Vamos lá (um fio). Pelo visto há 3 estratégias que os governos do mundo estão usando para lidar com a pandemia de coronavirus. Vou apelidá-las de: 1) "levar no queixo" (em homenagem ao Boris Johnson), 2) a "via chinesa" (fecha tudo), 3) "testar e conter". Qual será a do Brasil?
Testar e conter é a estratégia favorita dos países do sudeste asiático que experimentaram o surto de SARS há alguns anos atrás. Ela está base em identificar os casos individualmente, mapear a cadeia de transmissão, e isolar os focos sem muita disrupção econômica.
Serve bem para países pequenos, com Estados organizados e preparados, mas precisa ser posta em prática cedo. Tem os menores custos econômicos. Alguns países estão sendo bem sucedidos nessa via. Não é mais aplicável para Europa e Estados Unidos (e acho que também não pra nós).
A "via chinesa" envolve o uso de medidas drásticas e disruptivas para aumentar o distanciamento social. Quarentena de populações inteiras, interrupção de todas as atividades não-essenciais. Essas medidas se mostraram muito bem sucedidas em diminuir a velocidade do contágio.
Na maior parte dos países, o objetivo é achatar a curva de contágio para que não fique acima da capacidade do sistema de saúde, ou ir atrasando os casos até que se encontre uma vacina ou tratamentos mais efetivos. É uma abordagem cara e prolongada. Quanto mais efetiva, mais cara.
Se a maioria dos epidemiologistas parecem estar inclinados em preferir a 3, e depois passar pra 2 caso não funcione, uma quantidade notável de economistas é simpática a 1, "levar no queixo" (possivelmente Guedes está entre eles).
"Levar no queixo" significa simplesmente deixar a epidemia "mover no seu curso", até construir "imunidade de rebanho". Ou seja, cerca de 70% da população vai contrair, quem pegar pegou, que morrer morreu. E logo vai passar, não precisamos mudar nossas vidas.
Essa estratégia tem sido defendida abertamente pelo governo do Reino Unido, com menos entusiasmo pela Alemanha, e é talvez a estratégia implícita dos Estados Unidos.
O argumento público dos economistas: fazer a economia parar, causar uma recessão, geraria mais sofrimento do que deixar a epidemia seguir seu curso. Ou então que as medidas restritivas, de confinamento, na escala em que são necessárias, são impraticáveis em democracias ocidentais
(O argumento não-público, creio eu, é que a estratégia 2 fere excessivamente a taxa de lucros)
Como é frequentemente o caso com o raciocínio dos economistas, "levar no queixo" me parece um raciocínio cínico. A razão é que não achatar a curva de contágio implica necessariamente em aumentar a taxa de letalidade da doença.
Isso porque a letalidade está direitamente relacionada com a disponibilidade de tratamento intensivo. Se você decidir levar no queixo, certamente faltará leitos de UTI e respiradores. A consequência são mortes inteiramente evitáveis.
Mas eu suspeito que, no final das contas, essa estratégia vai se mostrar politicamente inviável, e se passará, atrapalhadamente e apressadamente, para alguma forma emergencial de "via chinesa" (ou as pessoas mesmo, em pânico, colocarão isso em prática).
Algo parecido pelo visto aconteceu na Itália: o governo inicialmente adotou uma postura relaxada ("é isso aí, é uma gripe, coisas da vida"), mas a pressão no sistema de saúde se mostrou tão brutal que as pessoas surtaram. O resultado foi, inevitavelmente, fecha tudo.
Para entender melhor de onde vem essas considerações, recomendo a leitura desse artigo (e seguir o @oatila )https://t.co/0ASnjZYy7u— Victor Marques (@victorxis) March 13, 2020
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