quarta-feira, 3 de junho de 2020

Chega de viralatice


Vinícius Carvalho

Se quiserem copiar aqui no Brasil as manifestações que estão ocorrendo nos EUA, vocês vão ficar de bigode mais uma vez e fortalecer a extrema-direita por aqui de novo.

Quando a classe-média com a sua moral "cosmopolita" imitando os trejeitos, as palavras, os métodos e a estética gringa saem às ruas, sempre dá merda. Dá merda porque soam ridículos, colonizados e causam risos e vergonha alheia com suas roupas, suas músicas e seus modos de falar, na população mais humilde.

As condições sociais são profundamente diferentes aqui e lá, e isso diz respeito a forma como o povo pensa e se comporta. As formas de vida, as cidades, as condições de moradia, idem. As raciais eu não quero nem começar a dissertar sobre, porque aí além de polêmico, eu não estou com a menor paciência de ter que pormenorizar cada detalhe de como foi o fim da nossa escravidão e como foi a deles e quais cicatrizes isso deixou em cada sociedade. Que são profundamente diferentes.

Os Estados Unidos continental (aquela área sem Alaska, Guam, Havaí e Porto Rico) possuem 328 milhões de habitantes espalhados num território pouco menor que o do Brasil, sendo que possuem apenas 9 cidades com mais de 1 milhão de habitantes, com administrações públicas descentralizadas

O Brasil possui 210 milhões tendo 14 cidades com mais de 1 milhão de habitantes.

Uma densidade demográfica muito mais alta, um país muito mais violento, o que tornam a vida em nossos bolsões populacionais um VERDADEIRO INFERNO para os mais pobres e a classe-média baixa.

A 2ª cidade mais populosa dos EUA, Los Angeles, tem a METADE da população da 2ª cidade mais populosa do Brasil, Rio de Janeiro. Isso se contar só a capital carioca, porque se colocar toda a região metropolitana, que é conurbada. Fudeu.

O que isso quer dizer? Que quebrar pontos de ônibus, parar transito em horário de rush É SIM BURRICE, e afetação de classe média e sindicalista que perdeu a capacidade de compreensão da população.

Essas pessoas moram mal, em lugares violentos, não ligam para ditadura porque já tem que bater continência para traficantes armados nas suas ruas, que por sinal não possuem calçamento e tem esgoto a céu aberto.

A única coisa que essas pessoas querem é chegar em casa em paz e ter uma proteção contra chuva em baixo do seu ponto de ônibus.

Pode parecer ridículo. Mas para um trabalhador isso é muita coisa. O militante de esquerda que perdeu a capacidade de analisar as condições materiais da população mais pobre, é um mimado de classe-média. Um falso radical imaturo. E apenas isto.

Eu quero que as vidraças dos bancos e lojas se fodam. Quero ver tocando fogo no parquinho. Mas Brasil não é EUA. A estética da violência aqui, numa população brutalizada, só é linguagem quando dialoga com o senso comum. Ou seja, é o morador de comunidade que vota no Witzel e no Bolsonaro por conta do discurso de violência contra aqueles que lhe assaltam nos pontos de ônibus.

Esse cidadão não concorda com que assaltem o seu patrão, se o Luciano Huck ou o dono do Itaú aparecerem na TV chorando porque foram roubados, essa galera vai se solidarizar com o banqueiro. Não porque são ruins, mas porque são dotados da moralidade do trabalho.

É o pobre que tem orgulho em ficar com o nome limpo no SERASA, de não dever ninguém e de repetir aquela velha máxima "eu ensinei meus filhos a andarem de cabeça erguida".

O Brasil não é um país de classe-média. O Brasil é um país lascado, fodido, moralista, com uma concentração populacional absurda, de terceiro mundo, pobre, desigual e mesmo bandidos aqui são ultrarreligiosos e operam em cima de uma moralidade cristã fortíssima - moralidade essa que está cada vez mais atrelada aos preceitos da teologia da prosperidade, ao Antigo Testamento e etc.

O brasileiro não ouve Kendrick Lamar e vocês não estão estrelando o "Laranja Mecânica". O brasileiro real mesmo, o de verdade, ouve Zé Neto e Cristiano, Aline Barros e Diante do Trono e assiste "Os 10 Mandamentos".

O que está acontecendo nos EUA é lindo. Mas eu espero profundamente que eles NÃO nos inspirem dessa vez. Que nós consigamos encontrar as soluções que a nossa realidade demanda.

Um inimigo comum é tudo o que o Bolsonaro quer e precisa. O momento é de ter estratégia e frieza.

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