Valor Econômico
Além de representar um risco institucional ao país, o presidente da República, Jair Bolsonaro, revelou-se também um risco à saúde pública. A propagação do coronavírus ameaça a vida de dezenas de milhares de brasileiros. Em sua ignorância garbosa, Bolsonaro não acha que o perigo é tão grande, cisma que pode ser uma armação, mais uma, da mídia e, mesmo sob suspeita de estar infectado após 12 membros da delegação que o acompanhou aos EUA serem portadores do vírus, resolveu ir a manifestações públicas e cumprimentar todo mundo. Pode ser o início do fim de seu prestígio político, pois o coronavírus é uma coisa séria demais.
A pandemia, uma das mais agressivas em décadas, ameaça o Brasil em seus pontos mais deficientes, as rede de saúde pública e a de proteção social. A pressão sobre elas será avassaladora, ainda mais porque suas demandas recaem sobre uma rede pública de saúde que já sofre a pressão de 180 mil casos de dengue e 6 mil de chicungunya. Mesmo sistemas de saúde eficientes, nos países ricos, estão sob estresse e vários deles não estão totalmente preparados para suportar a demanda súbita de centenas de milhares de pessoas a seus serviços.
Ao dizer que é “responsabilidade sua” estar ou não infectado, espalhando vírus por aí, o presidente demonstrou mais uma vez que não está à altura de suas responsabilidades e não mede esforços para manter-se no poder, apesar de ter dito durante campanha eleitoral que acabaria com a reeleição. O método com que pretende atingir seus objetivos, no entanto, não são os que regem a democracia.
As últimas ações do presidente são um escândalo. Bolsonaro se comporta como um agente provocador, afrontando sem parar os dois outros Poderes da República, e buscando caminhos para uma ditadura. Seus credos não mudaram, desde sua deputação medíocre por 28 anos, marcada por defesa dos pleitos dos militares e nunca mostrou qualquer respeito pela Constituição.
Não é verdade que eleito, Bolsonaro tenha um mandato para conduzir o Brasil ao fim da democracia, com o fechamento do Congresso e a prisão de ministros do STF, como sonha grande parte dos lunáticos que o aplaudem, tão vulneráveis ao coronavírus como o excapitão, ainda que acredite estar protegida por sua falta de informação abissal diante de uma pandemia devastadora.
Ao juntar-se a multidões, Bolsonaro ignorou todo o trabalho de seu ministro da Saúde, Luiz Mandetta, e dos governadores com os quais ele se reuniu. Agora, enciumado, pretende que Mandetta tenha um trabalho mais “ideológico” de defesa do governo, cujo presidente desacredita seu trabalho. Como só pensa em seu poder pessoal, insinuou que pode atrapalhar bastante o ministro, que está envolvido em uma batalha de vida e morte contra o vírus.
O presidente se superou ao misturar-se a manifestações de apoiadores contra o Judiciário e o Legislativo e, mais que isso, convocar o povo a lhe dar apoio em uma cruzada antidemocrática contra as instituições, a que por dever constitucional tem de proteger.
O presidente fica feliz com seu circo particular, que pode acabar logo. A pandemia do coronavírus pode causar danos sanitários, econômicos e sociais de uma magnitude poucas vezes vista. Suas bravatas de que se trata de histeria da imprensa logo mais será confrontada com hospitais superlotados e filas no SUS - uma paisagem desoladora, que pode perdurar mais tempo do que se imagina.
Bolsonaro não está à altura do cargo para o qual foi eleito ou de comandar o Brasil diante do desafio que lhe foi imposto. Em períodos de tranquilidade, suas traquinagens autoritárias eram descontadas na conta das promessas de uma economia em crescimento - a tarefa da qual o ministro Paulo Guedes foi incumbido. O sucesso de Guedes seria a chave para a reeleição, mas no meio do caminho veio uma crise, cuja gravidade Bolsonaro sequer percebe e que mal sabe avaliar. A incompetência e despreparo do presidente são patentes e tão claras quanto o mergulho que a economia sofrerá no ano. Diante da tempestade que se avizinha, Bolsonaro desafia quem não concorda com ele a ir às ruas, confiante de que se as coisas saírem do controle contará com o apoio dos militares de alta patente que o cercam no Planalto como escudo protetor.
Suas apostas são de alto risco. Quanto pior a crise sanitária e econômica, menor a chance de permanecer no Planalto. Líderes do Legislativo e do Judiciário, por enquanto, pedem que Bolsonaro governe. A depender da condução e da evolução da crise, podem mudar de ideia.
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