sexta-feira, 15 de novembro de 2019

A matança no Rio continua presa entre a propaganda e a politicagem


Bruno Boghossian

Witzel bate mais um recorde de insensibilidade ao falar de violência
Governador faz propaganda turística em semana com mais uma morte de criança no Rio
Wilson Witzel foi a Lisboa e não gostou do que viu na TV. De volta ao Rio, o governador reclamou de uma emissora portuguesa que mostrou um tiroteio numa favela. "Não é a realidade do Rio. É a realidade, infelizmente, de algumas comunidades, mas isso não afeta a vinda do turista", disse, na terça (12).

A não ser que esteja pensando em transformar o Palácio Guanabara numa agência de viagens, Witzel deveria evitar o tom de propaganda na hora de falar sobre a violência no Rio. Na semana em que mais uma criança foi morta por bala perdida no estado, o governador bateu um novo recorde de insensibilidade.

O contraste entre áreas turísticas e bairros pobres não deveria ser motivo de celebração. No Brasil, a taxa de homicídios de pretos e pardos é quase três vezes maior do que o índice para a população branca. Segundo o IBGE, a distância entre os dois grupos cresceu nos últimos anos.

Witzel ignorou a desigualdade brutal embutida nesses dados. "Nas áreas turísticas, o índice de criminalidade violenta é praticamente zero", afirmou, ao anunciar um investimento de R$ 20 milhões para promover a imagem do Rio.

O governador voltou ao assunto dois dias depois. Em visita a Duque de Caixas, um dos municípios mais violentos do estado, elogiou a segurança na capital e acrescentou: "Estamos no mesmo patamar de Nova York, de Paris, de Madri. Essa é a realidade que precisa ser mostrada".

Nem o marqueteiro mais criativo conseguiria emplacar essa distorção. No ano passado, o índice de homicídios em Nova York foi de 3,4 por 100 mil habitantes. No Rio, essa taxa foi de 19,9 --sem contar as mortes em ações policiais.

Quando Kethellen Gomes, de 5 anos, morreu com um tiro disparado por um miliciano, na terça, Witzel acusou o governo Bolsonaro de ser leniente no patrulhamento das fronteiras. O ministro Sergio Moro disse que o governador tenta "transferir a responsabilidade" pelo problema. E a matança no Rio continua presa entre a propaganda e a politicagem.

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