quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

Ex-jogador Paulo Cezar Caju é demitido de O Globo por criticar viralatice brasileira


Habituados a perder

Paulo Cezar Caju

Na Copa de 1950, jogamos de igual para igual com o Uruguai, na decisão do Mundial, perdemos de 2 a 1 e vivenciamos o maior choro da história do Maracanã. Em 1982, com uma seleção dos sonhos, jogamos de igual para igual com a Itália, levamos de 3 a 2 e desabamos em lágrimas. Em 1974, o Brasil jogou de igual para igual com a Holanda, perdi um gol feito — até hoje tenho pesadelos com esse lance —, e fomos eliminados da Copa. Depois disso, o Brasil curvou-se aos europeus, e há 20 anos tomamos pancadas nas principais competições internacionais. E o pior disso é que nos acostumamos a perder.

Essa derrota do Flamengo para o Liverpool foi a prova incontestável de que estamos em outro patamar no futebol mundial. Antes mesmo de o Flamengo entrar em campo, muitos torcedores rubro-negros e a própria mídia destacavam o poder de força do time inglês. Ou seja, o time do “Mister” Jorge Jesus já estava feliz por ter ido tão longe. Jogou de igual para igual com o River Plate e até mesmo com os sauditas do Al Hilal.

Jogar de igual para igual já está de bom tamanho para o futebol que um dia foi o melhor do mundo. Os alemães nos colocaram na roda e tiraram o pé para não nos dar de 10, o que não bastou para enterrar, ali, a Era Felipão. Agora, outro alemão, Jürgen Klopp, reforça que ainda falta muito para voltarmos a ser os melhores do planeta. Estamos alguns bons patamares abaixo. Enquanto o time inglês voltou para a Inglaterra sem festas e carros de bombeiro esperando no aeroporto, o noticiário da tevê brasileira abriu informando que o Flamengo perdeu jogando de igual para igual. Mas não bastou! No último domingo, no intervalo do Faustão, um flash ao vivo despertou minha atenção, afinal chovia muito e pensei em alguma catástrofe, mas era, pasmem, uma repórter, de capa amarela, sozinha, em um lugar ermo, informando que o avião do Flamengo, que vinha do Qatar, acabara de pousar no Galeão.

Nunca um vice-campeonato foi tão festejado, nunca aceitamos tão passivamente uma derrota, nunca assinamos um atestado de segundo escalão, talvez terceiro, quem sabe quarto, do futebol mundial. Mas na mesa ao lado da minha, no bar, um torcedor jovem comentava com o outro, orgulhoso, “mas ganhamos milhões, o clube está com muito dinheiro”. Me preocupa essa postura, que não se concentrava apenas naquela mesa de bar em especial. O futebol brasileiro precisa contratar um bom psicanalista, deitar-se no divã e rever os seus conceitos.

A derrota deve ser chorada, sofrida. Do contrário, nos acostumaremos com ela e oficializaremos esse ridículo de igual para igual como nosso mantra. Pergunte para algum jogador brasileiro da Copa de 1978 se eles concordam com o título dado a eles de campeão moral.

Campeão é quem está no alto do pódio, como fez o Liverpool e sua louvável miscigenação, com o egípcio Mohamed Salah, o senegalês Sadio Mané, o holandês Virgil van Dijk, o brasileiro Roberto Firmino e o inglês Trent Alexander-Arnold.

O Brasil mais uma vez bateu palmas para os vencedores. Se continuarmos com essa filosofia acabaremos lustrando suas chuteiras e os carregando nos ombros durante a volta olímpica.

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