Comentário de Dallagnol em diálogos liberados pelo STF envolve um fato grave, que precisa ser esclarecido, escreve Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia
Talvez a mais chocante revelação da Operação Spoofing seja uma frase de Deltan Dallagnol, o chefe da Força Tarefa. No momento em que a Justiça decreta a prisão de Lula, Dallagnol afirma: "Presente da CIA".
Mesmo involuntariamente, Dallagnol abriu caminho para o que pode ser uma das mais esclarecedoras -- e chocantes -- informações sobre um lance decisivo em nosso retrocesso político atual.
Em abril de 2018, a prisão de Lula representou um marco divisório numa campanha eleitoral encerrada com uma cena impensável poucos meses antes: a vitória de Jair Bolsonaro, aliado assumido da Lava Jato, e a posse de seu carcereiro, Sérgio Moro, no Ministério da Justiça.
O fato decisivo na definição do pleito, sabemos todos, foi a prisão de Lula, que retirou o candidato do PT de uma campanha onde despontava como favorito.
Meses depois, quando o STF foi julgar um pedido de habeas corpus de Lula, que cobrava sua soltura com base na exigência constitucional do trânsito em jugado para o cumprimento de sentença condenatória, o debate sobre seus direitos havia mudado de natureza.
Impedir a presença de Lula na campanha tornara-se uma questão de Estado, o que explica a sugestão de intervenção militar apontada num tuíte onde o comandante Villas Boas ameaçava o STF.
Basta recordar o histórico de interferência da principal agencia norte-americana de inteligência em assuntos internos do Brasil e da América Latina para entender que afirmação de Dallagnol faz parte de um contexto maior.
Foi assim no golpe de 1973 que derrubou Allende, no Chile, e também em 1964, no Brasil. A CIA participou do combate, prisão e captura de Che Guevara na Bolívia, embora a decisão final de executar o prisioneiro já dominado tenha sido assumida por um oficial boliviano, conforme entrevista ao El País.
A história da Lava Jato inclui cursos e treinamentos promovidos pelo Departamento de Justiça (DoJ). Em 2015, quando a Operação encontrava-se em seu início, o Ministério Publico Federal recebeu, em Curitiba, a visita de 17 cidadãos norte-americanos, ligados ao DoJ e ao FBI, evento que deu início a uma série de atividade comuns, no Brasil e nos Estados Unidos (Conjur, 1/07/2020).
Em visita oficial aos Estados Unidos, Jair Bolsonaro fez questão de visitar o QG da CIA, na Virgínia, um passeio incomum para presidentes,
Nesse contexto, o "presente da CIA" representa um passo a mais numa promiscuidade indesejável e perigosa -- e que por isso mesmo deve ser esclarecido.
Alguma dúvida?
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