terça-feira, 30 de junho de 2020

Mike Oldfield - Tubular Bells - Live at the BBC 1973

Até quando Jair Bolsonaro ficará sem babar na gravata?

Bolsonaro rifa seus radicais, se afasta de olavistas e repete o que Hitler fez com os arruaceiros das SA


Em busca uma imagem mais domesticada para mercado, mídia, Supremo e os donos do Brasil, Bolsonaro está rifando os radicais que cultivou e que o apoiaram cegamente.

Não ofereceu uma palavra de solidariedade aos milicianos digitais que foram presos ou alvo de busca e apreensão da PF.

Sara Winter está até hoje aguardando um agrado do líder. Allan dos Santos chegou a contar com uma força de Eduardo na primeira prensa, mas o Zero 3 já sumiu.

Mesmo os deputados metidos no inquérito das fake news foram esquecidos — publicamente ao menos — pelo chefe.

Nesta terça, dia 30, Alexandre de Moraes decidiu prorrogar, por mais cinco dias, a prisão do blogueiro Oswaldo Eustáquio.

O sujeito é acusado de propagar ataques contra a democracia e mover uma rede de mobilização virtual em torno dos protestos golpistas.

A prisão, temporária, foi estendida a pedido da Polícia Federal porque Eustáquio participa de “fatos que estão sob apuração e guardam relação com atos de potencial lesivo considerável”.

Ele mobiliza pessoas “com afinidade ideológica” e propaga “o extremismo e discurso de polarização”. Além disso, mentiu sobre seu endereço.

Bolsonaro deve, também, indicar um substituto para Decotelli distante do olavismo ou da delinqüência de um Weintraub.

Não significa que Bolsonaro vai, de fato, virar gente. Mas ele dá o recado de que, para manter o poder, não hesitará em atirar ao mar seus cachorros mais raivosos.

Em 1934, Hitler fez esse mesmo movimento com as SA, as tropas de assalto que o ajudaram a subir ao poder.

O capitão Ernst Röhm, fundador do partido nazista, veterano da Primeira Guerra, havia se tornado um problema com seus arruaceiros especializados em espancamentos e assassinatos.

Röhm encara seu “exército plebeu” como o núcleo do nazismo, “a encarnação e garantia da revolução permanente”. A lealdade ao führer era absoluta.

Essa matilha, porém, desagrava e assustava a classe média e preocupava os militares e industriais, que formavam a base do regime.

Na madrugada de 30 de junho para 1º de julho de 1934, Hitler ordenou uma série de execuções políticas extrajudiciais, entre elas a de Ernst Röhm — cuja homossexualidade era usada pelos generais como argumento de sua perversão.

O verniz de civilidade durou pouco tempo, como se sabe.

Vamos ver até quando Jair Bolsonaro ficará sem babar na gravata.

Brasil tem mais de 59 mil mortes e 1,4 milhão de casos de coronavírus


Conass registrou 1.280 óbitos nas últimas 24 horas em todo o país

O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) contabiliza 59.594 mortes e 1.402.041 contaminados por coronavírus no Brasil, segundo atualização desta terça-feira 30. Nas últimas 24 horas, o órgão registrou 1.280 óbitos e 33.846 casos confirmados.

Os brasileiros ocupam a vice-liderança nos rankings mundiais de mortes e de casos de coronavírus, de acordo com a Universidade Johns Hopkins. Os Estados Unidos aparecem em 1º lugar nas duas listas, com mais de 127 mil óbitos e 2,6 milhões de infectados.

Apesar do crescimento dos índices, o Brasil segue sem ministro definitivo para a Saúde. Desde que Nelson Teich deixou a pasta em 15 de maio, o general Eduardo Pazuello exerce a chefia de forma interina.

São Paulo é o estado mais afetado, com 14.763 mortes e 281.380 casos. Em seguida, o Rio de Janeiro registra 10.080 mortes e 112.611 casos. Depois, vem o Ceará, com 6.146 mortes e 108.699 casos confirmados.


Jean-Michel Jarre - Oxygene: Live in Your Living Room


A natureza do miliciano não muda


Cachorro é resgatado das milícias e devolvido à sua família


Decotelli assume cargo de ex-ministro da educação


Bolsonaro indicou que irá aceitar pedido de demissão de Decotelli, segundo aliados. A jornalista Julliana Lopes  informou no Visão da CNN que Decotelli preparou a carta. Ele já está no Palácio do Planalto para apresentar o pedido.

Informação da CNN Brasil

Coronavírus: Reabertura dá errado nos EUA e serve de alerta ao Brasil



Kennedy Alencar

Exemplo do que pode acontecer no Brasil, a reabertura da economia nos Estados Unidos deu com os burros n'água. A epidemia do novo coronavírus voltou a crescer no país, especialmente em estados do sul.

Em maior ou menor grau, 16 estados decidiram revisar seus planos de reabertura econômica. Estados nos quais o ritmo de crescimento de casos de covid-19 se manteve estável ou caiu estão reavaliando os próximos passos, com medo de que a epidemia que se alastra no sul do país volte a provocar estragos onde a situação parece sob controle, como Nova York, Nova Jersey e Connecticut, que ficam no nordeste dos EUA.

Governadores e especialistas temem que o próximo fim de semana, quando haverá o feriado de 4 de Julho, o Dia da Independência norte-americana, reúna multidões e agrave ainda mais a transmissão do coronavírus. É verão no hemisfério norte, o que tem levado mais gente às ruas.

No Arizona, bares, restaurantes, cinemas, academias de ginástica e parques aquáticos voltaram a ser fechados. Já há ocupação de 90% dos leitos de UTI com pacientes de covid-19.

Na Califórnia e Flórida, praias ficarão fechadas no feriado. Em algumas cidades, estão proibidos os tradicionais fogos de artifício de 4 de Julho a fim de evitar aglomerações. No Texas, a associação de bares está processando o governador republicano Greg Abbott, que reordenou o fechamento dos estabelecimentos.

Os novos casos de covid-19 crescem mais no segmento da população entre 20 e 35 anos de idade. De modo geral, a taxa de mortalidade ainda permanece baixa no país, porque essa faixa etária é mais resistente ao coronavírus, mas o número de internações aumentou perigosamente em alguns estados.

Há preocupação de que jovens assintomáticos transmitam a doença para pessoas mais velhas, o que elevaria o número de mortes em algumas semanas. Ou seja, a epidemia tenderia a continuar piorando e poderia voltar a aumentar o número de mortes diárias no país. O prefeito de Los Angeles, Eric Garcetti, disse que as próximas duas semanas serão fundamentais para retomar ou perder o controle sobre o coronavírus.

O que acontece nos EUA serve de alerta ao Brasil, país que teve a quarentena abertamente boicotada pelo presidente Jair Bolsonaro e por boa parte da sociedade, especialmente por setores do empresariado.

Governados por Donald Trump e Jair Bolsonaro, dois presidentes que negam a ciência e menosprezam o uso da máscara em público, EUA e Brasil têm o maior número de casos e mortes por covid-19 em todo o planeta. Isso não é mera coincidência, mas resultado de respostas incompetentes à maior crise sanitária em 100 anos.

Na manhã desta terça-feira, o ranking da Universidade Johns Hopkins contabilizava quase 2,7 milhões de casos e cerca de 130 mil mortes nos EUA. No Brasil, os casos se aproximavam da marca de 1,4 milhão. Mais de 58 mil brasileiros já morreram de covid-19.

Existe consenso entre especialistas de que foi prematura a reabertura econômica na grande maioria dos estados americanos, sobretudo aqueles governados por republicanos. Muitos governadores ignoraram os critérios mínimos estabelecidos pelo CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças), órgão federal que estabeleceu parâmetros concretos para a reabertura, como aguardar duas semanas de queda de casos de coronavírus para retomar atividades públicas e ter capacidade hospitalar suficiente para suportar eventuais surtos.

Trump agiu como um garoto-propaganda da reabertura, pressionando irresponsavelmente estados a retomar suas atividades econômicas mesmo sem obedecer às recomendações do seu próprio governo. A aposta política de reabrir a economia logo para melhorar a sua chance de se reeleger soa hoje como um tiro no pé do republicano, que está em queda nas pesquisas.

Diante da possibilidade de se repetir no Brasil o que acontece nos EUA, é assustador que o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), diga que pretende reabrir completamente a economia em agosto e que tratará a covid-19 como uma gripe, o que ela definitivamente não é. Também é desalentador que o país continue sem um ministro da Saúde de verdade.

Bolsonaro e governadores irresponsáveis copiam, de forma grotesca, o que há de pior nos Estados Unidos. Cometem crime contra a saúde pública e merecem ser responsabilizados penal e politicamente por isso.

Superhomem – a Canção

Gilberto Gil

#PorTrásDaLetra - "Superhomem, a canção"

Estava de passagem pelo Rio, indo para os Estados Unidos fazer a tour do lançamento do Nightingale e gravar o Realce, ao final da excursão. Na ocasião eu estava morando na Bahia, por isso estava hospedado na casa do @caetanoveloso

Como eu tinha que viajar logo cedo, na véspera da viagem eu me recolhi num quarto por volta de uma hora da manhã.

De repente eu ouvi uma zuada: era Caetano chegando da rua, falando muito, entusiasmado. Tinha assistido o filme Superhomem. Falava na sala com as pessoas eu fiquei curioso e me juntei ao grupo. Caetano estava empolgado com aquele momento lindo do filme, em que a namorada do Superhomem morre no acidente de trem e ele volta o movimento de rotação da Terra para poder voltar o tempo para salvar a namorada.

Com aquela capacidade extraordinária do Caetano de narrar um filme com todos os detalhes, você vê melhor o filme ouvindo a narrativa dele do que vendo o filme… Então eu vi o filme. Conversa vai, conversa vem, fomos dormir. Mas eu não dormi.

Estava impregnado da imagem do Superhomem fazendo a Terra voltar por causa da mulher. Com essa ideia fixa na cabeça, levantei, acendi a luz, peguei o violão, o caderno, e comecei. Uma hora depois a canção estava lá, completa. No dia seguinte a mostrei ao Caetano; ele ficou contente

Fiz a excursão norte americana toda e, só quando cheguei a Los Angeles para gravar o disco, foi que eu vi o filme. A canção foi feita portanto com base na narrativa do Caetano. Como era Superhomem – O Filme, ficou Superhomem – a Canção.

Dark Brasil


A desqualificação de Decotelli e o racismo bolsonarista


Luis Felipe Miguel

Decotelli já provou que não tem condições de ocupar o cargo - se tivesse, aliás, não seria nomeado por esse governo. A interface do Lattes é pouco amigável e pouco intuitiva, mas não a ponto de um doutorado brotar espontaneamente. Tratar o estágio pós-doutoral como título é um pecadilho comum por aqui, mas inventá-lo já é outra coisa. As evidências de plágio na dissertação de mestrado são igualmente sérias. E mais "inadequações" têm sido aventadas.

As desculpas que ele tem apresentado são risíveis. A melhor é que a tese de doutorado foi reprovada porque era demasiado profunda. (Ele estaria buscando o fundo do poço? Inútil; a gente já sabe que o poço não tem fundo.) Mesmo que fosse verdade, seria irrelevante. O fato de que é uma injustiça que eu nunca tenha ganhado o Nobel de Medicina não me autoriza a corrigir por conta própria a obtusidade do júri escandinavo e incluir a premiação no meu currículo.

Não vejo, porém, o mesmo empenho do gado na defesa de Decotelli que se vê quanto a outros integrantes do governo - flagrados em escândalos igualmente sérios, aos quais respondem igualmente com simples negação ou justificativas disparatadas. Isso é falta de vontade de brigar por alguém que se afirma "técnico" ou indício de racismo da base bolsonarista?

O que leva alguém a não usar máscara contra a Covid-19?


Atila Iamarino
Mais informação não altera atitudes em relação à ciência
Pergunte a qualquer pessoa o que um gráfico decrescente quer dizer e a maioria intui que é uma quantidade caindo com o tempo. Mas basta misturar um pouco de disputa ideológica e um fenômeno interessante acontece.

Se você rotular o gráfico como quantidade de gelo na Antártida ao longo do tempo e perguntar de novo, quem nega que o aquecimento global exista passa a interpretar o gráfico de maneira errada. E quanto maior o grau de educação, maiores as chances de a pessoa errar na interpretação e arrumar uma boa desculpa para isso.

E aquecimento global não é o único alvo polarizado sobre o qual as pessoas erram propositalmente ao serem perguntadas. A academia americana de ciências pergunta regularmente se as pessoas acreditam que o universo começou com o Big Bang. Apesar do avanço da ciência e todo gasto com educação e divulgação científica dos EUA, a taxa de acerto tem se mantido em 40% desde pelo menos 2012.
É uma pergunta com duas alternativas, sim ou não. Se as pessoas estivessem chutando uma resposta, acertariam metade das vezes. Essa quantidade de “erros” não é por acaso.

Quando mudaram a pergunta para “De acordo com astrônomos, o universo começou com o Big Bang?”, em 2016, quase 70% dos respondentes acertaram que sim.

A maioria dos americanos entrevistados sabe que essa é a visão científica, só não concordam com a ciência. Metade dos entrevistados que “erraram” não o fizeram por falta de informação mas sim porque discordam da realidade.

Esse fenômeno do raciocínio politicamente motivado passando por cima do que diz a realidade não é exclusivo de áreas científicas; só fica mais evidente aqui pois o consenso científico é menos rotulável como opinião. Mas a própria divulgação científica frequentemente ignora o fenômeno e ainda assume que se as pessoas pelo menos tivessem acesso à informação, veriam a verdade.

Ainda se descrevem os erros em pesquisas públicas sobre evolução como “falta de familiaridade com o tema”. E agora nós vemos essa negação colocando a saúde das pessoas diretamente em risco. Ceticismo sobre casos, ceticismo sobre medidas, até as mortes por Covid-19 se tornaram mortes de “pessoas com Covid-19”.

Movimentos de direita nos EUA inauguram o ceticismo sobre as máscaras, que seriam movimento da esquerda para domar as pessoas. Pergunte para uma asiática se as máscaras funcionam e ela vai responder, de máscara, que com certeza. Pergunte a um brasileiro e é questão de tempo até ele colocar em dúvida, como líderes políticos vêm fazendo. Como já fizemos com as vacinas.

Aliás, vacinas contra o coronavírus serão outro problema. Parece que todos estão esperando sua dose para voltar a rua, mas, dependendo da vacina que der certo, a história pode ser bem diferente.

Se a primeira vacina disponível vier de uma empresa com “sino” no nome, conspirações contra a “vacina chinesa” certamente farão da Covid-19 um problema mais persistente, como ainda é o sarampo.

O livro “ The Knowledge Illusion” define muito bem o que acontece. As atitudes em relação à ciência não são determinadas por uma validação racional de evidências. Por isso, mais informação não muda essas atitudes. As atitudes científicas são determinadas por fatores contextuais e culturais que as fazem muito resistentes à mudanças.

Ou seja, se sua comunidade acha usar máscaras uma afronta à liberdade ou qualquer outra indignação nociva dessas, não serão mais fatos ou mortes que vão convencer essas pessoas a colocarem máscaras. O mesmo acontecerá com vacinas. Por mais vidas que estejam colocando em risco. A solução, nesse caso, não é dar mais informação mas sim cobrar uma postura da mesma maneira que fazemos com cintos de segurança. Vacinas talvez precisem ser impostas, assim como o uso de máscaras.

Atila Iamarino
Doutor em ciências pela USP, fez pesquisa na Universidade de Yale. É divulgador científico no YouTube em seu canal pessoal e no Nerdologia

segunda-feira, 29 de junho de 2020

Miliciano paz e amor


Brasil tem mais de 58 mil mortes e 1,3 milhão de casos de covid-19

CartaCapital

Conass contabilizou 692 óbitos nas últimas 24 horas

O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) contabiliza 58.314 mortes e 1.368.195 contaminações por coronavírus em todo o Brasil. Segundo atualização desta segunda-feira 29, o país registrou 692 óbitos e 24.052 casos nas últimas 24 horas.

Os brasileiros ocupam a vice-liderança nos rankings mundiais de mortes e de casos de covid-19, de acordo com a Universidade Johns Hopkins. Em 1º lugar, os Estados Unidos contam mais de 125 mil óbitos e 2,5 milhões de contágios.

Em meio à pandemia, o governo federal segue sem nomeação definitiva para a chefia do Ministério da Saúde. O general Eduardo Pazuello comanda a pasta de forma interina, desde que Nelson Teich pediu demissão em 15 de maio.

São Paulo é o estado mais afetado, com 14.398 mortes e 275.145 casos de coronavírus. Em seguida, aparece o Rio de Janeiro, com 9.848 óbitos e 111.883 infectados. Depois vem o Ceará, com 6.076 mortes e 108.225 casos.

Segundo anunciou a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma vacina testada no Brasil é a melhor candidata no combate à covid-19. Mais de mil voluntários em São Paulo estão envolvidos nos estudos. Testes anteriores da fórmula tiveram resultados positivos no Reino Unido.

Pela Folha, não visto amarelo


O Grupo Folha deu não apenas apoio financeiro e ideológico ao golpe de 1964, mas apoio material e operacional à repressão e à caçada dos opositores do regime
A Folha de S. Paulo agora é "um jornal a serviço da democracia". Otimo. Mas não aspire a Folha ao título de campeã da democracia nem pretenda que vistamos amarelo a seu pedido.  E não apenas pelo apoio à ditadura - mais que um "erro", como diz o editorial de ontem,  um crime que não pode ser esquecido. Na democracia da Folha, em tempos recentes, faltou compromisso com o pluralismo,  sobrou intolerância e houve aversão ao resultado das urnas, quando os eleitos, como Lula e Dilma, a contrariam. Injetando ódio no antipetismo, o jornal foi  co-artífice do golpe de 2016, ajudando a abrir caminho para Bolsonaro.

Sobre a ditadura, a Folha agora vai dar um curso, ministrado em quatro módulos pelo jornalista e escritor Oscar Pilagallo, um ex-funcionário. O terceiro abordará o  período pós AI-5, o mais infame e cruel, em que a tortura, as mortes e desaparecimentos tornaram-se práticas do terror de Estado. Também neste período a Folha apoiou o regime, ao contrário do que disse no editorial de ontem:

"A censura calava a imprensa, que apoiou o novo regime num primeiro momento, caso desta Folha, que errou. Este jornal viu-se rapidamente engalfinhado pelo novo sistema de poder, perdendo a capacidade de reagir antes mesmo de percebê-lo."

Não foi só no primeiro momento, nem a Folha se engalfinhou com o regime. Não foi obrigada a colaborar, como outras empresas, com a montagem da Operação Bandeirantes, a tenebrosa Oban. E isso já é História.

No relatório final da Comissão Nacional da Verdade está documentado que o Grupo Folha deu não apenas apoio financeiro e ideológico ao golpe de 1964, mas apoio material e operacional à repressão e à caçada dos opositores do regime, já depois de 1968 e do AI-5;  Emprestou veículos de distribuição do jornal para a realização de tocaias contra militantes, muitos deles mortos no local, mesmo não tendo reagido.

O relatório da CNV lista diversas empresas que ajudaram a montar a Oban, embrião do sistema Doi-Codi. Recorre à tese de doutorado da pesquisadora Beatriz Kushnir - "Cães de guarda: jornalistas e censores, do AI-5 à Constituição de 1988", que “constatou a presença ativa do Grupo Folha no apoio à Oban, seja no apoio editorial explícito no noticiário do jornal Folha da Tarde, seja no uso de caminhonetes da Folha para o cerco e a captura de opositores do regime”.  A Folha sempre negou o uso dos carros mas muitos presos e torturados falaram da presença deles nas operações da repressão.

Nos anos 80, é verdade que a Folha apoiou a campanha das diretas desde o início e com isso conquistou um leitorado progressista e democrático. Mas a democracia não é só o direito de eleger governantes e a defesa dos direitos humanos, a condenação à tortura, à censura e ao arbítrio institucional. É também respeito ao pluralismo e ao contraditório, e sobretudo, o acatamento da vontade popular.

Muito antes do mensalão e do petrolão, que armaram a mídia com o discurso de combate à corrupção, a Folha já demonstrava sua aversão aos governos petistas. Não tendo assimilado a vitória de Lula em 2002, já combatia com ganas seu governo antes de 2005, quando estourou o mensalão, cuja cobertura foi um massacre nunca reservado a outros partidos e acusados. E quando Dilma tornou-se candidata em 2009, chegou a publicar uma ficha policial falsa da ex-presidente, atribuindo-lhe a participação em ações armadas das quais não participou. Quando a Folha admitiu o erro, o estrago eleitoral já fora feito.  

Foi neste período que os veículos de imprensa, incluindo a Folha, expurgaram de seus quadros muitos profissionais que não se engajaram na chacina ideológica, não por serem  "petistas', mas por razões jornalísticas, deontológicas mesmo.

Mas registro uma conduta antidemocrática da Folha sobre a qual talvez ninguém mais falará. A existência de um sistema público de radiodifusão é atributo das democracias. Todas elas - as que são dignas do nome - têm suas TVs e serviços públicos de informação e comunicação, lacuna que o Brasil nunca havia preenchido. Mas quando Lula atendeu a um movimento vindo da sociedade, liderado por Gilberto Gil, e decidiu criar a EBC, que implantou a TV Brasil e passou a gerir como públicas as emissoras de rádio e outros serviços até então estatais, a Folha foi o veículo que fez a mais implacável oposição ao projeto. Não detendo concessões de radiodifusão, espancou a EBC ininterruptamente, pelo menos ao longo dos quatro anos em que presidi a empresa. Chamava a TV Brasil de TV do Lula, desqualificava sua programação, apegava-se à questão da audiência como critério de valoração absoluto e buscava o tempo por alguma irregularidade, que nunca encontrou. Não tendo tido interesses ameaçados, moveu-se por razões ideológicas, porque havia Lula na iniciativa.  Mas um jornal a serviço da democracia não deveria apoiar a comunicação pública, que é da essência das democracias contemporâneas?

Entretanto, depois do golpe de 16, quando Temer deformou a EBC, alterando sua lei e promovendo a caça às bruxas na empresa, e agora, quando Bolsonaro completa a desconstrução, militarizando seu comando e rebaixando-a à condição de aparelho de propaganda de seu governo, não se ouve qualquer censura da Folha.

Também por isso, seu fervor democrático não pode comover os verdadeiros democratas, ao ponto de vestirem amarelo a seu pedido.

Volta às aulas


Reabertura das escolas no Rio de Janeiro, junho de 2020.

Não são números


José Roberto Torero Fernandes Junior


A coisa mais bela e triste que li sobre as mortes pela covid-19 foi o www.inumeraveis.com.br.

Ali você conhece Francisca, que transformava até seu arroz queimado em alegria; Nilza, que reencontrou sua filha depois de 29 anos; Hailton, que tinha como bordão "O que precisar, é só pedir"; Julcivan, de 48 anos, que amava açaí com camarão; Eduardo, o inspirado professor cearense que escrevia poemas até em guardanapos; Agatha, que tinha apenas 25 anos e adorava gatos; Seu Barone, eterno chefe da estação Pirituba; Elzo, que amava Luiza e o Londrina Esporte Clube; Adonias, que falava pouco e ria muito; Laura, que nas festas jogava bombons para o alto; Quézia, de 34 anos, que não entendia como Deus podia ser tão bom com ela; Maurício, que ficava feliz com casa cheia,, mesa farta e todos falando ao mesmo tempo; Paulo, que queria ser criança para sempre; Vanildo, que tinha 56 anos e queria viver até os cem; e Quitéria, que amava a família, a praia de Iracema e o bloco "O cheiro é o mesmo".

Vendo aqueles resumos de vida, a gente percebe que 57 mil é um número horrível, desastroso, funesto. Mas é apenas um número. Na verdade, são inumeráveis histórias, inumeráveis pessoas que poderiam ter tido uma vida mais longa e feliz.

E aí vem uma raiva imensa. Sem usar nenhuma palavra de ordem, nenhuma frase de indignação, aquelas histórias mostram que Bolsonaro não é apenas corrupto, imbecil e fascista. Ele é um irresponsável que causou milhares de mortes. Um assassino. E por isso deveria ser deposto e preso.

Mas não quero, nem acho justo, acabar este texto falando nele. Porque há histórias como a de Zélia, que adorava cantar uma música que dizia "Igual à andorinha, eu parti sonhando".


O inverno está chegando

Não está fácil a vida dos jornalistas bolsonaristas. Alguns voltaram a escrever sobre banalidades, para não ter que fazer volteios em textos e falas em que defendem o sujeito.

A Bandeirantes mandou embora Luis Ernesto Lacombe, que pode ser substituído por Zeca Camargo.

As corporações não querem tombar ao lado de milicianos e começam a se livrar de incômodos. Vão sobrar apenas os jornalistas mais fofos, que falam de flores para camuflar ideias da direita.

Esses terão longa vida. Mas o inverno do jornalismo bolsonarista será tenebroso.


Conheça melhor a Ana


Essa é a Ana.

Ana odeia cotas, Ana odeia a influência do governo na vida das pessoas. E Ana odeia especialmente o Bolsa Família. Ana acha que as pessoas precisam aprender a pescar. Por isso, Ana está indo ao Caribe. Ana quer ser instrutora de pesca.

Ana sacou os 600 reais do auxílio emergencial pra comprar varas de pescar e ensinar as pessoas a serem independentes.

Ana votou em Bolsonaro, pois está cansada de tanta corrupção. Força, Ana.

(na imagem, Ana faz sinal de varinha de pescar)

Ana Paula Brocco

Os livros recomendados pela Sara Winter

Sara Winter encontrou um destino pouco nobre para os livros na casa dela: pé de sofá. O saber nunca esteve tão em baixa. Pelo menos não fez queima de livros como os nazistas em 21 de junho de 1933.

Florestan Fernandes


Ministro da Educação foi reprovado no Telecurso do Ensino Médio


Ministro da Educação mente sobre pós-doutorado na Alemanha, diz universidade de Wuppertal
Universidade alemã confirmou que pós-doutorado de Carlos Alberto Decotelli, ministro da Educação de Bolsonaro, é fake. Universidade argentina já havia desmentido publicamento título de doutor

Em nota e comunicado pelo Facebook à revista Exame, a Universidade de Wuppertal (Bergische Universität Wuppertal) afirma que o ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli, mente em seu currículo lattes sobre ter realizado um pós doutorado na instituição.

A nota enviada pelo departamento de imprensa da Universidade de Wuppertal, em inglês, diz que Decotelli “não obteve um título em nossa universidade” e que a universidade não pode fazer declarações sobre títulos obtidos no Brasil.

Em seu currículo Lattes, cuja última edição foi feita em 27 de junho, Decotelli diz obteve seu pós-doutorado na Universidade de Wuppertal entre 2015 e 2017. Segundo a Universidade, o ministro esteve na universidade, para uma pesquisa de três meses em 2016, na cadeira de uma professora que é agora emérita na instituição.

O pós-doutorado é feito por pessoas que já obtiveram o título de doutor. No entanto, reitor da Universidade Nacional de Rosário, da Argentina, Franco Bartolacci, desmentiu publicamente o ministro, dizendo que ele não possui doutorado na instituição – que também constava em seu currículo lattes.

A universidade argentina é a mesma que concedeu título de Doutor Honoris Causa ao ex-presidente Lula.

Decotelli também está sendo acusado de plágio em sua dissertação de mestrado defendida em 2008 pela FGV. O professor do Insper, Thomas Conti, apontou em sua conta do Twitter, neste sábado (27), vários trechos do trabalho de Decotelli similares aos de um documento da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) do Banrisul.

“Tinha tanta coisa parecida entre esse relatório da CVM e a dissertação que eu desisti de achar as partes iguais na mão e joguei em um software de detecção de plágio. Mais de 10% da dissertação de mestrado é cópia idêntica ao relatório da CVM. 4.200 palavras”, aponta Conti.

Acabou a mamata!


Apoie o trabalho do Jota Camelo (clique no link):

Segura firme, miliciano!



domingo, 28 de junho de 2020

All Along The Watchtower


John Wetton & Steve Hackett

Mais tortura


Brasil lidera e mundo registra novo recorde de covid-19 em 24 horas


OMS anuncia 189 mil casos novos, com brasileiros e americanos na ponta
Colunista do UOL

Seis meses depois de o mundo registrar oficialmente o primeiro caso da Covid-19, o surto ganha a cada dia mais força. Dados publicados neste domingo pela OMS revelam um número inédito de novos casos em 24 horas. No período avaliado pela entidade, foram 189 mil casos extras, com o Brasil liderando as infecções e mortes.

Nesta semana, a agência mundial da Saúde vai marcar os seis meses do primeiro caso informado à entidade, em 31 de dezembro de 2019. Mas a marca será usada para que a cúpula da OMS alerte, nesta segunda-feira, que não há sinais de que a crise esteja perdendo força.

Um apelo será lançado a partir de Genebra para que governos assumam suas responsabilidades, superem divisões internas e estabeleçam acordos mundiais. Também haverá um pedido para que os estados insistam de forma significativa em testes e que medidas de proteção social e distanciamento sejam mantidas.

Para reforçar sua tese, a agência irá insistir sobre os números mais recentes, os piores desde o começo da crise.

Os dados da OMS estão defasados em pelo menos um dia, já que a agência precisa coletar as informações de 193 países para fazer seu mapa mundial. Por isso, de acordo com a entidade, o número oficial de casos ainda é de 9,8 milhões. Para outros bancos de dados, o total já superou a marca de 10 milhões e 500 mil mortos.

Com 46,8 mil casos, o Brasil é o líder mundial em número de novos casos no período de 24 horas. Os americanos vêm em segundo lugar, com 44 mil. Sozinho, o Brasil registrou quase três vezes o número diário da Europa, com 16,5 mil novos casos nas últimas 24 horas. O país, porém, representa apenas 2,3% da população mundial.

O recorde mundial supera outra marca também assustadora, registrada na sexta-feira. Naquele momento, foram 170 mil novos casos.

A OMS alerta que o mundo precisou de dois meses para atingir os primeiros cem mil casos, o que hoje ocorre em praticamente doze horas.

No que se refere ao número de mortes, o período de 24 horas somou 4,6 mil novos óbitos, com 990 deles ocorrendo no Brasil.


Ameaça global

Meio ano depois do primeiro alerta oficial da China, em 31 de dezembro de 2019, e meses depois da emergência global declarada pela OMS no final de janeiro, é a situação no Brasil que ocupa em grande parte o centro das atenções nos debates a portas fechadas em Genebra.

Com 200 milhões de habitantes e sem controle, o país é avaliado por parte dos especialistas como uma "ameaça" na luta contra a pandemia, ao lado dos EUA.

De uma forma geral e contando desde os primeiros casos, o Brasil aparece na segunda posição em termos de mortes e casos. Mas, para os especialistas, não é o número acumulado desde o começo da crise que confere uma fotografia mais útil da situação.

Dados oficiais da UE indicam que, nos últimos 30 dias, o Brasil liderou no registro de novos casos, com 875 mil, quase cem mil acima do segundo colocado, os EUA. Em termos de mortes, o país também ocupa o primeiro lugar no último mês, com um total de 30,6 mil.

Nos últimos sete dias, o Brasil ainda lidera o mundo em termos de mortes, segundo os dados da OMS.

Em 14 dias, período de incubação do vírus, o Brasil também ocupa o primeiro lugar. Foram 460 mil casos neste período, 20% de todos os casos no mundo.

Mas não é apenas o número elevado que preocupa. Para as agências internacionais, não existe hoje no Brasil um plano claro de como sair da crise, a fatiga da população sobre a quarentena torna a medida cada vez mais frágil e não há um aumento suficiente no número de testes.

A exclusão do Brasil da lista de países que serão autorizados a voltar a voar para a Europa a partir do dia 1 de julho é apenas um sinal de como o mundo está reagindo. A UE promete apresentar uma nova lista com novos países a cada 15 dias. Mas diplomatas de Bruxelas confirmam à coluna que há uma forte resistência contra uma eventual inclusão do Brasil no futuro imediato.

Depois de apoiar a ditadura, o golpe de 2016, a Lava Jato e Bolsonaro, agora a Folha apoia a Democracia



Luis Felipe Miguel


"Um jornal a serviço da democracia", diz o novo slogan da Folha.

É o jornal que apoiou o golpe de 1964 e não fez nem a autocrítica hipócrita que a Rede Globo fez.

É o jornal que cedia seus furgões para que a Operação Bandeirantes levasse prisioneiros para os porões da ditadura, mas que até hoje finge que isso não ocorreu.

É o jornal cujo pranteado "publisher" dizia que no Brasil não teve ditadura: foi uma "ditabranda", que prendeu, exilou, torturou e matou tão pouquinha gente.

É o jornal que apoiou o golpe de 2016 e não permite que, nas suas páginas, se diga que o golpe foi golpe.

O jornal que fez coro a todos os outros na defesa da Lava Jato e de suas arbitrariedades, do lawfare contra o ex-presidente Lula, da criminalização da esquerda.

O jornal que bateu na tecla de que PT e Bolsonaro eram radicalismos simétricos, como forma de favorecer o apoio envergonhado da direita que se deseja civilizada a um projeto com nítidos tons neofascistas.

O jornal que é defensor infatigável da retirada de direitos da classe trabalhadora, da redução do Estado e da desnacionalização da economia. E que age, de forma deliberada e cuidadosa, com o objetivo de estreitar o debate público sobre todas essas questões.

Fiel a seu espírito megalômano, a Folha se coloca agora no papel de timoneira da luta pela democracia. Decidiu até fazer uma exortação para que todos usem amarelo. É, obviamente, mais uma tentativa de reforçar o paralelo mentiroso com a campanha das diretas.

A Folha quer derrubar Bolsonaro - acho ótimo. Fico feliz, de verdade. Quanto mais gente, melhor.

Mas, aliada na luta contra Bolsonaro, a Folha não o é na luta pela democracia. O que ela quer nos vender como democracia está longe até da encarnação mais pálida do ideal democrático.

Não merece seu nome uma "democracia" em que o campo popular tem papel fixo - o papel de derrotado, já que, quando há o risco dele obter alguma vitória, os poderosos têm a alternativa de virar a mesa.

Não merece seu nome uma "democracia" que quer tirar Bolsonaro, mas blindar Guedes (ou, pelo menos, suas políticas).

Antes de dar lições de democracia, a Folha tem que estar disposta a abrir mão do seu golpismo.

O governo buscava uma saída honrosa para o ex-ministro da Educação e conseguiu um episódio desonroso



Weintraub contrariou a burocracia do Banco Mundial


O governo buscava uma saída honrosa para Abraham Weintraub e conseguiu um episódio desonroso com um ministro escafedendo-se. Em condições normais ele assumiria seu cargo no Banco Mundial, mas quando a burocracia da instituição mostra-se contrariada com sua presença, é bom que se preste atenção.

Em 2007 os burocratas derrubaram o presidente do banco. Paul Wolfowitz era uma espécie de Weintraub de luxo do governo de George W. Bush. Como subsecretário da Defesa, foi um dos ideólogos da desastrada ocupação do Iraque.

Premiado com a presidência do banco, arrumou uma boquinha para sua parceira. Um protesto interno detonou-o em apenas três meses. (O doutor lambia o pente antes de passá-lo no cabelo)

Novembro vem aí

Jair Bolsonaro deveria conversar com veteranos do Itamaraty para decidir como conduzirá as relações com os Estados Unidos caso Joe Biden vença a eleição presidencial de novembro.

Se a diplomacia brasileira persistir na sua postura aloprada, consolidará sua posição de saco de pancadas do mundo.

Em 1976, quando o democrata Jimmy Carter ganhou a eleição, a ditadura brasileira passou pelo mesmo constrangimento. O novo presidente tinha uma agenda de defesa dos direitos humanos e pretendia sedar o acordo nuclear que o Brasil havia assinado com a Alemanha. Houve tensão e momentos de crise, mas profissionais dos dois lados impediram que a emoção agravasse as divergências. (O presidente Ernesto Geisel detestava Carter. Anos depois, quando os dois estavam fora do poder e o americano visitou o Brasil, recusou-se a recebê-lo. Carter ligou para sua casa e ele não atendeu)

Os dias futuros

Bolsonaro teria entrado num modo conciliador. Resta saber qual é a carga dessa bateria. Isso é vital, porque o pacificador referiu-se a dias melhores que vêm pela frente. O que vem pela frente são dias piores.

Linha editorial é uma coisa. Escárnio é outra.

Regime = rolpe militar para derrubar regime constitucional



A Folha fechou com o projeto de aniquilação total do Estado brasileiro que está no poder. Aniquilação total dos sistemas de saúde, educação e apoio à cultura. Aniquilação total do povo por meio de um genocídio de múltiplas camadas. O editorial é claro: um jornal a serviço do que eles chamam de democracia "até as próximas eleições presidenciais".

Ok.

Todo veículo de comunicação tem direito a ter sua linha editorial.

Ainda que se opor ao impeachment do estrumão, rumo que a direita neoliberal que usa guardanapo tem tomado com mais clareza nos últimos dias, os torne cúmplices de assassinato em massa liderados por um miliciano.

Ok.

Agora, pedir em editorial que seus leitores "resgatem o amarelo como símbolo da democracia" já é uma agressão estética, ética  e simbólica sem tamanho.  

Linha editorial é uma coisa. Escárnio é outra.


O vírus da cartolagem

A pandemia adiou a Olimpíada de Tóquio e cancelou o torneio de Wimbledon, mas os cartolas do futebol não podem esperar um pouco mais pelo retorno do carioca
Entre 40 milhões de rubro-negros, só um podia dizer que conquistou a América duas vezes. Jorge Luiz Domingos integrou a comissão técnica do Flamengo nas Libertadores de 1981 e 2019. Foi massagista das duas gerações mais vitoriosas do clube, onde trabalhou por quase quatro décadas.

Jorginho morreu no início de maio, vítima da Covid. A tragédia comoveu os atletas, mas não interrompeu a cruzada dos cartolas contra a quarentena. Duas semanas depois, o Flamengo atropelou decretos do estado e da prefeitura e retomou a rotina no Ninho do Urubu. No dia do treino clandestino, o presidente Rodolfo Landim voou para Brasília e almoçou com Jair Bolsonaro.

O repasto uniu dois negacionistas que ignoram ou fingem ignorar a gravidade da pandemia. Eleitos no fim de 2018, Landim e Bolsonaro forjaram uma aliança de interesses. A tabelinha colou a imagem do Flamengo, que já teve nove jogadores infectados, à extrema direita no poder. Uma mistura entre bola e política que ofende torcedores e desonra as tradições do clube.

No dia 18, o rubro-negro liderou a volta açodada do Campeonato Carioca. O Fla bateu o Bangu por 3 a 0, num jogo sem público e sem transmissão de TV. No mesmo dia, dois pacientes morreram no hospital de campanha ao lado do Maracanã. Bolsonaro ameaçou ir ao estádio, mas desistiu após a prisão do amigo Fabrício Queiroz.

O coronavírus adiou a Olimpíada, cancelou o torneio de Wimbledon e parou o circo da Fórmula 1. Nada disso convenceu a cartolagem a esperar um pouco mais pelo Carioquinha. Botafogo e Fluminense reclamaram, mas terão que voltar hoje aos gramados. Em outra partida inadiável, o Madureira enfrentará o Resende.

O técnico do alvinegro, Paulo Autuori, resumiu a situação como uma “bandalheira”. “Não há a mínima preocupação de salvar a integridade dos jogadores”, protestou. Em entrevista ao GLOBO, ele definiu a Federação de Futebol do Rio como “feudo”, “grande mamata” e “federação dos espertos”. Por dizer o que todos pensam, recebeu 15 dias de gancho.

A punição ao treinador combina autoritarismo e hipocrisia, duas faces do Brasil de 2020. Na sexta, o procurador André Valentim disse ao Tribunal de Justiça Desportiva que Autuori “ofendeu e denegriu” a imagem da Ferj. A entidade ganhou fama nas mãos de Eduardo Viana, o Caixa d’Água, que chegou a ser afastado por sumir com a renda do Maracanã. Há 14 anos, é comandada por Rubens Lopes, discípulo de Eurico Miranda e Castor de Andrade.

xxxxx
O presidente do Santander, Sergio Rial, é uma alma caridosa. Ao dissertar sobre as vantagens do home office, ele sugeriu que funcionários abram mão de parte dos salários e benefícios para trabalhar de casa após a pandemia.

“Se tudo isso te poupa tempo, você deixa de gastar combustível, tua vida fica mais fácil (...), por que não talvez dividir alguma coisa dessas com a empresa?”, propôs.

Num lapso de memória, o banqueiro deixou de mencionar a economia com despesas de escritório e a transferência de custos fixos para os trabalhadores. No ano passado, o Santander festejou lucro de R$ 14,5 bilhões.

O novo normal

Antonio Prata
Ele é saudável, cauteloso e precavido 
Primeira festa pós-quarentena. O anfitrião, ansioso, passa de roda em roda entretendo os convidados. Ao lado da janela avista, sozinho, um desconhecido.

— Oi, tudo bem? Você é o...?

— Novo Normal.

— Não acredito! Você é o Novo Normal?!

— Eu mesmo.

— Rapaz! Você chegou, finalmente! Faz um ano que só falam de você! Ah, o Novo Normal vai ser assim, o Novo Normal vai ser assado! Posso te dar um abraço?

Ilustração de Adams Carvalho 

O Novo Normal recua.

— Ah, claro! Contágio, né? Óbvio! Gente, gente! Vem cá! Esse aqui é o Novo Normal!

Uma meia dúzia se aproxima, uns estendem as mãos, outros já se espicham pra um beijo.

— Péra, pessoal, o Novo Normal é sem abraço, beijo ou aperto de mão, certo, Novo? Pode chamar de Novo?

— Prefiro Novo Normal, pra não confundir com o partido.

Uma convidada o olha, curiosa.

— Não sei por que, mas confesso que eu te esperava baixo, gordinho e careca.

— Muita gente me imagina assim. Acho que é o nome, né? Novo Normal, muito “o”, lembra ovo... Mas durante a quarentena o pessoal comeu muito, o Novo Normal é alto.

— Escuta, cê aceita uma bebida? Uma comida?

— Obrigado, eu engordei 7 kg durante a quarentena e bebi demais. Os hábitos do Novo Normal agora são comida saudável e zero álcool.

Uma convidada abandona, discretamente, a taça de vinho sobre uma mesa. Um convidado dispensa uma empada num vaso de pacová. Um outro puxa papo.

— Fala mais de você. O Novo Normal gosta de sair? De ir no cinema? No teatro? Em show?

— Não. Nada disso rola com o Novo Normal. Com a quarentena, as relações à distância se estabeleceram pra ficar.

Uma convidada, decepcionada, toma a dianteira:

— E aquela previsão de que o Carnaval pós-quarentena ia ser tão louco que faria Sodoma e Gomorra ficarem parecendo Aparecida do Norte?

— Deu chabu. O Novo Normal é saudável, cauteloso, precavido. O carnaval pós pandemia será pelo Zoom. Quem quiser anotar aí, aliás: www.telecotech.ziriguizoom.med.

— Ponto med?!

— É. O Carnaval agora é organizado pelo Ministério da Saúde. E o Carnaval de rua, pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, porque é todo dentro do Minecraft.

— Que horror! Eu tô solteira! Como eu vou arrumar um namorado, assim?

— Uma das coisas que a quarentena provou é que todo mundo pode viver sem sexo, contanto que o Pornhub e o Redtube liberem o acesso.

— Você não tem namorada?

— Presencialmente, não.

Deprimido com o Novo Normal, o anfitrião sai da roda discretamente e vai tomar uma água na cozinha. Ali encontra uma galera aglomerada, morrendo de rir de uma história contada por um gordinho, baixinho, careca, uma versão gente fina de um George Costanza, com uma cerveja numa mão e um cigarro na outra. O anfitrião cutuca uma amiga por ali:

— Quem é o figura?!

— Não tá reconhecendo? É o Velho Normal! Saindo daqui a gente vai pra um caraoquê na Liberdade e vamos terminar a noite comendo uma bisteca no Sujinho. Topa?

Quatro e meia da manhã, abraçados, todos sobem a Consolação pulando e cantando: “Ooooo! Velho Normal voltô ô ô! Velho Normal voltô ô ô! Velho Normal voltôôôô oooo!”.


Antonio Prata

Escritor e roteirista, autor de “Nu, de Botas”  

Um mundo de coisa acintosas

Luciana Pires, advogada do senador Flávio Bolsonaro, 
abraçada com o desembargador Paulo Rangel


Decisão da Justiça sobre Flávio Bolsonaro merece uma investigação

Nada acontece por acaso nesse inquérito sobre anos de apropriação de salários no gabinete do filho do presidente
A mais recente decisão da Justiça sobre Flávio Bolsonaro, favorecendo-o contra a investigação que mais abala seu pai, merece ela mesma uma investigação. Nada acontece por acaso nesse inquérito sobre anos e anos de apropriação de salários no gabinete de Flávio quando deputado estadual.

Em torno desse tema, emergem interações com milícias, exóticos negócios imobiliários e outros indícios. Todos do tipo que, nas ocorrências de combinação entre submundo e política, em geral são causa de ameaças, chantagens e subornos.

Os desembargadores Mônica Oliveira e Paulo Rangel têm comprovado conhecimento do acórdão do Supremo contra o qual votaram para transferir o inquérito, do juiz de primeira instância ao Órgão Especial do Tribunal de Justiça-RJ. Como desejado por Flávio. E com possível anulação de tudo até agora apurado por decisões do juiz Flávio Itabaiana, como movimentações financeiras anormais e a reveladora prisão de Fabrício Queiroz.

Em tentativa anterior da defesa de Flávio, Mônica Oliveira negou a transferência do caso. Como fixado pelo Supremo para o investigado que deixou a função privilegiada com instância especial. Hoje senador, Flávio não pode ter os privilégios dos deputados estaduais. Paulo Rangel deixou em livro seu apoio à norma contra a qual votou agora. Contradições tão acintosas, em oposição também à relatora Suimei Cavalieri (Flávio foi favorecido por dois votos a um), precisam de mais do que recurso ao Supremo para repor o respeito à norma, lá mesmo decidida e já aplicada.

Há mais do que a razão óbvia para estranheza e suspeição. A reviravolta expõe a Justiça ao mesmo comprometimento moral, e quem sabe legal, a que militares da reserva e da ativa estão expondo o Exército, como participantes diretos ou indiretos nos danos ao país causados pelo quarteto Bolsonaro e seus contribuintes. Os conselhos nacionais de Justiça e do Ministério Público, no entanto, notabilizaram-se, até agora, por sua tolerância com ilegalidades nas respectivas áreas, muitas delas gravíssimas como violação e nos efeitos. Resta contar, sem exagero, com o reencontro iniciado entre o Supremo e sua dívida com o país que tanto lhe dá.
Por sua conta, procuradores da República dão ao procurador-geral, Augusto Aras, um sinal da justa indignação que grassa entre eles: sua maioria sente, e repele, o incipiente reaparecimento de um Geraldo Brindeiro, o procurador-geral de Fernando Henrique batizado de engavetador-geral, símbolo de indignidade na Procuradoria e no governo de então.

Os procuradores elegem agora para o Conselho Superior do Ministério Público Federal o colega Mario Bonsaglia, o mais votado pela classe e preterido por Bolsonaro para substituir o dúplice Rodrigo Janot. Como reforço da mensagem, Nicolao Dino, já conselheiro, foi reeleito. Foi outro dos mais votados que Bolsonaro preteriu pelo sem voto Augusto Aras.

O primeiro teste pós-sinal já bate na porta de Aras, o relutante. Não há dúvida de que Ricardo Salles, ministro contra a preservação ambiental, já fez mais do que o necessário para responder por vários crimes de responsabilidade. Providência pedida à Procuradoria-Geral da República por nove ex-ministros do Meio Ambiente.

Ricardo Salles, invenção política de Geraldo Alckmin, é condenado por improbidade administrativa. Credencial que foi o mais provável motivo, à falta de qualquer outro, para ser o escolhido de Bolsonaro com a missão de destruir reservas indígenas, propagar o garimpo ilegal e os recordistas desmatamentos e incêndios amazônicos. Quase ignorado pela imprensa, abaixo de Bolsonaro é o maior causador de danos ao Brasil nas relações econômicas, diplomáticas e culturais do Brasil com o exterior.

Mas o próprio Bolsonaro iniciou nova fase: entrou em confinamento verbal. Desde a prisão de Queiroz, o que é uma prova irrefutável, e mesmo uma forma confessional, do perigo que agora lhe vem dessa longa ligação pessoal e funcional. Com novo dispositivo e novas figuras para remendar sua imagem, borrada por Wassef, Queiroz e o fugitivo Weintraub, Bolsonaro seguiu a recomendação de uma visita bem popularesca ao Nordeste. E foi celebrar, até com variadas mímicas de entusiasmo, um feito para a vida nordestina. A irrigação com águas do São Francisco. Obra de Lula e Dilma.

Não existe no Brasil nenhuma medida em andamento que tenha chance de reverter a pandemia nos próximos meses

Navegar ao sabor do vírus


Navegar ao sabor do vento significa içar vela e deixar que o vento nos leve para onde soprar. É abrir mão de comandar o futuro. O Brasil está navegando ao sabor do vírus. Abrimos mão de controlar a pandemia e o vírus está nos levando para onde deseja. Talvez mais lentamente do que poderia, pois não levantamos completamente a vela: lavamos as mãos, usamos máscaras e fazemos um mínimo de isolamento. Sem dúvida estamos caminhando em direção à tragédia, mas em câmera lenta, e não temos planos para retomar o controle. É a consumação da estratégia que chamei em 9 de maio de imunidade de rebanho por incompetência.

Ao sabor do vírus a pandemia no Brasil só terminará quando atingirmos a imunidade de rebanho, o único mecanismo biológico conhecido que inibe a propagação do vírus sem intervenção humana. Navegar ao sabor do vírus pode custar a vida de até 1% dos contaminados. A imunidade de rebanho geralmente ocorre quando 70% a 80% da população suscetível tiver sido infectada. Talvez ocorra antes, mas chegaremos lá antes de a vacina estar disponível. Isso é quase uma certeza. Quais são as evidências de que navegamos ao sabor do vírus? O gráfico abaixo, cortesia do meu amigo Cal, mostra nossa rota desde a chegada do vírus no Brasil.
No eixo vertical estão os números de novos casos por dia, por milhão de habitantes, em cada um de quatro países. Os dados diários foram plotados como uma média móvel de sete dias. O Brasil registra hoje por volta de 150 novos casos, a cada dia, por milhão de habitantes (sem contar as subnotificações), um número maior que os 90 registrados nos Estados Unidos. No eixo horizontal estão os dias que se passaram desde que cada país registrou um caso por milhão de habitantes. Isso ocorreu quando o Brasil registrou 220 novos casos por dia, os EUA, 330, o Reino Unido, 66, e a Itália, 60.

É fácil observar como a Itália, após um crescimento rápido do número de casos por dia, impôs um lockdown rigoroso após o dia 30 e tomou controle do barco. Passados 90 dias, estava com a pandemia sob controle. O Reino Unido demorou para responder e o lockdown veio mais tarde. Mas desde o dia 60 conseguiu reduzir o número de novos casos por dia. Os EUA também se assustaram com o crescimento rápido dos novos casos, implementaram um lockdown nas principais cidades, conseguiram estabilizar o número de novos casos, mas quando começaram a tomar pé da situação relaxaram o distanciamento social. Os resultados da abertura são gritantes, o crescimento rápido do número de novos casos por dia já está ocorrendo.

O mais impressionante é o barco brasileiro. Medidas brandas de distanciamento social retardaram o crescimento da pandemia, que cresceu lenta e livremente por 80 dias. Quando as medidas estavam começando a fazer efeito, veio o relaxamento do distanciamento social e a pandemia voltou a crescer mais rapidamente do que antes, totalmente fora de controle.

O pior no Brasil é que simplesmente não temos um plano para controlar esse crescimento. O exemplo mais claro dessa atitude é o anúncio da abertura das escolas no Estado de São Paulo. Ele deve ocorrer no início de setembro caso todas as áreas do Estado estejam com níveis de propagação classificadas como verde já no início de agosto. O problema é que não foi anunciado simultaneamente um plano capaz de garantir que o Estado de São Paulo atinja essa condição no início de agosto. Sem executar algum plano seguramente não chegaremos lá, pois São Paulo está batendo todos os dias os recordes de novos casos por dia e número de mortes por dia. Ou seja, as escolas não abrirão em setembro se o governo cumprir o que decretou.

Até agora as medidas anunciadas são inócuas para controlar a pandemia. Oferecer mais leitos de UTI ajuda os pacientes graves, o que é importante, mas não diminui o número de casos. E esse aumento tem limite, que eram respiradores, mas de agora em diante serão profissionais da saúde capazes de atender um número crescente de leitos. Liberar gradativamente as atividades ao menor sinal de desocupação de leitos vai seguramente na direção oposta do controle, pois cada liberação significa levantar um pouco mais a vela desse barco que navega ao sabor do vírus.

E a testagem em massa? Ela tem sido um fracasso em nosso Estado e em todo o País. Os governos sequer detalham o que significa esse termo e como ele pode levar ao controle da pandemia. O número de testes de RT-PCT, que detectam pessoas durante a fase em que estão transmitindo o vírus, e podem ser usados para isolar pessoas que estão transmitindo a doença, são executados em número ínfimo. Pululam iniciativas governamentais baseadas em testes sorológicos, que, sabemos muito bem, somente identificam pessoas que já passaram pela fase crítica da doença e já contaminaram quem deveriam contaminar. São inúteis para controlar a doença e uma bênção para o vírus.

Em suma, não existe nenhuma medida em andamento que tenha alguma chance de reverter o andamento da pandemia nos próximos meses. Nenhuma.

A impressão é que nossos governantes esperam por algum milagre, alguma intervenção divina que provoque a diminuição do espalhamento da doença de maneira mágica, sem que eles tenham de executar algum plano que tenha embasamento científico. Como a fração da população já infectada ainda é baixa, não existe nada no horizonte que vai conter o crescimento diário do número de novos casos em 2020. Estamos navegando ao sabor do vírus com a vela a meio mastro. 

Campo dos sonhos