Bernardo Mello Franco
Na fronteira com o Paraguai, pistoleiros mataram um repórter que investigava o crime organizado. Em Brasília e na Bahia, outros episódios de agressão à imprensa
A fuga de 76 presos, a maioria ligada ao PCC, acirrou a tensão na fronteira seca do Brasil com o Paraguai. Os bandidos estavam presos em Pedro Juan Caballero, cidade colada a Ponta Porã (MS). Escaparam no mês passado, com a aparente conivência de guardas e da direção da cadeia.
A região é dominada pelo narcotráfico e registra altos índices de violência armada. Em dezembro, o Ministério Público Federal tomou uma medida drástica para se proteger. Abandonou a sede em Ponta Porã e transferiu os servidores para Dourados, a 120 quilômetros de distância.
Num faroeste em que nem procuradores estão seguros, o jornalismo virou atividade de alto risco. Na noite de quinta-feira, o repórter Léo Veras foi executado quando jantava com a família no lado paraguaio da fronteira. Ele tocava o site Porã News, que investigava a infiltração do crime organizado no poder local.
Veras foi entrevistado no documentário “Quem Matou? Quem Mandou Matar?”, de Bob Fernandes e João Wainer. Disponível no YouTube, o filme conta as histórias de seis jornalistas assassinados no interior do país. Eles foram mortos após denunciar políticos corruptos e policiais que integravam grupos de extermínio.
A semana foi marcada por outros episódios de ataque ao jornalismo. Em Brasília, uma testemunha da CPI das Fake News, instalada para apurar a atuação de milícias virtuais, mentiu e insultou a repórter Patricia Campos Mello.
Ex-funcionário de uma agência de marketing digital, Hans River do Rio Nascimento alegou que teria sido assediado pela profissional da “Folha de S.Paulo”. Ele forneceu informações para reportagens sobre os disparos em massa que alavancaram a campanha de Jair Bolsonaro.
A jornalista rebateu as mentiras com documentos, mas não conseguiu escapar do bombardeio na internet. O deputado Eduardo Bolsonaro atiçou a tropa ao difundir ofensas de cunho sexista contra a repórter. No ano passado, ele sugeriu a edição de um “novo AI-5”. O original, baixado pela ditadura militar, instituiu a censura prévia à imprensa.
Na sexta-feira, a PM da Bahia deteve dois jornalistas da revista “Veja”. Os profissionais se identificaram, mas foram conduzidos à delegacia e submetidos a interrogatório. Eles apuravam as circunstâncias da morte do miliciano Adriano da Nóbrega, ligado ao senador Flávio Bolsonaro.
Com ataques constantes, a extrema direita no poder fomenta o clima de violência e intimidação ao jornalismo. O caso de Léo Veras mostra que as ameaças às vezes têm consequências. No documentário filmado há três anos, ele disse: “Sempre peço que não seja tão violenta a minha morte. Espero que seja só um disparo, para não estragar a pele”. O repórter foi executado com 12 tiros.
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“Eu não conheço a milícia no Rio de Janeiro. Desconheço. Não existe nenhuma ligação minha com a milícia do Rio de Janeiro”. Palavras de Jair Bolsonaro, que já defendeu a atuação dos grupos paramilitares em discurso e entrevistas.
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