quarta-feira, 20 de março de 2019

O "nacionalismo" do Capitão Pateta


Algumas pessoas estão falando do "nacionalismo" do capitão. Por um lado dizem que ele não é nacionalista e sim "entreguista". Por outro dizem que por ele não ser nacionalista, o adjetivo "fascista" não poderia ser usado. 

Permitam-me dizer que estão todos equivocados.

"Nacionalismo" é um fenômeno dos séculos XIX e XX. Antes, existiam outras formas de coesão social, como o clientelismo, as relações de suserania e vassalagem, a igreja e suas formas de controle ou pura e simplesmente o poder do dinheiro.

É no século XIX que se desenvolve esta ideia de que existe um ente abstrato chamado "nação" que supostamente une pessoas. Os historiadores, contudo, mostraram que isto não existe. Que é uma criação discursiva sem muita racionalidade ou empiria. É o nacionalismo que cria a nação.

Existem três grandes nomes no estudo do nacionalismo: Eric Hobsbawm, Benedict Anderson e Ernest Gellner. Todos compartilham da ideia da criação da nação. Ou seja, não existe um grupo de características a priori que una as pessoas. O que ocorre é exatamente o contrário.

Determinadas pessoas, por interesse político, elevam determinadas características culturais, históricas, sociais e etc. à condição de formadoras de uma "comunidade imaginada" nas palavras de Anderson.

É o interesse político que separa as pessoas em pertencentes ou não a esta coisa imaginada chamada "nação". Durante a segunda guerra, por exemplo, o conceito de nação era expandido. Ingleses, franceses, alemães e etc ... todos brigavam por alargar a ideia de nação e ganhar apoio.

Os ingleses chegaram a negociar com a Índia e outras regiões o alargamento da condição de cidadania (e portanto pertencimento ao "reino unido") em troca dos numerosos exércitos indianos, sem os quais a Inglaterra não teria sobrevivido à guerra.

Em tempos de crise (econômica geralmente) ocorre exatamente o contrário. Diminuem-se os limites do que é nação, com o objetivo de excluir grupos de pessoas do acesso aos recursos econômicos gerenciados pelo Estado. A Alemanha nazista fez exatamente isto.

Populações de origem judaica, eslava ou mesmo germânica de fenótipos diferentes eram declarados "não alemães" sob a desculpa da "eugenia" e superioridade da raça ariana. No fundo este alargar e diminuir os limites do que é nação é uma das partes do problema.

No Brasil, por exemplo, o governo Bolsonaro se esforça por diminuir a noção de "nação" e a correspondente "cidadania". Quem é de "esquerda" "não é brasileiro". Quem veste vermelho também não. Quem é quilombola, homossexual ou migrante é a "escória da humanidade" e "vergonha" ...

O objetivo é claro, é diminuir o acesso aos recursos econômicos ou financeiros por quaisquer meios possíveis. O conceito de "nacionalismo" é, portanto, plástico. Ele se molda aos interesses dos detentores do poder. O nacionalismo de Lula e sua ideia de cidadania eram enormes.

Com Lula, os recursos do Estado eram direcionados a todos os brasileiros e a regra para ser brasileiro era apenas se dizer pertencente ao Brasil. Tanto que ele foi um dos primeiros a criar mutirões de legalização de documentos, pois tínhamos quase 18% da nossa população sem docs.

No século XX o conceito de "nação" e a "defesa da nação" eram do tamanho e forma que os mandatários políticos definiam. Roosevelt, por exemplo, aceitou mudar o status das ilhas como Porto Rico, Ilhas Virgens e Samoa para evitar as críticas soviéticas de "potência colonial".

Então como funciona hoje? Se a "comunidade é imaginada" como diz Anderson, ainda que tenha algum lastro cultural e linguístico, quem define o que é "ser nacionalista" é quem detém o poder político. Bolsonaro escolhe homenagear ustra e isto se torna "nacionalismo".

Entregar o "pré-sal", a base de Alcântara, bater continência para a bandeira americana, abrir a amazônia para eles e qualquer coisa que ele venha a fazer será explicada como "em benefício do Brasil" ... e o jogo de alarga e diminui o conceito de "nação" continua.

Portanto, na cabeça de Bolsonaro e de quem o apoia, ele bater continência para a bandeira e cantar o hino com lágrimas nos olhos é suficiente para ser "nacionalista". Exatamente porque quem define o que é "nacionalismo" é quem detém o poder. É um significante sem significado.

Ou seja, os conceitos de "nação" e "nacionalismo" são "caixinhas vazias" de significado que quem detém o poder configura como melhor atender aos seus interesses. O Brasil de Lula era gigante e diverso, o de Bolsonaro é diminuto, masculino, branco e rico.

E enquanto ele defender os homens, os brancos e os ricos ele vai ser chamado de "nacionalista". Não importa se ele vender o Brasil todo e nós ficarmos apenas com a bandeira ... ainda assim dirão que ele "defende o Brasil"...

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