segunda-feira, 5 de outubro de 2020

Hannah Arendt e o Excepcionalistão

Teleologia

substantivo feminino FILOSOFIA

Qualquer doutrina que identifica a presença de metas, fins ou objetivos últimos guiando a natureza e a humanidade, considerando a finalidade como o princípio explicativo fundamental na organização e nas transformações de todos os seres da realidade; teleologismo, finalismo.

  • doutrina inerente ao aristotelismo e a seus desdobramentos, fundamentada na ideia de que tanto os múltiplos seres existentes, quanto o universo como um todo direcionam-se em última instância a uma finalidade que, por transcender a realidade material, é inalcançável de maneira plena ou permanente.
  • teoria característica do hegelianismo e seus epígonos, segundo a qual o processo histórico da humanidade — assim como o movimento de cada realidade particular — é explicável como um trajeto em direção a uma finalidade que, em última instância, é a realização plena e exequível do espírito humano.

Definições de Oxford Languages


 Omissões



No artigo publicado na Folha de SP defendendo Hannah Arendt, os autores dizem que nazismo e comunismo assumem uma "lei incontornável da história". É a velha crítica da teleologia. A insustentabilidade dessa crítica é bem fácil de mostrar. Apenas um exemplo. 

Toda história moderna do ocidente pode ser lida, também, a partir da expressão de uma filosofia da história teleológica, agressiva e colonialista. Primeiro, na versão religiosa, o futuro da humanidade era todos seguirem a palavra de Cristo e era missão dos europeus catequizar o mundo. O processo de colonização, extermínio dos povos originários, escravidão e a própria empresa colonial tem como justificativa essa ação humana que não era bem uma ação, apenas a materialização do devir do mundo já escrito na história por Deus. Teleologia pura e concentrada 

Com a consolidação do capitalismo, no século XIX, o discurso teleológico passou a ser o de exportar a civilização e a superioridade do homem branco. Lembram dos discursos sobre o "fardo civilizatório do homem branco"? Pois bem, milhões de humanos foram exterminados tendo como justificativa a ideia de que era preciso levar a civilização para todo mundo. Na prática, de novo, tratava-se de apenas cumprir a missão já inscrita na História de fazer triunfar a civilização no mundo todo. Podemos operar um breve salto histórico e chegar no séc. XXI. 

Hoje o discurso é levar a democracia, direitos humanos e liberdade para o mundo todo. Essa missão, também teleológica, pode e deve se realizar a partir de guerras, bombas, OTAN, invasões, golpes de estado. Matar milhares e milhões. Aliás, a ideologia oficial dos EUA é que o país é uma espécie de "povo eleito" por Deus, comportando uma particularidade civilizatória única, e que deve exercer mandato global e garantir a vitória da "liberdade e democracia" no mundo todo. Desde Henry Kissinger até Bush, o discurso religioso, atemporal, teleológico, agressivo e colonizante é parte da ideologia oficial dos EUA. E o que os EUA fazem é "apenas" assumir e radicalizar uma longa tradição ocidental.

Mas os autores do artigo, para sustentar a noção de totalitarismo, simplesmente não conseguem ver, omitem, que se é prova de totalitarismo uma teleologia da história agressiva, violenta, que não suporta dissidência e que busca eliminar aqueles que se opõe a realização da meta inscrita na História, teremos que dizer que o Ocidente é a PERSONIFICAÇÃO DO TOTALITARISMO. A sua máxima expressão. A sua realização. 

 
Vamos assumir essa perspectiva teórica? Imagino que não.

Na dúvida, leiam Discurso sobre o colonialismo de Aimé Césaire! 

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