Leandro Fortes
“O defunto dominava a casa com a sua presença enorme.”
– Érico Veríssimo, “Um lugar ao sol” –
Lula não está morto, não foi feita a vontade de seus algozes, mas, como a personagem de Érico Veríssimo, tornou-se uma presença grande demais para os pigmeus morais que ousaram prendê-lo sem provas, sem indícios, sem decência.
Enorme, a presença de Lula ultrapassou o cárcere solitário onde tentaram lhe sufocar em tristeza, em Curitiba. Esparramou-se pelo País, pela América Latina, pelo Velho Mundo, espalhou-se como um cântico no Oriente, na Oceania, na América do Norte, na África.
Tornou-se, para todo mundo, um hino de liberdade – sóbrio, translúcido – em meio à algazarra das hienas de toga, paletó e terninho que queriam fazer de seu martírio um aviso, de que é isso que acontece a quem, como ele, ousa governar para os pobres, dar dignidade aos excluídos, dar visibilidade aos invisíveis, terra aos desterrados, uma chance, afinal, para os pretos.
Dentro de uma cela, na fria capital do Paraná, Lula tornou-se mais sábio, mais leve, mais belo e mais livre, um líder ainda mais admirado do que aquele que, ao deixar o governo, em 1º de janeiro de 2010, detinha quase 90% de avaliação positiva – um recorde mundial, jamais ultrapassado, na história das democracias modernas.
Mesmo quando foi calado, impedido de dar entrevistas ou mesmo de ir ao enterro de um irmão, Lula não baixou a cabeça. Veio a morte de Marisa, companheira de uma vida, e, em seguida, a do neto, de apenas 7 anos de idade. Lula chorou, as pessoas decentes do Brasil choraram com ele, mas o velho líder operário não se deixou vencer pela tristeza. Na alcova onde muitos achavam que seria seu fim, Lula continuou firme, renascendo, inspirando, de novo, pronto para a luta.
Até que, por fim, o gigantismo de sua estatura moral tornou-se incompatível com os espaços físico e histórico a ele destinados, nessa trama. Flagrados no esgoto de vaidades, crimes e infâmias desnudado pela #VazaJato, Sérgio Moro, Deltan Dallagnol e sua trupe de juízes e procuradores tornaram-se caricaturas de si mesmo. Desde então, equilibram-se entre o desespero e a vergonha, reduzidos a substâncias tóxicas de um sistema judicial que apodrece em praça pública.
Como último e desesperado recurso, restou aos canastrões da República de Curitiba tentar se livrar de Lula, conceder a ele um liberdade coercitiva, suja, vigiada, simbolizada por uma humilhante tornozeleira eletrônica.
Pretendem torná-lo livre para reforçar a tese, a essa altura, completamente desmoralizada, de que ele é culpado.
Mas Lula disse não. Ou sai da cadeia inocentado, ou não se importa de continuar por lá.
Quem esperava outra reação, não conhece Lula, nem nunca compreendeu sua real dimensão política e social.
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