2022, o PT vai ficar como fisiológico porque apoiou o Maia. Mesmo que isso seja descontextualizado, que a ideia é isolamento do bolsonarismo, que será muito ruim se o Bolsonaro conseguir eleger o presidente da câmara, que é importante negociar mesas e etc.

Foda-se tudo isso. Ninguém liga.

PT tinha que lançar seu candidato próprio. Mesmo sem chance nenhuma de vitória. Só pra perder bonito com seus 60 votos e acabou. Foda-se se o Bolsonaro ganhar no congresso e CURRAR todo mundo.

O PT tem que aprender a voltar a "lacrar" também. Afinal, é só isso que importa hoje em dia. Grandes e lindas derrotas, coloridas, com Odara de Caetano ao fundo.

E em 2022 possa estufar o peito e recitar "perdemos, mas detestaria estar no lugar de quem nos venceu", e aí, obviamente, retiramos também narrativa do PSOL, de que eles são limpos e impolutos e nós sujismundos.

Engenharia croata

Rua Haulikova, Zagreb, Croácia

Fonte: Engenharia da Fé

Nazismo de afeto


Que vergonha, excelências!


Cristina Serra

Ainda nem temos vacinas aprovadas e liberadas, e STF e STJ já estavam prontos para furar a fila da imunização

No Brasil, existem cidadãos comuns, como você, leitor, e eu. E existem castas, como o Judiciário, sustentadas com o dinheiro dos nossos impostos e adubadas com privilégios e mordomias que ofendem o simples bom senso. Ainda nem temos vacinas aprovadas e liberadas e suas excelências do STF e do STJ já estavam prontas para furar a fila da imunização. As duas mais altas cortes enviaram os pedidos à Fundação Oswaldo Cruz, que os rechaçou.

Num momento de emergência sanitária e com autoridades incompetentes no comando da saúde dos brasileiros, as maiores instâncias do Judiciário deveriam ser as primeiras a dar o bom exemplo e aguardar sua vez na escala de prioridades, a ser definida de acordo com critérios científicos e levando-se em conta a vulnerabilidade de grupos mais expostos ao vírus. Mas as cúpulas do Judiciário preferiram se orientar pelo adágio mesquinho: farinha pouca, meu pirão primeiro. O que me lembra também o salve-se quem puder da primeira classe no convés do Titanic.

O STF pediu uma reserva de 7.000 doses para ministros e servidores do tribunal e do Conselho Nacional de Justiça. O STJ disse que enviou um “protocolo comercial”, que se refere à “intenção de compra” das doses para imunizar magistrados, servidores e seus dependentes. Sim, você leu direito. O STJ alegou que pretendia comprar as vacinas que, até onde se sabe, serão distribuídas gratuitamente pelo Plano Nacional de Imunização (vai saber quando). Seria um auxílio-vacina?

Não fosse a revelação pela imprensa e a negativa contundente da Fiocruz, talvez outras categorias já estivessem a reivindicar tratamento “isonômico”. A mentalidade da aristocracia do setor público brasileiro opera uma rota de colisão com qualquer projeto de sociedade menos desigual e mais justa. Regalias de toda sorte para uma elite “diferenciada” transformam em uma quimera o ideal de cidadania já alcançado por outros países. Data vênia, excelências, que vergonha!

O irrealismo trágico de Donald Trump


A cada dia, Trump se afasta mais da realidade e da decência. As próximas semanas, até 20 de janeiro, serão muito perigosas.

José Eduardo Agualusa

Quando dois universos paralelos colidem, o desastre é inevitável. O melhor exemplo de um desastre assim chama-se Donald Trump.

A saída passaria por isolar o epicentro da colisão, no caso esse espantoso alienígena cor-de-laranja. Não sendo possível remetê-lo de volta ao bizarro universo de onde escapou, um mundo semelhante ao nosso, mas no qual os valores estão invertidos — a verdade é a mentira, o bem é o mal, o feio é o belo, etc. —, seria desejável mantê-lo totalmente isolado e incomunicável. Eventualmente, enviando-o para a lua, ou para uma estação orbital sem qualquer comunicação com a Terra.

Caso contrário, existe um risco severo de contaminação. O alienígena acabará corrompendo e distorcendo o nosso próprio universo. É, aliás, o que está acontecendo. A reunião do passado dia 18, no Salão Oval da Casa Branca, juntando figuras como Sidney Katherine Powell, o general reformado Michael Flynn (condenado por ligações ao regime russo e depois perdoado por Trump) e Rudolph Giuliani (ao telefone), deverá dar origem a muitos filmes de ficção política nos quais os nossos netos se recusarão a acreditar. No momento mais dramático do encontro, Flynn, com o apoio de Powell, terá defendido pura e simplesmente um golpe de Estado. Outros conselheiros, ainda não contaminados pela irrealidade trumpeana, reagiram aos gritos. Antes ou depois disso (já me perdi), Trump divulgou um apelo a uma manifestação “selvagem”, agendada para o próximo dia seis de janeiro.

Conseguirá a nossa realidade resistir ao brutal assalto da irrealidade trumpeana? Não tenho a certeza. É certo que alguns dos conselheiros de Donald Trump ainda não foram totalmente engolidos pelo irrealismo. Esses reagiram, dia 18, gritando de terror. Sabem que quando tudo isto serenar (se serenar) responderão perante a justiça por terem colocado em causa a reputação de pessoas, empresas e instituições.

Diante de um vasto ciberataque, que poderá ter comprometido um número ainda indeterminado de computadores em diversos departamentos federais, incluindo o Departamento do Tesouro e o Departamento de Comércio, Donald Trump preferiu ignorar informações consistentes dos seus próprios serviços secretos, que apontavam o dedo à Rússia — acusando a China. Após a embaixada norte-americana no Iraque ser atacada por foguetes de fabrico russo, Trump ameaçou o Irã. Na passada quarta-feira, recusou-se a ratificar o pacote de ajuda para aliviar os efeitos da pandemia, dividindo ainda mais o seu próprio partido.

A cada dia, Trump se afasta mais da realidade e da decência. As próximas semanas, até 20 de janeiro, serão muito perigosas.

Joe Biden esforça-se por aparentar calma, mas por detrás de algumas das suas declarações mais recentes é possível perceber um princípio de pânico. Analistas tentam adivinhar os próximos passos de Trump. É como tentar prever a direção do voo de uma barata. Essa imprevisibilidade, ou irracionalidade, torna Trump ainda mais perigoso.

Esperemos que 2021 nos devolva tudo de bom que 2020 nos roubou — e que eu nunca mais volte a escrever sobre Trump. Seria um bom sinal.