sexta-feira, 30 de abril de 2021
Resumão da primeira semana da CPI da Covid
E vamos de resumão da primeira semana da #CPIdaCovid. pic.twitter.com/46OukSvz03
— PT Brasil (@ptbrasil) April 30, 2021
O Brasil é um país genocida
A cultura do extermínio e da sua naturalização acompanha o Brasil ao longo dos séculos. De indígenas a vítimas da ditadura e da covid: as vidas e as mortes de pessoas supostamente menos humanas parecem pouco importar.
"Somos um país genocida. Não apenas hoje, quando temos quase 400 mil mortos pela pandemia. Mas desde sempre."
Há muito tempo, uma grande amiga, também historiadora, me disse: "Você precisa ler este livro."
O tema é devastador. O genocídio no maior hospício do Brasil. Eu, que já trabalho com um dos temas mais violentos da história brasileira, retardei minha leitura por anos. E quando a fiz, foi de supetão, numa espécie de atropelo guiado pela fina escrita da autora Daniela Arbex e por toda a violência e tristeza que o livro carrega. Como um remédio amargo, que tomamos num gole só. Foram 60 mil mortos dentro de uma instituição, administrada pelo Estado, que tinha a função de oferecer tratamento e condições de vida adequadas àqueles considerados doentes mentais.
O Hospício de Barbacena, fundado em 1903, abrigou milhares de vidas. E, infelizmente, destituiu de humanidade praticamente todas elas, naquilo que a autora bem chamou de "Holocausto brasileiro", expressão que dá título ao livro. Uma sucessão de tragédias pessoais, incompreensões da natureza humana, racismo, machismo e decisões políticas criminosas que resultaram num campo de concentração em pleno sudeste de Minas Gerais. Um retrato do que temos de pior.
A leitura de Holocausto brasileiro: Genocídio: 60 mil mortos no maior hospício do Brasil em plena pandemia, quando o Brasil vive a pior crise sanitária de todos os tempos, foi uma atitude quase masoquista da minha parte. Todavia, essa experiência foi fundamental para solidificar a certeza de que somos um país genocida. Não apenas hoje, quando temos quase 400 mil mortos pela pandemia. Mas desde sempre. E se engana quem considera que essa constatação retira a responsabilidade de governantes e instituições públicas pelo que está acontecendo. Na realidade, tal constatação nos devolve à História, essa senhora do tempo, que nos ensina a diferenciar tragédias de projetos políticos. Porque, quando a tragédia tem destino certo, ela perde a sua imponderabilidade e, por isso, precisa ganhar outro nome. E, em certa medida, é isso que nos falta por aqui: rememorar e nomear as nossas carnificinas.
O número de homens e mulheres indígenas mortos desde 1500 é praticamente incalculável. As estimativas apontam que 70% do total da população nativa foi dizimada, o que, numa perspectiva bem conservadora, indica que praticamente 2,5 milhões de indígenas sucumbiram ao projeto que estava sendo gestado no período colonial. O Brasil também foi o território da América que mais recebeu africanos escravizados. Ao menos 4,5 milhões de homens e mulheres foram retirados à força do continente africano e subjugados à instituição escravista em terras brasileiras. Isso sem contar a violência inerente e cotidiana da vida em cativeiro, fosse para os africanos, fosse para aquelas e aqueles nascidos no Brasil.
Mesmo horrorizados, muitos dirão que apesar de profundamente violentas, as trucidações pelas quais indígenas e negros passaram ao longo de quatro séculos da história do Brasil não podem ser lidas de forma anacrônica. O que é verdade. A escravização e a catequese forçada, por exemplo, foram duas instituições que tiveram respaldo legal e moral por séculos. E, mais do que isso, foram práticas disseminadas que formataram a sociedade brasileira. Entretanto, isso não significa dizer que elas foram os únicos projetos vigentes à época. Basta um olhar mais atento para a história do Brasil, para observamos que ela está cravejada de lutas e formas de resistência implementadas por homens e mulheres que não aceitaram viver apenas sob o signo da violência, e que forjaram outros mundos, outras possibilidades de ser, pagando preços altos por tais ousadias.
Ou seja, não houve um único período da história do Brasil no qual a escravidão e as explorações coloniais não estivessem sendo questionadas e combatidas. O que nos leva a pensar sobre a legalidade e a moralidade como atributos historicamente construídos, que serviram a interesses e grupos sociais específicos. E ao optarem repetidamente por uma legalidade e moralidade de extermínio, esses interesses criaram uma cultura na qual é muito nítido o escalonamento da humanidade: há vidas que valem mais do que outras. E o que determina o valor dessas vidas é a combinação entre cor da pele, gênero e condição socioeconômica.
Mesmo com transformações políticas e econômicas significativas do período republicano e o avanço na luta dos direitos humanos, a cultura do extermínio e da sua naturalização nos acompanham. Há pessoas que são, supostamente, menos humanas que outras e, por isso, suas vidas e mortes parecem pouco importar. O que dizer dos 25 mil assassinados em Canudos? Dos milhares de mortos desaparecidos e torturados em nossas experiências ditatoriais? Dos 111 detentos mortos no Carandiru? Do massacre da Haximu? Das chacinas da Candelária e do Vigário Geral? Do massacre de Eldorado dos Carajás? Das vidas ceifadas por balas perdidas? Da imensa maioria dos 400 mil mortos pela covid?
Como definir esses episódios da nossa história?
Extermínio, genocídio, massacre, matança, aniquilação, mortandade, trucidações. Sinta-se à vontade para escolher.
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Mestre e Doutora em História Social pela USP, Ynaê Lopes dos Santos é professora de História das Américas na UFF. É autora dos livros Além da Senzala. Arranjos Escravos de Moradia no Rio de Janeiro (Hucitec 2010), História da África e do Brasil Afrodescendente (Pallas, 2017) e Juliano Moreira: médico negro na fundação da psiquiatria do Brasil (EDUFF, 2020), e também responsável pelo perfil do Instagram @nossos_passos_vem_de_longe.
Os valores de Guedes
Nenhum economista espelharia tão bem os valores bolsonaristas como Guedes
Paulo Guedes perdeu a aura de superministro, mas continua a ser o homem certo para o cargo que ocupa. Nenhum outro economista espelharia tão bem os valores e princípios do bolsonarismo. Ou a ausência deles.
Em dois anos e quatro meses no poder, Guedes já ofendeu mulheres, servidores públicos e pobres em geral. A lista de insultos voltou a crescer na terça-feira, em reunião do Conselho de Saúde Complementar.
Sem saber que estava sendo gravado, o ministro disse que “o chinês inventou o vírus, e a vacina dele é menos efetiva do que a americana”. A frase criou um novo atrito diplomático com o maior parceiro comercial do Brasil.
Guedes também reclamou do envelhecimento da população, um fato que deveria ser comemorado. “Todo mundo quer viver cem anos”, resmungou, acrescentando que não haveria como atender a todos no setor público.
A queixa revela desprezo pelos idosos mais pobres e insensibilidade com o morticínio no país. Um estudo de Harvard mostrou que a pandemia reduziu a expectativa de vida dos brasileiros em quase dois anos.
O ministro não pode culpar a câmera indiscreta pelo seu festival de preconceitos. Em eventos públicos, ele já fez coisas como chamar servidores de “parasitas” e dizer que a primeira-dama da França “é feia mesmo”.
Em outra palestra, apontou o que via como efeito indesejado do dólar baixo: “Empregada doméstica indo para Disneylândia, uma festa danada”. Ele sugeriu que as trabalhadoras deveriam se contentar com passeios mais modestos: “Vai para Cachoeiro do Itapemirim, vai conhecer onde o Roberto Carlos nasceu”.
Na reunião de terça, Guedes reclamou que o Fies bancou a faculdade de “filho de porteiro” que tirou zero no vestibular. A história é inverossímil porque o programa exige nota mínima para conceder bolsas. Mas a mentira não é o pior da fala ministerial.
Em novembro, o jornal “El País” entrevistou Gabriella Juvenal Figueiredo, mestranda em história da arte na Espanha. Filha de um porteiro e uma doméstica, ela relatou uma vida de discriminação por estudar entre jovens da elite. “Infelizmente, tive de aprender a sobreviver ao lado dessas pessoas que te olham por cima do ombro”, disse.
Ao contar o que enfrentou, Gabriella resumiu os valores de Guedes.
Bolsonaro oferece 400 mil mortos ao lúmpen-milicianato
Bolsonaro deu voz aos que viviam nas sombras, esgueirando-se nos escuros da história nunca visitados pela teoria política
A instalação da CPI da Covid mexe com os bofes de Jair Bolsonaro. Agride o seu senso de onipotência —injustificado segundo um crivo objetivo, mas compreensível se visto por lentes clínicas. O golpista de primeira hora, que nunca precisou de comissão de inquérito ou de oposição organizada para pregar o rompimento da ordem —como provam os atos antidemocráticos que patrocinou já em 2019—, não aceita que sua obra seja questionada. Os, até agora, mais de 400 mil mortos são o seu grande legado ao lúmpen-milicianato que o aplaude.
A política sempre deve ter precedência na análise da vida pública, embora os dados de personalidade não possam jamais ser ignorados. Uma leitura mais aberta de Maquiavel sugere que a “fortuna” e a “virtù” —a história herdada que condiciona alternativas e as escolhas ditadas pela personalidade— também podem ter um enlace negativo. Em vez de surgir o Príncipe, eis que aparece o ogro, que a democracia tem de esconjurar. Ou morreremos todos.
Assim, é claro que, ao não arredar um milímetro das posições as mais estúpidas e reacionárias, que muitos enxergam danosas e contraproducentes para seu próprio futuro político, Bolsonaro age com cálculo. Ele deu voz a esse público que existia nas sombras; que se esgueirava nos escuros da história; que se acoitava nos desvãos nunca visitados —não de modo suficiente ao menos— pela teoria política.
Guedes e Bolsonaro personificam a versão brasileira do centauro do neoliberalismo
quinta-feira, 29 de abril de 2021
O Brasil é presidido por um sujeito acusado de crimes que vão de peculato, terrorismo, genocídio, assassinatos, fraude eleitoral e associação com milicianos
Crise? Vocês não viram nada ainda
Brasil afunda sem futuro à vista
Vamos às premissas.
O Brasil é presidido por um sujeito transtornado, acusado, ele e sua famiglia, de crimes que vão de peculato, terrorismo, genocídio, assassinatos, fraude eleitoral eletrônica e associação com milicianos, entre tantos outros.
O Congresso é um lupanar político à cata de verbas para manter currais. Pouco se importa com a destruição acelerada do país. Seus integrantes disputam o dinheiro do povo como urubus farejam o cheio de cadáveres.
O Judiciário funciona como biruta de aeroporto. Decide de acordo para onde sopra o vento. Acerta de vez em quando, erra na maioria das vezes. Vossas Excelências estão mais preocupadas em salvar suas próprias biografias embora seja um pouco tarde.
Vamos aos resultados.
O Brasil mantém-se como um dos top five das mortes e contaminados pela Covid-19. Não há política de saúde nem saúde na política. 400 mil mortes, fora os óbitos habituais. Ministros de alto coturno tomam vacina escondidos para não melindrar o chefe que até hoje considera tudo como uma “gripezinha”.
A economia está nas mãos de um especulador barato (ou caro...). Os indicadores, quando lidos de forma isenta, exibem uma derrocada generalizada, mas Paulo Guedes enxerga o pôr do sol onde o mundo e os brasileiros veem o Brasil dissolvido nas trevas.
Nem Guedes acredita no que ele fala, vamos combinar. Tanto que já trocou, e vem trocando, sua “equipe” de auxiliares. Não é bobo. Prepara o desembarque para manter seu patrimônio individual.
A miséria se espalha. A quantidade de pobres e famintos se multiplica no país. Quem consegue sair às ruas vê isso a céu aberto. O novo auxílio emergencial é uma piada.
Não satisfeito em desprezar a pandemia e ignorar a doença, o capitão terrorista resolveu quebrar o termômetro. Cancelou o censo. É como subir num avião sem plano de voo nem destino.
Vamos ao futuro.
Criaram a CPI da Covid. Mais um balcão de negociatas. A única coisa certa é que o capitão ficará ainda mais acuado. Nem tem para onde fugir, exceto usar o dinheiro público para salvar o seu pescoço e da famiglia.
O povo, ora o povo.
Crise? Preparem-se.
A marca de 400 mil mortos por covid-19 é o símbolo da transformação do desastre numa catástrofe
No fim de abril de 2021, enquanto se discute se o genocida é genocida, Bolsonaro continua a dinamitar todas as medidas de combate ao coronavírus.
Por que a Sputnik V foi rejeitada pela Anvisa de Bolsonaro?
Sir O'Gomes faz de palhaços seus possíveis aliados
Ciro desgarra de presidenciáveis e acaba com sonho de candidatura única de centro
A iniciativa de Ciro Gomes de divulgar filmetes com suas propostas para o Brasil jogou um balde de água fria em políticos que formaram com ele o chamado G-6 —grupo de presidenciáveis que reúne também o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, o governador de SP, João Doria, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, o apresentador Luciano Huck e o empresário João Amoêdo.
BREQUE
A ideia é que todos, ao menos publicamente, atuassem como se não fossem ainda candidatos, permitindo o diálogo e até, quem sabe, uma candidatura única para 2022. Mas Ciro, nas palavras de um deles, “desgarrou”. E acabou com o projeto de unir a todos em torno de um nome que ganhasse força para se contrapor a Jair Bolsonaro e a Lula na sucessão presidencial.
ACELERADOR
A atitude não surpreendeu: Ciro nunca se comprometeu a retirar a pré-candidatura, ainda que temporariamente, de cena.
ACELERADOR 2
Na semana passada, o PDT anunciou que contratou o jornalista e marqueteiro João Santana para cuidar da comunicação do partido. A legenda desde então já lançou três filmetes em que Ciro fala sobre propostas para o Brasil, numa postura de candidato.
ACELERADOR 3
A integração de Santana ao projeto de Ciro solidificou a certeza de que o pedetista será candidato, chova ou faça sol. O jornalista comandou as campanhas vitoriosas de Lula para presidente, em 2006, e de Dilma Rousseff em 2010 e em 2014.
com BIANKA VIEIRA e VICTORIA AZEVEDO
Bolsonaro comemora 400 mil CPFs cancelados
Um em cada cinco óbitos registrados no país desde março de 2020, quando começou a pandemia, foi provocado pelo novo coronavírus
O curioso fenômeno de demência coletiva que apaga expressões populares
Take away ou para viagem?
Saiu nesta Folha, na coluna Painel S.A.: “Restaurantes querem aportuguesar o take away na pandemia”. Era o dia 1º de abril, mas não se tratava de uma pegadinha com o leitor.
O texto era sério e explicava que o modelo em que “o cliente vai até o estabelecimento, a pé, buscar a refeição” se tornou “conhecido no Brasil depois da quarentena”.
Éramos informados de que, embora o intrigante conceito comercial tenha semelhanças com o de drive thru –“que recebe o consumidor de carro e já é tradicional por aqui há décadas”–, a troca de rodas por sapatos traz novos desafios.
Chef de máscara e roupa branca prepara sacola de papel com alimentos para viagem, em frente a parede branca
“Além de take away, os restaurantes chamam o modelo de pick up, to go, grab and go e outras variações de expressões em inglês com o mesmo significado de pegar e levar”, prosseguia a nota.
“Se a gente não unificar isso, cada lugar do Brasil terá um entendimento diferente”, angustiava-se o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes.
Adorei o humor involuntário da coisa, fundado no pacto de invisibilidade —do qual se espera que o leitor participe— da expressão “para viagem”.
Anterior não só à pandemia atual, mas também à da gripe espanhola, a locução “para viagem” goza de consagração popular e lexicográfica.
Informando tratar-se de um brasileirismo informal, o Houaiss a define assim: “acondicionado em embalagem, para ser levado e consumido em outro local (diz-se de comida, alimento)”.
Quer dizer que os brasileiros já sabiam ser possível comprar uma refeição no restaurante e levá-la para casa antes que os americanos nos ensinassem a fazer isso com seu mind-blowing conceito de take away ou grab and go?
Aparentemente, sim: já se levavam quentinhas cheias de bolinhos de bacalhau para casa na República Velha, quem sabe até no Império. Por incrível que pareça.
Como explicar então a hilariante —a princípio, e logo também perturbadora— invisibilidade de “para viagem” no impasse tradutório da associação de restaurantes?
Imaginei um conto de fadas em que o povo de certo burgo começasse a esquecer o nome das coisas, numa espécie de demência coletiva, sendo forçado a adotar palavras importadas para os atos mais rotineiros.
“Ah, se tivéssemos um nome para essa bebida preta que tomamos depois de acordar!”
“Você quer dizer, na morning?”
“Sim, a bebida da morning. Essa preta aromática.”
“Mas nós temos um nome: coffee.”
“Ah, é, obrigado. Me passa a butter?”
O leitor não deve imaginar que o colunista compartilhe qualquer traço de xenofobia com o ex-deputado Aldo Rebelo, que 20 anos atrás tentou enquadrar os estrangeirismos numa lei ridícula.
A mania anglófila que mesmeriza parte da sociedade brasileira —um fenômeno de classe média e alta concentrado nos setores corporativo e marqueteiro— é jeca, mas não é motivo de alarme.
Os restaurantes nem precisariam traduzir take away, como nunca traduziram drive thru. Línguas assimilam isso bem. O que causa espanto é que, buscando uma tradução, não enxerguem a que está debaixo do seu nariz.
A quem quiser entender por que palavras importadas não nos fazem mal, recomendo o livro “Estrangeirismos – Guerras em Torno da Língua” (Parábola), organizado por Carlos Alberto Faraco e lançado no calor da polêmica aldo-rebeliana.
O caso do take away me fez voltar a ele, mas não encontrei nada sobre o fenômeno de demência coletiva que apaga expressões populares como “para viagem”. Quem sabe entramos numa nova fase.
As grandes igrejas não querem fiéis, querem consumidores
Esse tipo de pânico moral movido pela boataria mais abjeta não é só uma característica do protestantismo no Brasil: se tornou seu cerne. O grande negócio da fé se tornou a venda um estilo de vida "puro" e livre dos pecados "do mundo". https://t.co/dSxiSf9ftg
— Carapanã (@carapanarana) April 29, 2021
As grandes igrejas não querem fiéis, no sentido estrito do termo, querem consumidores. Não é sobre o dízimo simplesmente, mas sobre o controle de corpos e mentes através de uma indústria cultural que já tem décadas de existência.
Qualquer projeto de ensino público laico é enxergado como inimigo do complexo cultural gospel. Boa parte do poder político das igrejas deriva desse complexo - e consequentemente o do bolsonarismo também.
Converter é mudar o estilo de vida. É assistir Record ao invés de Globo, é deixar de frequentar pagodão pra consumir música de pastor-cantor, etc etc. Ser um bom cristão, vejam só, é consumir entretenimento gospel.
Essa construção ficcional do "mundo" (como os evangélicos se referem ao que está fora da esfera de influência da igreja) é necessária pra manter o fiel na linha. Lembro desse tipo de mediação ter relativamente pouca tração na política durante a década de 1990. Não mais.
O Brasil não merecia isso
"No lugar de declarar guerra ao vírus, ele declarou guerra à ciência, à medicina e à vida. As mortes seriam evitadas. Sua necropolítica e sua política da morte constituem um crime contra a humanidade que deve ser investigado. Hoje, Bolsonaro é um perigo para o mundo todo e o povo brasileiro não merece".
Miguel Urban Crespo, deputado do Parlamento Europeu, esta manhã, no plenário, durante uma longa sessão de humilhação internacional para o Brasil.
Aquelas pessoas que diziam "o Lula não pode representar o Brasil lá fora" e falavam da deselegância do andar de Dilma estão satisfeitas agora? Aquela classe média que não queria pobre no aeroporto e que se preocupa em manter as aparências, tá feliz com as aparências mantidas por um miliciano genocida que expele marimbondos putrefatos ao falar?
O Brazil que tanto se preocupava com as aparências, matou o Brasil internacionalmente respeitado por seu soft power e mostrou sua verdadeira face.
Concordo com tudo que o eurodeputado falou, inclusive a parte sobre não merecer. O Brasil que gerou Paulinho da Viola não merecia isso. Nem o Brazil que gerou o sacolé de bicheira merecia, acho.
quarta-feira, 28 de abril de 2021
Paulo Jegues é um ministro singularmente incompetente, despreparado e insensível à realidade
Guedes deixou, faz tempo, de ser "superministro". Mas, aferrado ao cargo, aceitou bem a nova situação. E continua cumprindo o papel ao qual estava destinado: é o talismã que faz com que a burguesia e seus porta-vozes não abandonem o governo, por mais criminoso e insano que ele se mostre.
Para dourar a pílula, insistem na balela de que Guedes representa uma ala "racional" ou mesmo "técnica" do governo. Um pobre banqueiro constrangido à convivência com milicianos e terraplanistas.
É uma lenda que não resiste a cinco minutos de observação de Guedes, um ministro da Economia singularmente incompetente, despreparado para o cargo e insensível à realidade.
Basta pinçar alguns highlights de sua performance na reunião do Conselho de Saúde Complementar, ontem.
Ele falou com liberdade porque não sabia que a reunião estava sendo transmitida pelas redes sociais do Ministério da Saúde. Então assumiu plenamente a teoria conspiratória preferida da extrema-direita, dizendo que "o chinês inventou o vírus".
Isso para louvar a eficácia superior das vacinas estadunidenses, porque "o americano tem cem anos de investimento em pesquisa". Inadvertidamente, confessou que seu projeto é de um Brasil para sempre atrasado - já que sua política econômica não dá nenhuma margem para investimento em pesquisa.
Aproveitou para, uma vez mais, defender o desmonte do sistema de saúde pública - em vez disso, seriam dados vouchers, para o pobre "ir no Einstein, se quiser".
A velha defesa a priori das virtudes do mercado, que, entre muitas outras coisas, ignora que o mercado opera por segmentação. Tenho uma ideia melhor: cobrar dos ricos os impostos que Guedes não quer cobrar e socializar todo o sistema hospitalar. Com isso irá ao Einstein não quem "quiser", mas quem precisar.
De quebra, anunciou que morrer jovem é ato de patriotismo (ele e seu chefe bem podiam dar o exemplo). Segundo Guedes, hoje “todo mundo quer viver 100 anos” e o orçamento do Estado não aguenta.
Nem é preciso qualquer comentário para descrever o tipo de visão que sustenta uma frase destas.
Mas o eterno Chicago boy pode ficar orgulhoso. O governo ao qual ele serve, adotando as políticas que ele patrocina, está promovendo a primeira redução da expectativa de vida dos brasileiros em décadas.
MiJair Boçalnato diz que a Antártica fica no Brasil
Antártica no Brasil, isso não é um presidente, é um asno falante pic.twitter.com/3sREtsWO92
— detremura em 🏡 (@detremura) April 28, 2021
O país de Boçalnato é uma esbórnia
Radical
O projeto de destruição de Bolsonaro é radical. Não poupa nem o Exército. Ou não é uma desmoralização para a instituição ver um general da ativa de bermudas, camiseta, flanando sem máscara - cujo uso é obrigatório em espaços públicos - em um shopping de Manaus? Ou um general da reserva, chefe da Casa Civil, afirmar que se vacinou contra a COVID19 escondido - para não contrariar o chefe - porque ele, o general, quer viver!
O país de Bolsonaro é uma esbórnia.
Choronavirus, pãodemia e cloroquiners deveriam entrar para o dicionário
Na pandemia da Covid-19, nós ressuscitamos uma dezena de palavras moribundas e mortiças
Você deve ter lido esta matéria: a língua alemã criou mais de mil palavras na pandemia. Chamam de “coronaangst” o medo da pandemia, e de “impfneid” a inveja das pessoas que já se vacinaram. Tem nome até praquele corte de cabelo que você fez em si próprio: “coronafrisur”, ou coronacorte.
“Até nisso os alemães trabalham mais que a gente!”, pensei, invejoso, antes de perceber que não ficamos pra trás. Não criamos mais de mil palavras, claro. Em português não é assim que funciona.
Palavra aqui não é mosquito, que basta um pouco de água parada pra se reproduzir. Nosso léxico, romântico, precisa de clima pra acasalar. Não se faz uma palavra assim: coronarraiva. Tá vendo? Não rolou. Em português tem que ter química pra dar match. Mas quando rola é bonito de ver. E aconteceu diversas vezes nessa pandemia.
À proliferação de padeiros deram o nome brilhante de pãodemia. Chamamos de choronavírus a tristeza pandêmica e as crises de choro tão comuns no confinamento.
Quarenteners são os que ainda acreditam nas recomendação da OMS, em contraponto aos cloroquiners, que confiam mais no general Pazuello. Os participantes de uma festa pandêmica são os covidados.
Já o imunizante chinês foi batizado por seus detratores de Vachina. Repleto de bonecas e brinquedos, o lugar em que escrevo virou um ex-critório. Esse acabei de inventar. Perdão.
Não só de palavras novas se encheu nossa boca. Ressuscitamos uma dezena de palavras moribundas, mortiças como a palavra mortiça. Os alemães, tão atentos à sustentabilidade, deveriam se perguntar: por que fabricar palavras com tantas encostadas, apodrecendo no armário? Lavou, tá nova.
"Assintomático” constava nos compêndios médicos, nunca tinha frequentado conversa de WhatsApp. A palavra “imune” pertencia ao Big Brother, assim como “confinamento” e “casa de vidro”. “Genocida” pertencia aos livros de história (que saudade) e hoje está em todas as goelas do país.
“Pandemia” morava nos cafundós do dicionário, perto da palavra “quarentena” —outra palavra mortiça que voltou a nos assombrar. Ou “platô”, antes restrita aos geólogos, e “cepa”, antes restrita aos enólogos. Disso também tenho saudades.
Não devemos nada aos gringos na abundância vocabular. Talvez só nisso, mesmo. Deve existir em alemão uma palavra pra inveja de alguém por algo que nós já temos. Em português existe: complexo de vira-lata. Aliás: vira-lata, que palavra.
terça-feira, 27 de abril de 2021
Urubu nasce sabendo achar carniça
Se ele fosse inteligente, eu até pensaria que há uma estratégia para impedir a vacinação e matar mais gente.
Mas não tem estratégia, não. É pior. É instinto. Urubu nasce sabendo achar carniça.
Ministro Paulo Jegues critica brasileiros que insistem em não morrer: "Todo mundo quer viver 100 anos”
Guedes critica aumento da expectativa de vida: "Todo mundo quer viver 100 anos”
O ministro da Economia , Paulo Guedes , afirmou nesta terça-feira (27) que não foi a pandemia que tirou a capacidade de atendimento do setor público, mas sim "o avanço na medicina " e "o direito à vida''.
"Todo mundo quer viver 100 anos, 120, 130 ", disse. Segundo ele, "não há capacidade de investimento para que o Estado consiga acompanhar" a busca por atendimento médico crescente.
De acordo com o ministro, o Estado "quebrou" e, diante da escassez de recursos do sistema de Saúde , o setor público não terá capacidade de atender à demanda crescente por atendimento da população.
Desde 1940, a expectativa de vida do brasieliro médio só vinha aumentando, ano após ano. Dos anos 40 para 2019, houve um acréscimo de de 31,1 anos de vida para alguém que nascesse no Brasil, e o número passou de 45,5 anos para 76,6.
Em 2020, com a pandemia e as mais de 2 mil mortes diárias , o tempo estimado de vida após o nascer foi de 75,4 anos em 2020, um ano a menos que no período anterior.
Finanças públicas
Em fevereiro de 2020, um mês antes da crise sanitária se instalar no Brasil, um estudo da Secretaria do Tesouro Nacional já apontava a necessidade de gastos adicionais em saúde entre 2020 e 2027 devido ao envelhecimento populacional.
"Há uma forte pressão para elevação das despesas [em saúde] em decorrência do processo de envelhecimento da população, dado que a população de maior idade demanda proporcionalmente mais serviços de saúde", avaliou a instituição.
No ano pré-pandemia, a regra do teto de gastos impediu um aumento das despesas na área de saúde. Em 2019, R$ 9,05 bilhões deixaram de ser empenhados para essas despesas, de acordo com o Tesouro Nacional.
Com a eclosão da pandemia no início de 2020, foram gastos R$ 42,7 bilhões a mais no setor. Em 2021, o governo vem liberando gastos pontuais por meio de créditos extraordinários.
A regra do teto de gastos vale por 20 anos, e pode ser reavaliado a partir de 2026.
Se os brasileiros morrerem, o país vai para a frente
A insustentável longevidade do ser pic.twitter.com/IrKGFdUn3y
— Ricardo Coimbra (@coimbraricardo) April 27, 2021
Paulo Jegues ofende a China de novo
Assista ao momento em que o ministro Paulo Guedes ataca o maior parceiro do Brasil com a fake news de que “o chinês inventou o vírus”. pic.twitter.com/PyWYvGl9oC
— Aquiles Lins (@linsaquiles) April 27, 2021
Covid-19: SP volta a superar mil mortes por dia; casos somam 2,8 milhões
Do UOL, em São Paulo
O estado de São Paulo voltou a registrar mais de mil mortes em um dia por covid-19. Dados divulgados no boletim de hoje da Secretaria Estadual da Saúde apontam 17.992 novos casos e 1.044 novas mortes no período de 24 horas.
A última vez que a marca de mil mortes foi superada foi no dia 20 de abril, quando foram registrados 1.122 óbitos. Os números de hoje têm dados acumulados do final de semana, quando habitualmente são registrados menos óbitos e casos.
Abril já é o mês mais letal da pandemia no estado com mais de 17 mil mortes, contra 15.159 de março, mês que havia batido recorde. No total, já são 2.856.225 casos e 93.842 óbitos por covid-19 no estado desde o início da pandemia.
Hoje, São Paulo tem 22.112 pacientes internados em UTIs (Unidade de Terapia Intensiva) e 11.686 em enfermarias. A taxa de ocupação dos leitos de UTI no estado é de 80% e na Grande São Paulo é de 78,3%.
Nos últimos dias, o governo do estado apontou uma queda conjunta nos indicadores de novos casos, óbitos e novas internações pela primeira vez em dois meses.
De acordo com o governo paulista, o registro de novos casos diários em relação à última semana epidemiológica caiu 14%, novas internações reduziram em 6% e óbitos, em 23%. O Centro de Contingência do Coronavírus atribui as quedas à diminuição de circulação nas fases restritivas.
O projeto de destruir o Brasil com uma visão de mundo tacanha encontrou um porta-voz perfeito em Paulo Guedes
Não tem a menor condição de ser ministro da Economia. É um trapalhão, um farsante.
Pinturas vivas
Living paintings. 😂😂 pic.twitter.com/kptGbS8t6W
— The Best (@Thebestvideos_) April 27, 2021
O custo do caos
A decadência de um país
Luis Felipe Miguel
Duas breves notas e um excurso sobre a decadência de um país
Primeira nota: Não tenho, evidentemente, nenhum conhecimento especializado para julgar a decisão da Anvisa sobre a vacina russa. Mas como confiar nela?
A agência está tomada pelo bolsonarismo. É de desconfiar de uma decisão que agrada tanto à política genocida do Planalto, em seu embate com os governadores, e aos grandes laboratórios ocidentais.
A desmoralização da Anvisa é outros dos crimes do cara da casa de vidro contra a saúde pública brasileira.
Segunda nota: O juiz de primeira instância que decidiu ditar a composição da CPI da Covid é mais uma demonstração do vale tudo imperante no Brasil desde que começou o desmonte da Constituição de 1988.
A separação de poderes cedeu lugar à lei da selva, em que pode mais quem berra mais alto.
O Senado já decidiu que vai ignorar a "decisão judicial", o que no caso é óbvio, mas o impressionante é o juiz Charles Morais achar que podia não apenas recepcionar - ou o verbo é receptar? - a ação movida por Carla Zambelli, como conceder limitar.
O excurso: Na verdade, para saber que estamos vivendo num país esculhambado basta lembrar que Carla Zambelli é deputada - mais ainda, uma das pessoas fortes do Congresso...
Aquilo deu nisso
Reapareceu Heloísa Helena, um dos maiores símbolos viscerais da esquerda antipetista nos governos do PT. Ganhou um cargo de indicação no Senado, indicação no gabinete de oposição da REDE e do senador Randolfe, o mesmo partido de Marina, que no segundo turno de 2014 apoiou e abraçou Aécio Neves e na prática pregou o voto nulo no segundo turno de 2018.
Lembremos da oposição violenta, raivosa, renegada, destrutiva e cheia de falsa superioridade moral para atacar Lula, Dilma e o PT, contribuindo para alimentar o antipetismo e apoiarem o golpe de 2016 no "fora todos".
Heloísa Helena não construiu nada no campo da esquerda, como muitos dos que votaram nela. Do outro lado a base sindical da Conlutas e Intersindical é mais um divisionismo sectário, autofágico e estéril
Com o golpe de 2016 não conseguiram mobilizar, organizar e nem liderar nenhum movimento político, partidário, sindical ou social alternativo contra a direita, contra Temer ou contra Bolsonaro, porque o objetivo deles sempre foi o ataque sectário contra o PT, sem oferecerem nada de substantivo no campo popular da esquerda, ou da organização de novas lideranças e movimentos sociais.
Os que saíram do PT falavam em autocríticas e sempre é bom olhar a si próprios no espelho das contradições em curso, agora mais uma vez está claro que Lula é o grande puxador de samba, com a ajuda de muitos outros intérpretes juntos, até prova em contrário...
O "cara da casa de vidro"
O repórter Sérgio Ramalho, do site The Intercept, teve acesso a um relatório do Ministério Público do Rio de Janeiro com o resumo dos grampos telefônicos de comparsas de Adriano da Nóbrega. Como se sabe, Adriano era o chefe da milícia Escritório do Crime e foi morto em uma operação policial, na Bahia, que mais parece queima de arquivo. As conversas indicam conexões muito mais profundas entre o ex-policial militar e Bolsonaro do que se sabia até então.
Após a morte de Adriano, seus cúmplices teriam procurado um homem, mencionado nos grampos como o "cara da casa de vidro". Fontes do MP-RJ ouvidas pelo site dizem tratar-se de Bolsonaro, e a "casa de vidro" seria uma referência à fachada envidraçada do Palácio da Alvorada. O homem também aparece no relatório como "Jair" e "HNI (PRESIDENTE)". HNI é a sigla para Homem Não Identificado.
As conversas começaram na data da morte de Adriano e foram interrompidas dias depois, quando surgiram as supostas menções a Bolsonaro. O Ministério Público estadual não tem poder para investigar o presidente, e um caso como esse teria que ser encaminhado à Procuradoria-Geral da República.
Adriano da Nóbrega seria peça chave para o esclarecimento de crimes que, de alguma forma, embaralham no mesmo enredo a milícia que chefiava, alguns de seus parentes, o amigo de longa data Fabrício Queiroz e o clã presidencial. Todos juntos e misturados no esquema das rachadinhas.
Esclarecer essas conexões deveria ser prioridade absoluta de investigadores, imprensa, autoridades e instituições no Brasil. Porém, as investigações que envolvem o sobrenome Bolsonaro parecem contaminadas pela lentidão e por generosa condescendência em instâncias do aparelho estatal. Não por acaso, Bolsonaro sente-se à vontade para debochar dos 400 mil mortos pela pandemia usando a expressão "CPF cancelado", a gíria miliciana para pessoas assassinadas.
segunda-feira, 26 de abril de 2021
25% dos brasileiros se vêem representados pelo pior, mais reles, mais inepto, mais cafajeste e autoritário velho imundo que já se viu por aqui
Jornalista da CNN relata que os partidos de Centro encomendaram pesquisas que revelam que o eleitor não quer uma terceira via, aposta mesmo em Lula X Bolsonaro. O que achei curioso foi essa última frase nos tuítes dela: "Bolsonaro, por sua vez, indicam as pesquisas, 'pode fazer o que for que não baixa de 25% das intenções de voto'". A gente já brincou aqui, tem gente que, mesmo que esse homem esfaqueie e estripe uma criança em praça pública, continuará chamando-o de mito. Agora parece que é científico.
Se verdade for, e 400 mil mortos depois, escândalos de corrupção, administração destruidora, economia em frangalhos, parece que é, o que podemos concluir disso?
Que 25% dos brasileiros se vêem representados pelo pior, mais reles, mais inepto, mais cafajeste e autoritário velho imundo que já se viu por aqui. O inominável vai passar, não porque eu queira, mas porque tudo passa. Agora, como vamos reconstruir um projeto civilizatório com essas pessoas no caminho, eu sinceramente não sei. Não sei mesmo.