Minhas deficiências são colossais. Não uso celular. Nunca dirigi um carro. Nunca beijei a Jane Fonda
Leitores escreveram lamentando minha confissão ("Paixão pela titia", 28/3) de que nunca vi um filme com George Clooney e que, de modo geral, não me interesso pelo cinema feito de 1980 para cá. Também lamento, mas essa é uma cobrança que só se dá com o cinema. Se alguém disser que é indiferente à música pós-Debussy ou à pintura pós-Picasso, todos acharão natural. Mas não se aceita que um estudioso de Fritz Lang, Groucho Marx e Marcel Carné não tenha tempo para Quentin Tarantino —"Ah, mas tem um filme dele que você não pode perder...".
Sob risco de desapontar ainda mais os amigos, devo admitir que também nunca vi um filme com Johnny Depp, Brad Pitt ou Keanu Reeves. Só os conheço de nome e, se tiver de colá-los num álbum de figurinhas, não saberei dizer qual é qual. Aliás, nos anos 70, já tive esse problema com Dustin Hoffman, Al Pacino e Robert de Niro, que eu podia jurar serem o mesmo ator. Veja bem, não os estou desqualificando. Sei que são formidáveis. É que ainda não acabei de ver todos os filmes com Robert Montgomery, Robert Taylor e Robert Mitchum.
Minhas deficiências são colossais. Nunca tomei ácido, nem nos anos 70, quando isso era quase obrigatório. Nunca fui a Machu Picchu. Nunca li Carlos Castañeda. E nunca aderi à comida natural —bolinho de bardana, trouxinha de repolho com molho de melancia e faufilhas com breufas. E sei que é imperdoável, mas nunca fui fã de Bob Dylan e Joan Baez. Preferia Orlan Divo e Doris Monteiro.
Não só nunca tive celular como me atrapalho quando alguém me passa um deles e me diz para falar —eles desligam automaticamente na minha mão. Nunca assisti a um capítulo de novela, a uma corrida de baratinha ou a um episódio do BBB. Não tenho Facebook nem Instagram. Nunca dirigi um carro. Aliás, também nunca dirigi um avião. Nunca beijei a Jane Fonda.
Sou um caso perdido e só posso pedir perdão.
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