quinta-feira, 8 de novembro de 2018

Os ventos sopram na direção de boas mudanças nos EUA


João Alexandre Viégas

O resultado das eleições de ontem nos Estados Unidos representa o início do refluxo da onda conservadora iniciada pela eleição de Donald Trump em 2016.

O Partido Democrata na Câmara elegeu 222 deputados, 27 deputados a mais do que tinha na última legislatura (os republicanos perderam 27 deputados), deixando o presidente americano sem condições de aprovar sua agenda no Congresso na segunda metade de seu mandato.

Mas a eleição foi muito mais do que simplesmente a retomada do controle da Câmara. Os democratas venceram em estados que tinham sido decisivos para a vitória de Trump em 2016, como a Pensilvânia, Michigan e Wisconsin.

A Pensilvânia, por exemplo, um tradicional polo siderúrgico, tinha sua economia deprimida pela perda de competitividade face ao aço importado. Na campanha, Trump prometeu enfrentar a competição estrangeira e está tentando, renegociando o Nafta, elevando tarifas, impondo cotas, mas sem obter sucesso em recuperar a economia do estado para a situação de antes da globalização.

O mesmo acontece com Michigan, onde Detroit encolheu e continua com bairros inteiros vazios pela retração da participação da indústria automobilística americana em seu próprio mercado, tomado por carros japoneses, coreanos e de outros países.

O resultado é que o eleitorado escolheu senadores e governadores democratas nesses três estados.

Durante a campanha o presidente americano chamava as propostas dos democratas de ampliar a rede de bem-estar social de socialismo. Não adiantou. A mais jovem deputada eleita Alexandria Ocasio-Cortez, com 29 anos, de Nova York, por exemplo, fez campanha sem financiamento de empresas e obteve 78% dos votos do Queens e do Bronx, defendendo a implantação de um sistema de saúde público e universal, como o SUS.

O mesmo fez o governador eleito do Colorado, Jared Polis, também do Partido Democrata centrando sua campanha na defesa de um sistema de saúde público e universal, energia renovável e educação infantil pública.

Polis se tornou o primeiro homem abertamente gay a ser eleito governador nos Estados Unidos. Ele tem um parceiro de longa data e dois filhos e durante a campanha não escondeu sua orientação sexual, o que indica uma mudança de mentalidade no Colorado, onde até então predominava uma visão conservadora em relação à comunidade LGBT.

Outro sinal de que a eleição foi a vitória da diversidade foi a eleição de duas deputadas federais de origem indígena. Uma delas, Sharice Davis, também é a primeira deputada lésbica eleita pelo estado do Kansas.

Além disso duas deputadas muçulmanas foram eleitas. Uma delas, Ihan Olmar nasceu na Somália e chegou aos Estados Unidos como refugiada e é naturalizada americana. Venceu com 78,2% de seu distrito em Minnesota.

Os democratas obtiveram 7 governadores a mais do que tinham e os republicanos perderam 6 e os democratas venceram nos estados com as maiores e mais dinâmicas economias do país: Califórnia e Nova York.

Outro fato positivo foi que as mulheres aumentaram sua participação na Câmara de 84 para 95 deputadas, o maior número registrado até agora.

No Senado os republicanos mantiveram o controle, mas chama a atenção como muitas de suas vitórias foram por margens muito estreitas. O senador republicano Ted Cruz do Texas foi reeleito com 50,9%, uma margem de apenas 2,6% em relação ao seu jovem oponente democrata. Na Florida, o candidato republicano vencia com apenas 0,4% de diferença.

Um fator decisivo para esse resultado foi o alto comparecimento. Ao contrário da alta abstenção de 2016, os eleitores quiseram sair de casa para manifestar sua opinião sobre a conduta e a agenda da administração republicana.

Aqui, por razões óbvias, os jornais estão diminuindo ou até mesmo escondendo a dimensão da vitória democrata. Afinal foi a vitória das ideias do estado do bem-estar social contra o “cada um por si”, a vitória da diversidade contra o racismo, a misoginia e a intolerância contra os homossexuais.

No entanto, assim como a vitória em 2016 jogou água no moinho de outras vitórias conservadoras em países como a Itália e também nestes tristes trópicos, a vitória de ontem da diversidade, da inclusão social, do pluralismo, da tolerância, também irá espalhar seus efeitos aos quatro ventos.

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