Leandro Fortes
CATATÔNICO
Com um ponto enfiado no ouvido, Jair Bolsonaro inaugurou a fase dos pronunciamentos teleguiados, tentativa derradeira de tentar controlar a enxurrada de sandices sibilantes que saem da boquinha disforme do presidente, quando esta está por conta e risco de seu detentor.
O recurso, inadequado sob qualquer argumento, teve um efeito colateral revelador: sintonizou a aparência facial de Bolsonaro ao vazio cerebral provocado pela ausência do habitual histrionismo com o qual ele costuma disfarçar seu monumental despreparo intelectual. À espera dos comandos de voz, o presidente assumiu uma atitude bovina, sonolenta, ruminando argumentos alheios que iam, aos poucos, escorrendo-lhes pelo canto da boca, desconexos.
Enquanto anunciava a demissão do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e a nomeação do substituto, Nelson Teich, Bolsonaro foi, aos poucos, sofrendo uma espécie de transmutação zumbi. A tradicional avalanche de impropérios, clichês machistas e imbecilidades anticientíficas foi substituída por uma narrativa estranhamente pausada, modorrenta, reveladora da existência de um emissor com grandes dificuldades para construir, no cérebro do presidente, uma linguagem minimamente estruturada.
A cada pulso de informação, Bolsonaro remexia os quadris por detrás do púlpito, como um metrônomo desregulado, preenchendo com reboladas irregulares os espaços de tempo impostos pelo emissor, além de suas orelhas.
Uma coisa, no entanto, não deixou dúvidas: a voz que chegava aos ouvidos de Bolsonaro era tão afeita a delírios e mentiras quanto à dele.
Nenhum comentário:
Postar um comentário