quinta-feira, 18 de abril de 2019

Bolsonada é o pavio da explosão social



Ricardo Melo

É no mínimo perigoso subestimar a crise institucional aberta com as ações ditatoriais do Supremo Tribunal Federal. A sensação generalizada é a de que o Brasil não tem governo digno desse nome. 

A famiglia Bolsonada já provou, em atos e fatos, não ter condições de gerir uma quitanda, quanto mais uma das maiores economias do mundo. É uma sucessão de ordens e desordens.

Aumenta o diesel, abaixa o diesel, sobe de novo. Gasolina agora tem que ser comprada em doses, não em litros, tal o preço do combustível. A política externa é um roteiro de trevas vexatório sob o comando de um desmiolado. Nem fósseis ou garçons de restaurantes de Nova York querem em suas cercanias gente como Bolsonada, um homofóbico, racista, apologista de torturas, eliminação de pobres, complacente até com o holocausto. Se decidir ir aos EUA para receber afagos de lobbystas, é bom que leve sua marmita de pão com leite moça sob o risco de passar fome.

O estratégico ministério da Educação virou palco de rinha de galos. Chegou-se ao ponto de nomear um delegado de trânsito para cuidar do ENEM. O meio ambiente está entregue a um espertalhão acusado de falsificar mapas para favorecer achacadores. A política indígena visa exterminar povos e territórios em favor do capital abutre. O ministro do Turismo é um laranjal ambulante.

No Congresso, uma derrota atrás da outra. A bancada de extrema-direita do PSL, partido de Bolsonada, funciona como uma torre de Babel. A tal reforma da previdência afunda a olhos vistos. O “posto Ipiranga”, tchutchuca Paulo Guedes, colhe sucessivas derrotas. Virou um bobo da corte, embora não se importe muito com isso. Está com o cofre particular empanturrado graças a negociatas com fundos de pensão e outras tramoias.

Aí voltamos à área institucional. Sérgio Criminoso Moro baixou decreto para blindar a esplanada dos ministérios de protestos populares. O ex-juizeco nada fala de importante sobre os 20 mortos em prédios de celofane construídos por milicianos idolatrados pela famigilia Bolsonada ou o fuzilamento covarde de uma família com 80 tiros. Moro prefere brigar com a língua portuguesa em entrevistas tão patéticas quanto inúteis a investigar a fundo Fabrício Queiroz, braço direito da famiglia Bolsonada. Aliás, por onde ele anda?

Simultaneamente, assiste-se à reação ditatorial do Supremo diante de reportagens até inocentes envolvendo o nome do presidente do STF José Toffoli. Auto investidos no papel de delegados, promotores e julgadores, a dupla Toffoli/Moraes decidiu que o supreminho não pode ser criticado. Nem a inquisição reuniu tantos poderes.


Na origem do caos institucional está o golpe de 2016, quando uma quartelada midiática-executiva-militar-judiciária, financiada pelo grande capital, derrubou uma presidente legitimamente eleita e jogou a Constituição no lixo como um jornal do dia anterior. Na sequência, encarceraram o maior líder da história popular brasileira com base num processo reprovado mundialmente. O ovo desta serpente produziu Bolsonada.

Há mais, porém. O ministério público brasileiro está dominado em sua maioria por uma casta de coxinhas ineptos que “se acham”. Indigentes intelectuais. Pense bem: em que país civilizado gente como Dalanhol poderia ter algum protagonismo? Como um power point como aquele transmitido ao vivo em rede nacional poderia ser levado a sério?

Hoje vemos coisas ainda mais escandalosas. Toffoli, encharcado de brilhantina, nega ter havido ditadura militar e posa como devoto de igrejas evangélicas num país laico, como se estivesse diante de jesus pendurado num pé de goiaba citado por aquela ministra.

Pior: a reação a supostas fake news de meia dúzia de extremistas inexpressivos detona uma operação de guerra do STF. Pergunta: e a máquina de mentiras, comprovada em documentos nas reportagens irrefutáveis da jornalista Patrícia Campos Mello, esquema que caluniou Lula, Haddad e ajudou a eleger Bolsonada de modo fraudulento? Cadê o processo? Que medidas foram tomadas? Madame Raquel Dodge com a palavra. Mas só se ouve o silêncio neste caso.

O supreminho virou motivo de chacota. Com escassas exceções, é um clube de amigos interessado em defender a si próprio e seus privilégios, não a Constituição, o direito básico e interesses do povo brasileiro. Em vez de zelar pela liberdade de manifestação e expressão, dedica-se agora à censura e à atividade policial. Ninguém de bom senso e de convicções democráticas quer fechar o tribunal –tirando um rebotalho de aloprados--, mas sim restaurar pelas vias legais seu papel de Supremo com S maiúsculo, capaz de honrar a memória de personalidade como Evandro Lins e Silva, Paulo Brossard e tantos outros.

O objetivo maior dos poderosos de plantão é conhecido de todos: manter Lula na cadeia para impedir que a ira popular tenha um ponto de referência para lutar contra o desmonte do Brasil como país soberano. Não fosse assim, por que o engomado Toffoli, tão irritado e veloz contra uma citação verdadeira num processo, ressuscitou a censura e adiou para nunca o julgamento sobre prisões ilegais em segunda instância? Desde 2016, vale tudo para desviar a pauta do assunto que interessa.

O futuro é incerto. A verdade é que o Brasil está à deriva, sangrando com 40 milhões de desempregados de fato, milhões de famílias relançadas à miséria, economia no chão sem horizonte de melhora e sob o comando subserviente do imperialismo americano em crise. Uma explosão social é questão de tempo. Podem assinar embaixo e me cobrar depois.


Ricardo Melo é jornalista, presidiu a EBC e integra o Jornalistas pela Democracia

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