segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

Como o pagodeiro Ferrugem explica o Brasil


Vinícius Carvalho

Pra início de conversa o Ferrugem hoje faz um pagode que mistura gospel, amiguícia, milícia, Deus, Barra da Tijuca, Pizza Parmê e sodomia. Por isso ele é tão importante para o Brasil.

Se o Ferrugem fosse uma alegoria perfeita de Brasil ele seria um barraco na favela do papel cagado em Caxias com uma piscina olímpica no quintal. É tipo quando um cara é mais feio que um cruzamento entre animais como Véio da Havan fazendo sexo com a Janaína Paschoal mas que tem o olho azul.

Mas antes de adentrar isso preciso falar sobre outra coisa, porque eu já sei que virão aqui perguntar "Quem é Ferrugem"?

Tem uma esquerda que é engraçada. A que quer ser mais civilité e mais culta que todo mundo, um blasé forçado demais. Só que fica algo meio arrogante, meio tosco, meio engraçado, aí começam a passar vergonha sem saber.

Tipo quando eu posto algo que fala sobre algum tema popularesco, tu fala sobre, sei lá, o SALGADINHO DO KATINGUELÊ, ou cantarola alguma música do ART POPULAR do gênio da raça LEANDRO LEHART, eles chegam e perguntam "ummm noffaa, quem é esse?", "não conheço", "nunca ouvi falar".

Joga no Google, ora porra. No Google tem tudo, é o novo pai dos burros. Mas não, na verdade a pessoa PRECISA comentar que não conhece, porque, as You know, eles são franceses demais, parisienses demais, intelectuais demais, eles peidam cheiroso zentchy, eles não cagam, eles lançam trufas da Kopenhagen e bonb-bons serenatas de amor nas suas privadas com cheiro de talco do Himalaia.

"Sou socialista, mas meu sonho é ser da elite de Luxemburgo"

Na casa deles, eles só cozinham ao som de arias ou da NONA DE BEETHOVEN, sendo que como eu aprendi italiano assistindo O Rei do Gado e Terra Nostra, ninguém me tira da cabeça até hoje que Nona de Beethoven foi uma música que o compositor alemão fez para alguma velha italiana, sua avó, se pá, a Nona. (Mentira, kkk eu nem via Globo, mas sabia o que era pq só se comentava isso na época, eu não vou fingir que não sei pra dar uma de gostoso, de Althusser dos trópicos).

Isto posto, eu estava ouvindo aquela merda rala chamada Ferrugem há pouco. Sim, correndo o risco de contrair tétano nos meus tímpanos eu fiz este sacrifício, porque se eu quero criticar o popularesco eu preciso conhecê-lo.

Não tem como você fazer a leitura política de um momento sem entender o que o povo gosta, ouve, lê, assiste. Mesmo que seja um câncer ou uma cãibra nas bolas ou um prurido anal.

Eu estava ouvindo uma música do Ferrugem chamado "o som do tambor", e nada mais explica o Brasil atual do que isso.

O cara na música basicamente diz que é abençoado por "papai do céu", que o protege e o guarda, e que ele vai sair com os amigos dirigindo bêbado, mas sem problema nenhum, afinal, papai do céu protege todos os seus amigos, jiu-jiteiros, parças do Neymar e amiguícias da Barra da Tijuca. Os cheiradores evanjegues que devem frequentar a Bola de Neve Church ou alguma Vineyard aí qualquer.

E o Ferrugem explica muito o tempo atual porque vivemos um fenômeno de helenização cultural, não existe cultura estática e livre de influências do entorno. Algumas coisas são apenas ressignificadas.

É claro com o sol que, assim como a polenta não é italiana, e que o churrasco gaúcho na verdade é indígena, e que jacaré no seco anda, que a forte influência da teoria da prosperidade e dos evangélicos na sociedade carioca, está deixando as músicas populares repletos de símbolos neopentecostais, mesmo que coadunados com álcool, putaria e corrupção.

Já existe os bandidos de Jesus, em breve teremos os puteiros de Jesus, o tráfico de órgãos de Jesus, o tráfico de crianças de Jesus, a pedofilia de Jesus e etc. Tudo isso ao som do tambor.

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