Janio de Freitas
Em visita a Trump, Bolsonaro entregou mais do que levou e nada trouxe
É fácil imaginar o que no Brasil sucederia a Lula, Dilma, Sarney ou Itamar se um deles fizesse uma pequena parte das entregas, em troca de absolutamente nada, de Jair Bolsonaro a Trump. Nem é preciso considerar, na comparação hipotética, o espetáculo de subserviência e bajulação —palavras da imprensa americana— dado em nome do Brasil. A comitiva brasileira, sem exceção para os generais, em momento algum se lembrou, um mínimo que fosse, de que representava um país cuja degradação ainda não arruinou a sua dignidade internacional —a última reserva.
Além das concessões substanciais, como importar trigo americano em desrespeito ao acordo que nos traz o trigo argentino, e de comprometimentos no jogo dos organismos internacionais, Bolsonaro e Paulo Guedes renegaram as muitas vantagens da filiação brasileira à OMC, Organização Mundial do Comércio. Como presente de consolação, o governo Trump promete (sem dar garantia) apoiar a entrada do Brasil na OCDE, Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Da qual já se recebe a colaboração mais útil.
Simbólica das promessas que enrolaram as concessões brasileiras, ficará para a crônica histórico-anedótica. É a promessa de que Trump "se esforçará" para ver, por desejo seu, o Brasil na Otan, a Organização do Tratado do Atlântico Norte. Para isso, teria duas hipóteses. Dadas as possíveis dificuldades para levar o Brasil até o Atlântico Norte, Trump pode ceder ao velho desejo americano inspirado pela Amazônia e fazer do Brasil o que fez do Alasca.
Apesar de situado no lado oposto ao Atlântico Norte, esse extremo das Américas integra a Otan desde que declarado estado americano. Na verdade é colônia, como os próprios Estados Unidos estabeleceram, por exemplo, para as "províncias ultramarinas" de Portugal na África. Com o correto argumento de que a dominação de território desconexo é própria de colônia, não de estado nem província, ou lá o que nomeiem.
A outra hipótese, menos própria para o estilo Trump, seria propor aos países europeus da Otan uma condição estatutária nova, para abrigar o Brasil. Ao que os europeus dariam duplo não. Mais nos gabinetes fechados, e ainda assim sonoros, do que às claras, entre os europeus e o governo americano a Otan é causa de crise grave. Os primeiros agem para a criação de uma Otan só europeia, cansados das exigências custosas do sócio, aliás, maior produtor de armas do mundo. Trump, por seu lado, acusa países europeus de atraso deliberado das contribuições financeiras, o que ninguém nega.
A importância dada por Trump ao encontro com Bolsonaro ficou exposta em seu convite à presença de Eduardo Bolsonaro. Criticada aqui e ridicularizada nos Estados Unidos, a presença foi muito boa. Mostrou que a natureza do encontro na Casa Branca, definida por Trump, foi apenas social. Entre duas pessoas que são presidentes, não entre dois presidentes no exercício de suas responsabilidades. Uma visita que levou muito, entregou mais do que levou e nada trouxe.
A não ser um motivo de curiosidade. Nossa. Não consta ter havido, jamais, a visita do presidente de um país ao centro de informação e de ações sigilosas de outro, ainda mais à monstruosa CIA. Por que isso se deu com Bolsonaro, é pior do que não sabido. Muito pior.
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