A pandemia não poderá ser debelada se ele continuar à frente do Estado
O Brasil tem um problema: tirar Bolsonaro do Planalto. Eis a proposição.
“Um problema” é licença poética. O país tem dúzias de encrencas. Que existem há séculos ou surgiram ontem. De abacaxis indescascáveis a questiúnculas. Exemplo de um probleminha: não se diz destituição, mas impeachment.
Embora a palavra inglesa não figure na Constituição, a casta política não vive sem ela, mesmo se dizendo constitucionalista. O trejeito idiomático, signo do complexo de vira-lata, não é um problema urgente.
O problemaço é destituir Bolsonaro, impichá-lo. Porque ele virou um empecilho à solução de todo e qualquer problema nacional. A peste não poderá ser debelada se continuar à frente do Estado —e isso não é profecia, é constatação empírica.
Ele sempre desdenhou o corona. Disse que a China provocou a gripezinha. É contra máscaras e confinamento. Oferece cloroquina a avestruzes. Aglomera. Lotou o Ministério da Saúde de milicos. Despreza vacinas. Promoveu a mortandade em Manaus.
A perspectiva é que as coisas piorem. Novas variantes do vírus se alastram. Faltam insumos, oxigênio, UTIs. Fura-se a fila da vacinação. Um confinamento mais doloroso parece inevitável.
Há quem ache que o risco de perder apoio fará com que Bolsonaro saia do negacionismo. Dá-se como exemplo sua louca cavalgada atrás de vacinas nos últimos dias. De fato, não lhe falta cara de pau para fingir e enganar. Para dizer simultaneamente uma coisa e seu contrário. É seu método de governo.
Com a peste, tal método o fez errar na mosca —sempre. Admita-se que demita o ministro da Saúde, energúmeno que só lhe segue as ordens. Convidará um Drauzio Varella para o cargo? Óbvio que não. E essa é outra constatação empírica.
Dado seu prontuário, chamará um sabujo, um incompetente, um carreirista para o cargo. Foram esses os requisitos inegociáveis que usou na montagem do ministério. Não há nele ninguém que preste. São pessoas que, sem luz própria, medram na treva fétida do pântano.
Eis a segunda proposição: o centrão é o pântano.
Esquerda e direita são categorias surgidas na Revolução Francesa. Os conservadores sentavam-se à direita na Assembleia Constituinte e os revolucionários, à esquerda. A maioria dos deputados não era nem uma coisa nem outra. Pertenciam ao pântano, ou planície, como também se dizia.
O pântano oscilava entre direita e esquerda conforme a pressão popular. Mas seus traços definidores eram outros: a ausência de princípios, o oportunismo e, sobretudo, a venalidade. Igualzinho o centrão.
Com a diferença que o centrão não é de centro. É de direita sempre, doa a quem doer. Desde o fim da ditadura ele é maioria no Congresso. Foram do pântano Sarney, Collor, Temer e, como pinto no lixo, Bolsonaro.
Veio a pororoca de crises. A pandemia roncou, o desemprego explodiu, os filhos se emporcalharam e o auxílio emergencial foi para o beleléu. Bolsonaro voltou ao aconchego do velho pântano. Foi recebido de braços abertos, o que era esperado.
O que não se esperava é que a oposição não se opusesse. O PT primeiro aprovou o plagiador que Bolsonaro indicou para o Supremo. E agora, como o PSOL, disse que votará em Baleia Rossi para presidir a Câmara. Este garantiu em alto e bom som: nem pensar em impeachment.
As duas proposições levam a uma terceira: o problema Bolsonaro existe e persiste porque o centrão assim quer.
Sua destituição é uma quimera? Não. Tanto que setores da direita —Novo, MBL, Vem pra Rua— passaram a propugná-la. Ouviram tambores, perceberam que, como se diz nos filmes de Tarzan, “os nativos estão inquietos”.
A queda de Bolsonaro não será uma missa negra no Congresso, com beijinhos à tia Maricota nos cafundós da Paraíba. Será um árduo embate de forças.
O presidente conta com a força bruta propriamente dita: generais com e sem pijama, milícias e meliantes, polícias e porra-loucas. Aumentou-lhes o soldo e os armou até os dentes.
Do outro lado estará a força da política militante, a auto-organização popular e da sociedade civil. Nos locais de trabalho, nos bairros, nas escolas —em praça pública.
No meio do bangue-bangue estará o pântano. Ele não é imóvel. Dá para ouvir um rato sussurrando para um réptil: “Parece que esse negócio de impeachment está dando um dinheirão”.
Mas o presidente não deixará o Planalto como Collor ou Dilma. Terá de ser tirado. Sua queda estará mais para derrubada que para impeachment. Só sairá se houver revolta. Se continuar, continuará o bololô. Até que tente o golpe.
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