VEJA
Ao pedir à Justiça a quebra do sigilo bancário e fiscal de 95 pessoas e empresas relacionadas ao senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), o Ministério Público do Rio de Janeiro apontou indícios de que o parlamentar tenha utilizado a compra e venda de imóveis para lavar dinheiro. Segundo os promotores, entre 2010 e 2017, o então deputado estadual lucrou 3,089 milhões de reais em transações imobiliárias em que há “suspeitas de subfaturamento nas compras e superfaturamento nas vendas”. No período, ele investiu 9,425 milhões de reais na compra de 19 imóveis, entre salas e apartamentos.
No documento sigiloso, obtido por VEJA, o MP afirma que a suposta fraude pode ter ocorrido para “simular ganhos de capital fictícios” que encobririam “o enriquecimento ilícito decorrente dos desvios de recursos” da Assembleia Legislativa do Rio. A quebra de sigilo foi concedida pelo juiz da 27º Vara Criminal do Rio, Flávio Itabaiana Nicolau.
Os promotores citam no documento casos em que teria havido uma valorização excessiva de imóveis comprados por Flávio. Em 27 de novembro de 2012, ele comprou, por 140 mil reais, um apartamento na Avenida Prado Junior, em Copacabana – 15 meses depois, em fevereiro de 2014, vendeu o imóvel por 550 mil reais, o que representa um lucro de 292%. O MP aponta que, de acordo com o índice Fipezap, utilizado no mercado imobiliário, a valorização de imóveis no bairro ficou, no período, em 11%.
Também em novembro de 2012, Flávio comprou, por 170 mil reais, um apartamento na Rua Barata Ribeiro, também em Copacabana, que, um ano depois, seria vendido por 573 mil reais, lucro de 237%. No período, o índice de valorização ficou em 9%. Na medida cautelar, os promotores apontam que os valores declarados para a compra foram inferiores aos do mercado; e, os da venda, superiores. Citam também que os dois imóveis foram intermediados por um americano, Glenn Howard Dillard. Proprietário do apartamento na Prado Junior, o também americano Charles Eldering, acusou Dillard de não ter lhe repassado o valor da venda.
O MP também levantou dúvidas sobre os negócios relacionados à compra e venda, por Flávio, de apartamento em Laranjeiras. Apontam valorização excessiva do imóvel em apenas oito meses e questionam também a afirmação do senador de que parte da negociação teria sido feita em dinheiro vivo – o que explicaria os depósitos parcelados, em espécie, que fez em sua conta corrente e que somavam 96 mil reais.
Também em relação aos negócios imobiliários do filho do presidente da República, o MP frisa que, entre dezembro de 2008 e setembro de 2010, Flávio adquiriu dez salas comerciais na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio, por 2,662 milhões de reais. Em outubro de 2010, todos os imóveis foram vendidos para a empresa MCA Exportação e Participações por 3,167 milhões de reais. Os promotores ressaltam que o comprador tem, entre os sócios, a Listel S.A., sediada no Panamá, um paraíso fiscal. Os autores do documento citam que o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) considera como “sérios indícios” de lavagem de dinheiro, “a realização de operações imobiliárias envolvendo pessoas jurídicas cujos sócios mantenham domicílio em países com tributação favorecida”. Todas as pessoas físicas e jurídicas envolvidas em transações imobiliárias de Flávio tiveram seu sigilo quebrado pela Justiça.
Na ação, o MP afirma ter encontrado elementos que indicam a prática, no gabinete do então deputado, dos crimes de peculato (apropriação, por funcionário público de bens alheios), lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Procurado por VEJA, o senador reenviou, por meio de sua assessoria de imprensa, a nota que divulgara quando houve a notícia de quebra de seu sigilo bancário. Ele acusou o MP de ter quebrado seu sigilo antes mesmo da autorização judicial. “Somente agora, em maio de 2019 – quase um ano e meio depois – tentam uma manobra para esquentar informações ilícitas, que já possuem há vários meses”, disse. No texto, ele afirmou que nada fez de errado e que não conseguirão usá-lo “para atingir o governo de Jair Bolsonaro”.
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