sábado, 30 de março de 2019

Sérgio Marlboro e o câncer

Fernando Horta

Sobre o "grupo de trabalho" do ex-juiz Sérgio Marlboro e sua "jenial" ideia de baixar o preço do cigarro.

O "jenial" ex-juiz disse que "se o consumo aumentar as medidas estão descartadas" e o que impressiona é o termo "se". Denota que o "jenial" ex-juiz não conhece microeconomia, saúde pública e a história de luta do mundo todo contra o tabagismo desde os anos 60.

A micro-economia mostra em um produto em equilíbrio das curvas de oferta e demanda, se o preço subir, a quantidade consumida diminui. Se o preço descer a quantidade consumida aumenta. O quanto diminui ou aumenta depende da "elasticidade" do produto.

Há um consenso médico de que fumar faz MUITO mal à saúde. E, portanto, é interesse público diminuir o consumo de cigarros. Assim, se coloca um imposto sobre o cigarro e se consegue diminuir a quantidade consumida. O que leva a diminuir os custos com saúde pública ligado ao tabaco

Os "seguidores" e discípulos do juiz Marlboro já foram às redes sociais demonstrar todo o seu "conhecimento" sobre o assunto. E levantam dois "jeniais" argumentos:

Afirmam que como a nicotina vicia, a alteração do preço não altera o consumo visto que o viciado faria de tudo para continuar tendo a droga. Assim, a medida do "jenial" marlboro seria para ajudar a vida das pessoas viciadas. O argumento é todo falso.

Quem estuda o assunto diferencia os consumidores em vários grupos. Há desde os que "entram" no consumo (quase sempre jovens ou crianças) até os que, mesmo consumindo doses diárias não apresentam os sintomas clínicos de vício. Portanto a "necessidade" da nicotina é variável.

A política de aumento de preço é mais efetiva entre os consumidores novos do cigarro (crianças e jovens) que não têm recursos para consumirem a ainda não são viciados a ponto de deixarem de gastar com outras necessidades. Este grupo é o MAIS NUMEROSO consumidor em países pobres.

Exatamente fruto desta política que houve toda uma mudança na cultura do tabagismo nos últimos 20 anos e hoje a indústria do câncer de pulmão vê o menor número de jovens fumando em quase dois séculos.

O segundo argumento (contrabando) é ainda mais bobo. Arjumentam os defensores do "jenial" Moro que o aumento do imposto sobre o cigarro aumenta o contrabando e faz com que as pessoas continuem consumindo e um produto de inferior qualidade. Assim o juiz estaria "ajudando" o país.

Este argumento é ainda mais falso. Ele tem 3 grandes erros. Em primeiro lugar os estudos de microeconomia não diferem entre o produto "legal" e o contrabandado. Para a microeconomia, o contrabando é apenas mais uma das forças a forçar o preço para baixo, e só isto.

Assim, se existem carteiras de cigarro "originais" vendidas a dez reais e o contrabando vendendo a cinco. O mercado vai se regular e chegar a um preço entre estes dois pontos, fazendo tanto o produto original baixar de preço, quando o do contrabando aumentar.

Note, por favor, que se o preço do produto contrabandeado aumentar estamos conseguindo o nosso objetivo que é reduzir o consumo. Ou alguém aqui acha que o maço de cigarro sendo vendido a 20 reais (Exemplo) o contrabandista vai vender o seu por 2,50?

Claro que não! Os agentes no mercado visam sempre vender ao maior preço possível. Logo o valor do maço contrabandeado RESPONDE também ao preço do imposto colocado e sempre para cima.

Mas vamos imaginar que o produto "legal" consiga baixar muito o preço. Que sem o imposto o produto baixe 30% o seu preço. Isto vai acabar com o contrabando? Não! O produto contrabandeado é de pior qualidade e tem uma "elasticidade-preço" muito maior do que o produto "legal".

Chama-se "contrabando" de forma genérica, mas o fato é que "em todas as etapas de produção e transporte" este produto tem uma performance mais barata que o nacional. Assim NUNCA o produto nacional vai conseguir reduzir o preço a ponto de acabar com o contrabando.

O que vai acontecer é que se o maço do produto "original" for reduzido a 1 real, surgiram contrabandistas vendendo a 0,85 centavos. E, lembremos, o consumo de ambos os produtos continuará aumentando.

Agora vamos para a outra ponta: o consumidor. Com uma carteira de cigarro vendida a 50 reais, quem consome? Certamente uma pessoa já postada na vida. Que ganha bem e tem, ao menos em tese, condições de julgar o mau que está se fazendo. O estado não interfere no "direito de fumar"

Agora, baixe-se a carteira de cigarro para 1,50. Sem impostos, sem nada. A indústria fumageira internacional agradece. Quem consome? Certamente os já postados na vida e mais um enorme número de crianças e jovens que não consumiriam o produto a 50 reais.

Veja-se, por favor, que a medida do "jenial" juiz Marlboro, atinge negativamente jovens, e pessoas mais pobres. Não faremos aqui relação dizendo que são as mesmas pessoas que são atingidas pelo "pacote anti-crime", pela "reforma da previdência" e etc.

Vamos ainda, a um outro lado: a diminuição de recursos do governo para atender aos malefícios do tabagismo. Com um imposto alto, temos mais recursos para o governo. Não vamos discutir gestão. Se os recursos vão ou não para a saúde é algo para nossos nobres deputados. Em tese, vão

Agora, se você reduz o imposto (observando as curvas de compensação pelo aumento do consumo) teremos menos dinheiro para os custos da saúde com o problema. Isto pq mesmo que o aumento de consumo iguale a diminuição de impostos na contabilidade final, o custo da saúde será igual.

Ou seja, o juiz Marlboro ainda vai prejudicar as contas públicas. Criar mais déficits e razões para diminuir o acesso à saúde e reclamar do Estado "que não funciona" no Brasil.

Assim, as medidas do "jenial" juiz Marlboro não diminuem o contrabando, não melhoram a saúde da população, atacam crianças e pobres, aumentam os lucros das multinacionais do tabaco e geram mais câncer.

Nada disto é "em benefício do povo" ou "do Brasil". Mas claro que estará tudo muito bem explicado se a indústria fumageira bancar sua campanha à presidência da república em 2022. Aí entenderemos suas ações, como entendemos a Lava a Jato e a prisão ilegal de Lula.

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