quarta-feira, 14 de novembro de 2018

A realidade paralela do filho do Anticristo


A realidade paralela de Eduardo Bolsonaro e o delírio fascista das massas

por Wilton Moreira

A entrevista de Eduardo Bolsonaro ao Estado de São Paulo mostra que ele possui (à semelhança do pai) um traço de personalidade essencial para desencadear o fenômeno fascista: a construção paranoica de uma realidade paralela, na qual os demônios inimigos das pessoas de bem maquinam maldades para corromper o mundo e torná-lo um inferno.

Estes inimigos seriam os professores e intelectuais comunistas, os terroristas do MST e MTST e os libertinos e libertinas do ativismo LGBT e feminista. Aliás, parece que pela lógica delirante de Eduardo Bolsonaro, todos poderiam ser chamados de comunistas. E por essa mesma lógica, esta palavra mágica, comunismo, parece abarcar qualquer ideia ou ação política que classificaríamos de progressista no plano social ou liberal no plano comportamental.

Para Eduardo Bolsonaro (e também para o pai), qualquer liberalismo dos costumes ou progressismo social é comunismo. E os comunistas que defendem ou praticam tais ideias devem ser criminalizados e caçados, como na Indonésia, Ucrânia e Polônia, exemplos de democracia, segundo ele.

Seguindo a”filosofia” de Olavo de Carvalho, nos delírios de Eduardo Bolsonaro há uma hegemonia do marxismo cultural nos meios acadêmicos brasileiros, que é replicado por professores no ensino básico, doutrinando crianças e adolescentes na viadagem, no ateísmo e no comunismo. Ele não diz, mas ao se referir a teoria da hegemonia de Gramsci, sugere que essa conspiração marxista é planejada a partir de alguma entidade oculta (talvez um grupo articulado de intelectuais, artistas e políticos nacionais e estrangeiros) tão maligna quanto inteligente. A semelhança com o antissemitismo paranoico da Alemanha de 30, que demonizava e desumanizava os Judeus, não é mera coincidência.

Há outras características fascistas na personalidade de Eduardo e Jair Bolsonaro, compartilhada por seus atuais companheiros políticos, sejam os sacerdotes pentecostais e os militares amantes dos porões, sejam novos bolsonaristas da hora, como Paulo Guedes e Sérgio Moro. Todos eles se caracterizam pela limitação intelectual, fanatismo, ressentimento e o gosto pela violência e a prática da maldade pura e simples.

Mas o gatilho para desencadear o fascismo é a potencialização destas características psíquicas num surto delirante coletivo, em que a massa compartilha com os líderes não apenas tais padrões comportamentais, mas também a crença numa realidade paralela cuja característica principal é a construção de bodes expiatórios aos quais devem ser atribuídos os males do país e sobre os quais devem recair a ira do estado fascista, representante das pessoas de bem.

Na Alemanha de 30, os bodes expiatórios foram os Judeus, secundados pelos comunistas e homossexuais. No Brasil atual os corruptores do mundo parecem ser esta categoria ampla e multiforme nomeada pelos bolsonaristas de comunistas/petistas, secundados pelos LGBTs e feministas.

Ao contrário de políticos pilantras como Temer, Aécio e mesmo Trump, Jair e Eduardo Bolsonaro acreditam de fato numa conspiração marxista, que corrompe a moral o os bons costumes, e é isto que os tornam muito mais perigosos que os pilantras. O líder acreditar no que prega é fundamental para se construir o elo delirante com o povo, pois se trata de uma comunicação inconsciente que só funciona se estiver assentada em crenças comuns.

As manipulações e “fake news” são fartos em todos fascismos, mas são fenômenos de superfície, cujo objetivo é muito mais despertar ressentimentos e ódios latentes e mantê-los à tona na consciência das massas, do que criá-los maquiavelicamente. As mentiras fascistas são muito mais “mentiras para si mesmo” (inclusive para os próprios líderes) do que manipulações engendradas por picaretas incrédulos e calculistas. Por isso são muito mais poderosas, pois fazem parte da lógica delirante compartilhada entre líderes e liderados.

Os pastores e fieis pentecostais, por exemplo, acreditam mesmo que no comunismo do PT e da disposição do partido em patrocinar o doutrinamento escolar de seus filhos no ateísmo marxista, na vagabundagem dos movimentos sociais e na pouca vergonha da viadagem, levando o Brasil a uma venezuelização. Pouco adianta argumentar que em treze anos de governos petistas não há evidências empíricas de que o país caminhou ou preparou o caminho para se tornar uma república bolivariana. Argumentos racionais e fatos não funcionam contra uma lógica delirante.

Aliás, os evangélicos pentecostais vivem há décadas num quase delírio coletivo de características fascistóides, que tende a demonizar os progressistas (comunistas), a comunidade LGBT e as feministas e mulheres liberadas. A sua aliança com Bolsonaro não é fortuita e eles formam, junto com a classe média alta tradicional, a massa social de base para o fascismo.

Podemos dizer que essas massas de tendências fascistas (pentecostais e classes médias) estão numa espécie de pré-surto fascista, que é aquela fase delicadíssima em que ainda resta um fio de ligação com a realidade. Jair e Eduardo Bolsonaro, que já se encontram há muito tempo em delírio fascista, tendem a puxá-las para o surto, assim como o Moro justiceiro e o Paulo Guedes apóstolo neoliberal, ambos megalomaníacos sem limites éticos.

A questão é saber se haverá forças na economia psíquica do país (o fascismo é uma disfunção política, mas também uma patologia psíquica de massas) para barrar o surto fascista. Os que não votaram em Bolsonaro, alguns setores esclarecidos da elite das forças armadas (que têm o poder dissuativo da força) e o que resta de sanidade nas enfraquecidas instituições nacionais, notadamente o STF, o Congresso Nacional e o Ministério Público, terão discernimento e força para frear o surto fascista que está a caminho?

Torçamos para que os sãos tenham clareza da gravidade da situação e força suficiente para deter o fascismo enquanto ele ainda não se instalou como surto agudo das massas. Pois se o pré-surto fascista em que se encontram as classes médias e os pentecostais se aprofundar em surto agudo e ainda contagiar outros extratos populacionais, como costuma acontecer em situações de delírio de massa, a única maneira de deter a insanidade fascista será por meio da violência, mas aí eles já teriam provocado muito estrago. E o necessário uso da violência contra a barbárie fascista teria a um custo muito alto em termos de vidas humanas e dilaceração do tecido social.

Blog de Wilton Cardoso Moreira

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