Não sei se a Humanidade está ficando menos inteligente, ou se temos essa sensação apenas porque a estupidez agora é televisionada
Entre a classe política é fácil encontrar canalhas. Já os canalhas explícitos são relativamente raros. Canalha explícito é aquele cara de uma incompetência tão aperfeiçoada que nem sequer consegue disfarçar a maldade. Entre estes, se destaca uma sub-classe: o canalha explícito absoluto. O canalha explícito absoluto não só não consegue mentir, como acredita genuinamente que as suas ideias horríveis são ótimas. Assim, ao invés de as tentar esconder, esforça-se por divulgá-las. Basta lembrar Donald Trump encorajando os americanos a ingerirem lixívia, ou Jair Bolsonaro promovendo o livre comércio de armas de fogo.
Por estranho que pareça, ideias horríveis sempre encontram quem se identifique com elas. Em qualquer país do mundo, pelo menos dez por cento da população está disposta a defender projetos e ações indefensáveis. Quaisquer que sejam: pena de morte, segregação racial, pedofilia, canibalismo, Romero Britto ou até mesmo o bacalhau com natas.
Os canalhas explícitos absolutos conseguem por vezes alcançar o poder porque as pessoas normais não acreditam que eles acreditem no que afirmam acreditar: “Quando fulano defende o canibalismo não está a defender o canibalismo”, explicam, para justificar porque decidiram votar em fulano. “Fulano está apenas a afrontar o politicamente correto. Só diz isso para irritar os veganos. Votei nele porque adoro irritar os veganos.”
Desastrosa ingenuidade. Acontece que, ao elogiar o canibalismo, fulano estava mesmo defendendo o direito de pessoas comerem outras pessoas. Assim, mal alcança o poder, a primeira coisa que fulano faz é legalizar o canibalismo. A seguir, dentro da mais estrita legalidade, almoça os inimigos entre duas cervejas. Mais tarde, ao jantar, de terno e gravata, degusta educadamente as queridas pessoas normais.
As queridas pessoas normais estão fartas dos políticos de sempre. Querem sinceridade. Exigem dos políticos que digam a verdade. É como esperar que, num restaurante, questionando o proprietário sobre a qualidade do peixe, este nos alerte, muito sério, para as condições precárias em que o prato foi confeccionado, concluindo: “Eu jamais comeria aqui”. Imaginemos agora que o proprietário do restaurante seja um canalha explícito absoluto. Nesse caso, exaltará alegremente os defeitos do peixe. Ainda assim, haverá quem escolha o restaurante, fascinado com a rude franqueza do proprietário.
Canalhas explícitos absolutos sempre existiram. Não há nada de inédito na estupidez triunfante. A única novidade é que hoje, graças à internet e às redes sociais, é muito mais fácil propagar ideias idiotas. Vídeos bobos, por exemplo, são o quindim das redes sociais. A gente sabe que aquilo nos faz mal, mas fica difícil resistir. E, depois da primeira trinca, não há como não ir até ao fim. Sei do que falo: outro dia perdi uma hora assistindo a vídeos de gatos pulando de susto diante de pepinos. Eu e minha filha de três anos.
Não sei se a Humanidade está ficando menos inteligente, como asseguram diversos estudos, ou se temos essa sensação apenas porque a estupidez agora é televisionada.
E lá vou eu ver os vídeos dos gatos.
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