Antonio Prata
As teorias da conspiração são o último refúgio dos impotentes. É pra lá que eles fogem, acreditando libertar-se dos grilhões da mentira e da manipulação.
Ali, mocozados em seus terraplanismos, antivacinismos, cultuando seus ETs de Varginha, seus Foros de São Paulo, seus Chupa-Cabras, seus Olavos de Carvalho, suas mamadeiras de piroca, suas tramas da CIA ou da China, os olhos dos “desempoderados” brilham no gozo da verdade revelada.
Como mágica, o homem medíocre a quem os genes, a injustiça social ou a preguiça intelectual condenaram a uma existência de Zé Mané se transforma num Indiana Jones diante do Santo Graal, num Fox Mulder e numa Dana Scully num episódio de “Arquivo X”, num Moisés encarando a sarça em chamas.
As teorias da conspiração são a igreja do homem despossuído, frustrado, alienado, num mundo complexo que ele não compreende e no qual não prospera. São a arminha de mão dos pobres diabos. O Viagra da impotência social.
Quer dizer então que toda a comunidade científica, Harvard e Yale e Oxford e Cambridge e a Organização Mundial da Saúde e a União Europeia e os EUA (democratas e republicanos) e a Angela Merkel e o Bill Gates e os líderes e a imprensa de todos os países do globo estão errados sobre o coronavírus e só Bolsonaro tá certo?
O mundo inteiro caiu num conto do vigário chinês comunista para quebrar o capitalismo e só o capitão reformado do Vale do Ribeira, do alto de seus chinelos Rider, penando para ler “hospital Ualbert Uainstein” no teleprompter, descobriu a farsa?
O que para você, pessoa sensata de direita, de esquerda ou de centro, parece um absurdo completo é justamente o que dá força à teoria conspiratória. Quanto mais alucinante a teoria, maior seu poder epifânico. Quanto mais tosca a figura do presidente, mais longe chega a sua mensagem.
Tem um momento, geralmente no final do primeiro ato dos filmes de terror ou suspense, em que o protagonista tenta convencer os outros de que tem um fantasma na casa ou um monstro na floresta ou que o professor bondoso do jardim de infância é um serial killer. Todos desdenham do protagonista.
Talvez ele acabe num hospício, como Sarah Connor em “O Exterminador do Futuro 2”. A incredulidade geral, porém, faz com que o herói se insufle, cresça, tome uma atitude arriscada e sem volta para combater o fantasma/monstro/assassino e ingressar no segundo ato.
É exatamente no momento Sarah Connor no hospício que Jair Bolsonaro e seu núcleo duro de miolo mole se encontram nesta semana. E a atitude arriscada e sem volta que eles gostariam de tomar para ingressarem no segundo ato com um duplo plot twist carpado é dar um golpe.
Mandar ao STF “um jipe com um soldado e um cabo”. Amotinar as polícias e dar a elas, como disse o então candidato a presidente, “retaguarda jurídica para fazer valer a lei no lombo de vocês!”. “Será uma limpeza nunca vista na história do Brasil.”
Chegou a hora de as pessoas sãs deste país se unirem contra um golpe e contra a carnificina que a insistência deste sociopata em reduzir a quarentena irá causar. Somos nós, de Ronaldo Caiado a Marcelo Freixo, quem temos que gritar com toda a força dos nossos pulmões que há um fantasma na presidência. Um monstro no Planalto. Um serial killer no comando dos jardins de infância.
Depois, quando o pesadelo do vírus e do monstro passarem, cabe aos sobreviventes adultos de todos os matizes políticos repensar o mundo para que nele não haja um exército de excluídos frustrados, humilhados e dispostos a embarcar no primeiro filme de terror que lhes oferecer uma migalha de protagonismo.
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